Capítulo 10

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Marina:

Domingo a noite, depois de deixar Paulo e Thalia em suas casas eu finalmente chego ao meu condomínio. Senti saudades, civilização.

- Boa noite senhorita López - o porteiro me cumprimenta, aceno pra ele.

As atividades do acampamento eram exaustivas, mas até eu poderia dizer que foi divertido. Ao entrar no meu apartamento jogo minha mala no chão e tiro os sapatos, banho e cama era definitivamente o que eu precisava.

- Lua? - grito do corredor antes de passar pela sala de estar, ela saiu e deixou a televisão ligada?

- Marina. - olho para o sofá ao ouvir meu nome e quase deixo o violão cair.

Luciana está lá segurando um buquê de rosas assistindo ao TVZ como se tudo fosse um mar de rosas. Todo tipo de diálogo passa pela minha cabeça no tempo em que só nos encaramos, quero gritar com ela e chorar e abraça-la mas não faço nenhuma dessas coisas, fico lá estática olhando aquela mulher que não saiu dos meus pensamentos durante meses, minhas emoções eram um turbilham e eu não podia identificar a mais forte, eu devo parecer muito ressentida ou nervosa porque ela desvia o olhar e fala olhando para seus pés.

- Podemos conversar?

Tento me concentrar na minha respiração mas pareço estar prendendo inconsciente, na expectativa. Ela demora a me olha e parece muito em dúvida do que fazer, por fim ela deixa o buquê no sofá e se levanta.

- Eu quero me desculpar por ter te tratado com grosseria, por ter sido muito rápida em julgar as suas atitudes, é sério Marina, nada no seu comportamento, no modo como me tratou por todo esse tempo justifica o modo como eu tratei você. - seus olhos são uma súplica silenciosa, consigo ver o esforço que ela esta fazendo para admitir essas coisas. Mas ainda não consigo dizer nada, minha boca parece extremamente seca. 

- Foi um choque, eu não imaginaria nem em um milhão de anos que você faria algo assim! E ainda mais sem interesses - ela respira fundo, a voz trêmula quando volta a falar - eu sou tão cabeça dura algumas vezes, não consigo ver a situação como um todo e só algumas partes ficam claras, passei a última semana com medo de pedir desculpa e você não aceitar, você não precisa do meu perdão ou algo assim, é bem ao contrário.

Seus olhos estão cheios de lágrimas agora, e ela pisca para impedir que elas desçam.

- O que você fez foi incrível e não tenho palavras para expressar minha gratidão, imagino que não deve ter lhe custado barato em nenhum sentido - eu quero ficar brava com ela, mas só consigo querer atravessar a sala e aceitar suas desculpas!
Não! Eu não vou ceder, de novo.

Balanço a cabeça algumas vezes em auto concordância com meu pensamento. A última semana passa em minha mente. O jeito que Thalia me tratou. Como foi divertido. Como me senti mais leve, como foi bom me sentir assim. E agora tudo voltou.

- Acontece Luciana, que você está sempre pensando que sou capaz de coisas tão absurdas, como partir o coração da Fernanda e ajudar a sua mãe para tentar te conquistar, se esse fosse meu único interesse eu teria lhe mandado flores e chocolate, e te chamado para sair. Mas tudo o que fiz foi dar o seu tempo e ser paciente, guardei o que eu sentia para esperar você sentir o mesmo, e o que vai ser a próxima vez? - minha voz é pura acusação, remorso. Sem vestígios de compaixão ou compreensão.

Ela parece atingida, magoada e por um segundo eu quero repensar o que disse, mas o sentimento vem e vai com muita rapidez.

- Você está magoada. Droga, eu estou magoada comigo! Se é que é possível, só faço merda. - ela parece ter dificuldade para falar - Mas quero consertar isso, se você permitir.

Ela dá alguns passos em minha direção mas parece mudar de ideia e para à meio metro de distância, sua expressão é uma máscara de dor velada e sinceridade.

- Eu tive medo da compulsão, sempre penso essas coisas de você porque ninguém pode ser tão perfeito! E você é perfeita Marina, e desde o dia em que coloquei os olhos em você naquele parque eu senti uma compulsão, um sentimento que me arrastava para perto de você incontáveis vezes e eu lutava sem saber contra o que estava lutando, decidi ser sua amiga e essa compulsão só aumentou, em determinado momento eu só queria te ver, estar com você a todo momento! - ela faz uma pausa para enxugar as lágrimas que teimam em escorrer por seu rosto.

- Mas você levou esse sentimento a um outro patamar e eu sinto as malditas borboletas no estômago quando te vejo, quando alguém fala o seu nome. - ela enfatizou a frase - No dia do meu aniversário eu me senti completa, cheia de vida e energia, como se tivesse hibernado dezoito anos da minha vida, quando sai daqui aquele dia eu quis voltar, no exato momento que passei por aquela porta, mas o orgulho - ela ri sem humor - o orgulho é uma cerca de arame farpado, que me machucaria se eu tentasse passar por cima mas também machucou quando deixei ele tomar conta de mim.

Eu gostaria de ter uma resposta para ela, mas eu não tinha e ela sabia disso.

- Eu não posso aparecer assim e exigir que tudo volte a ser como antes... - ela parece não resistir ao impulso de atravessar a distância e me abraçar, ficamos assim por um instante, abraçadas enquanto nossas lagrimas caiam silenciosamente por nossos rostos - Eu vou esperar você voltar pra mim, porque eu descobri que amo você, e posso esperar o tempo que for para você decidir se mereço uma chance, eu mesma não sei se mereço mas vou tentar.

Ela beija a minha testa e se afasta, me da um sorriso afetado antes de se encaminhar para o corredor que levava a saída. Ela para no vão do corredor e fala de costas para mim :

- Aquele dia no parque você fez alguma coisa comigo, e vem fazendo até hoje. - com isso ela sai do apartamento.

No TVZ passava uma música com letra bem triste chamada Habits do tove lo e eu me jogo no sofá e afundo o rosto nas rosas:
Você foi embora e eu tenho que ficar
Chapada o tempo todo
Para te manter fora de minha mente
Uh, uh, uh, uh

- Ei, eu ouvi a conversa - Lua senta ao meu lado - achei que você precisava disso - ela estende uma garrafa Whisky e eu tomo alguns goles tentando em vão preencher o vazio que eu sentia.
Passando os dias trancada em uma névoa
Tentando esquecer você
E eu caio novamente
Tenho que ficar chapada a vida toda
Pra esquecer que estou sentindo sua falta
Uh, uh, uh, uh..

Luana toma um gole e me deixa sozinha, viro o resto da garrafa antes que a música acabe e desabo. Choro tudo, as dores desde o dia em que coloquei os olhos naquela garota problema.
Tentando esquecer você, querido
E eu caio novamente
Tenho que ficar chapada a vida toda
Pra esquecer que estou sentindo sua falta
Uh, uh, uh, uh...

Atordoada e meio solitária...
Preciso de alguém para anestesiar a dor
Ooh
Preciso de alguém para anestesiar a dor
Ooh

Sem medo de amar (Romance Lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora