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DEPOIS DE ESTAR plenamente recuperado do terror por que passara e da fadiga que isso havia ocasionado, o barão Fitz-Alwine ordenou que se buscassem, na cidade de Nottingham, referências sobre o tal lenhador. Dispensável dizer que o nobre senhor se preparava para uma revanche estrondosa do inaudito insulto que lhe fora feito.

Geoffroy informou-o da fuga de Halbert e essa notícia só fez agravar sua irritação.

— Miserável patife! — disse o castelão. — Se for ainda incompetente a ponto de deixar que escape o bandido que se apresentou como amigo seu, será enforcado sem misericórdia.

Ansioso por recuperar a estima e a confiança do amo, o robusto soldado se dedicou meticulosamente à caça do lenhador. Percorreu de cima a baixo a cidade, vasculhou os arredores, interrogou estalajadeiros e fez isso com tanto afinco que descobriu que o guardião-mor da floresta de Sherwood, sir Guy de Gamwell, tinha um sobrinho que em tudo correspondia às descrições do gigantesco adversário. Soube que o rapaz morava na casa do tio e, ouvindo também a descrição feita pelos cruzados do chefe do bando noturno que os atacara, confirmou ser ainda esse parente de sir Guy o antagonista do barão e o seu vencedor no duelo daquela manhã.

A pessoa que deu ao soldado essas preciosas informações acrescentou que um jovem arqueiro, de habilidade que se tornava proverbial, chamado Robin Hood, igualmente se hospedava no castelo de Gamwell.

Como é de se imaginar, Geoffroy foi correndo comunicar ao barão o que acabava de saber.

Lorde Fitz-Alwine ouviu com tranquilidade a prolixa narrativa, demonstrando assim grande capacidade de paciência, e uma luz se fez em seu espírito. Lembrou-se de que Maude, ou Isabel, como ele normalmente chamava a camareira da filha, encontrara abrigo no solar de Gamwell, e que lá, então, deviam estar reunidos Robin Hood, chefe do bando, João Pequeno e demais componentes daquele insolente grupo.

Novas informações confirmaram a exatidão do relato de Geoffroy e lorde Fitz-Alwine resolveu imediatamente apresentar ao rei uma queixa severa contra aquela gente da floresta.

O momento era propício. Naquela época, Henrique II, que ativamente se preocupava com o policiamento interior do reino e procurava estabelecer maior respeito pela propriedade territorial, dava muita atenção às histórias de roubos e saques que lhe traziam.

Por ordem do rei, os culpados eram em geral encarcerados e, das celas do Estado, passavam às fileiras mais subalternas do exército ou aos tombadilhos da marinha.

Lorde Fitz-Alwine conseguiu uma audiência junto à justiça de Henrique II e expôs ao rei, exagerando muito, tudo que tinha contra Robin Hood. O nome chamou a atenção do soberano, que pediu novos esclarecimentos e soube tratar-se do mesmo Robin Hood que reivindicava os direitos ao título e aos bens do último conde de Huntingdon, alegando descender diretamente de Waltheof, a quem Guilherme I havia outorgado o condado. A requisição do pretendente, como sabemos, fora rejeitada e seu adversário, o abade de Ramsey, guardara a posse da herança.

Ao descobrir que o agressor do barão outro não era senão o pretenso conde de Huntingdon, o rei teve um acesso de raiva e condenou Robin Hood à proscrição. Decretou, além disso, que a família Gamwell, protetora declarada do rapaz, seria despojada dos seus bens e expulsa das suas terras.

Um amigo de sir Guy, ao ter conhecimento do cruel julgamento decidido contra o velho fidalgo, apressou-se em mandar avisá-lo. A terrível notícia deixou consternada a tranquila morada de Gamwell. Assim que souberam da desgraça que atingira seu amo, os aldeãos se reuniram ao redor do castelo e se solidarizaram com a família para a defesa do hall, dizendo preferir morrer no combate a ceder uma só polegada de terreno. Robin Hood sabia que sir Guy possuía uma bela propriedade no condado de Yorkshire e, aconselhado por João Pequeno, suplicou que o chefe da família deixasse Gamwell e levasse os seus para esse retiro mais seguro.

O príncipe dos ladrões (1872)Onde histórias criam vida. Descubra agora