Capitulo 34

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O bip regular da máquina já não irritava mais, pelo contrário, o ajudava a ritmar sua respiração, que parecia ter ficado presa no trajeto de 40 minutos da saída do estúdio até o hospital.

Ainda se sentia dormente em algumas partes do corpo, mas gostaria de ter a mesma inércia na mente.
Sua cabeça não parava de repassar as últimas 15 horas.

Flash's da ligação de Ian, da forma desesperada como entrou no primeiro táxi que viu, da agonia e da prece silenciosa que se tornou um grito assim que chegou ao hospital.

Das notícias, essas foram as piores.

Em minutos ele precisou absorver que a mulher de sua vida sofrera um acidente grave, passara por uma cirurgia para controlar a hemorragia cerebral, que ela estava agora em um coma induzido para que seu corpo fosse capaz de se curar, de sobreviver a essa e mais três lesões no corpo.

Descobriu que seria pai.
Descobriu que talvez precisasse se preparar para o luto do filho que mal conheceria.

Ele passou 15 horas tentando entender como esse inferno se estabelecera, como passou de ter tudo a possivelmente não ter nada.

Assimilar que Anahi estava grávida já era difícil, devido ao histórico clínico que ele já conhecia.

Planejava ter filho com ela, mas já haviam conversado de que precisariam passar por um tratamento bem específico e até mesmo demorado para com sorte conseguirem. Adotar também era uma opção, se lembrou de uma noite onde viu o brilho nos olhos dela ao falar do sonho que mantinha escondido no fundo do seu coração.

Alfonso não era um homem religioso, não mais. Deixou de acreditar em Deus há muito tempo, nunca acreditou que uma força superior seria capaz de se preocupar com o que o homem faz ou deixa de fazer, imagina livrá-lo do mal?

Mas esse era o momento onde toda sua racionalidade o havia abandonado e agora olhando para o escapulário de Anahi, sendo esmagado contra sua mão trêmula, percebia que só restava implorar, ao Deus que ela tanto acreditava que pudesse a salvar, que Ele fizesse qualquer coisa para devolvê-la.

Pediu por horas entre soluços, com a cabeça apoiada na beirada da cama dela, que o filho deles sobrevivesse, que ao menos por uma vez o universo os deixasse em paz.

Alfonso: Ela já não passou o suficiente? - perguntou olhando para o teto do hospital com uma expressão de pura fúria - Já não permitiu o bastante de desgraças em sua vida? - continuou chorando alto - ONDE VOCÊ ESTAVA TODOS ESSES ANOS? Você não é tão poderoso e onipresente? - cuspiu com desprezo. - E onde toda essa fé a levou?

Ian: Acho que discutir com Deus não é a melhor das ideias. - disse Ian que entrava no quarto bem no momento. - Quer ir tomar um café? Eu poss...

Alfonso: Não. - cortou frio.

Ian: Cara, você não precisa fi...

Alfonso: Sim eu preciso. Eu quero e vou ficar Ian, não perca seu tempo. - dispensou simples, pegando a mão fria e delicada, que agora parecia mais frágil do que nunca. - Não consigo entender como ela não percebeu antes Ian. Quando ela acordar, se o bebê não... - parou tomando uma respiração longa antes de terminar a frase que parecia ter ficado presa em sua garganta - Ian quero que me prometa que se o bebê não sobreviver, não vai contar a ela que esteve grávida.

Ian: Mas Alfonso...

Alfonso: Eu conto, depois. Quando ela se recuperar. Você não conhece Anahi, isso vai destruí-la. - e abaixou a cabeça para segurar suas emoções, ele não aguentava mais desabar.

Ian o observou. O viu totalmente despido de resistência.
Sentiu pena. Não achava justo que ele estivesse ali totalmente alheio do que acontecia.

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