Convite

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K
izashi observava a noite fria e silenciosa que estava do outro lado da janela. Frequentemente se via ali, nos corredores do castelo, sozinho e confinado em seus próprios pensamentos. A ordem era sempre a mesma: queria estar completamente só. Todos os dias ficava uns bons minutos observando os movimentos das árvores em meio ao breu.

E lá em baixo, entre as copas que balançavam demoradamente, ele a viu: os cabelos cinza e o olhar penetrante e estático direcionado a si. Ela o encarava sem desviar os olhos por nenhum segundo, e Kizashi soube que não era apenas a feiticeira que o observava. As criaturas que carregava também estavam presentes, notava pois pôde sentir a aura desconcertante e perturbadora vindo daquela floresta, sempre acompanhada de enjôo e medo.

Faziam anos que a mulher não aparecia, mas ele nunca deixou de olhar pela janela uma noite sequer, aguardando o dia em que a veria parada, trazendo no olhar a mensagem que tanto o transtornava:

"Da próxima vez que me vir, saberá que é a hora". Foram as palavras proferidas por ela quase 18 anos atrás, e agora ela estava ali cumprido que prometera. Kizashi retribuiu aquela visão incômoda com uma feição quase suplicante a ela. Tinha esperanças de que ela esqueceria, de que não voltaria nunca mais e o deixaria em paz, mas ali se concretizava seus medos. E por mais que estivesse longe e seu rosto de difícil visualização entre aquele ambiente escuro, conseguiu ler seus lábios avermelhados e as palavras que saiam dali.

"Lembre-se: você pediu por isto."

E esse fato definitivamente não podia negar. Fechou as cortinas, exasperado com aquela conclusão: teria que cumprir sua parte do antigo acordo.

- Papai? - Se assustou ao ouvir uma voz doce no que parecia ser o final do corredor. Ainda que o local estivesse imerso em um breu, reconheceu a filha. - Está tudo bem?

Sakura se aproximou, preocupada. O encarava em silêncio, esperando uma resposta ou explicação para o pai estar tão alheio em meio ao corredor de madrugada, completamente sozinho e aparentemente perturbado. Kizashi a observou parada por alguns instantes e nada fez além de puxá-la para um abraço doloroso, acariciando os cabelos da filha.

Sentia muito.

Muito.

Apesar disso, se pudesse voltar ao passado, não revogaria sua decisão. Envolver Sakura em seus planos o massacrava, desvastando-o em culpa a cada segundo que se passava. Entretanto, a ideia de não ter Mebuki, Saori e seu reino vingados pela carnificina cometida anos atrás o açoitava mais do que qualquer outra circunstância possível.

A jovem não entendia o que estava acontecendo, ainda assim acatou o abraço inusitado. Sentiu a respiração pesada dele, o que lhe causava mais estranhamento. O rei suspirou cansado, separando-se da filha e segurando em seus ombros.

- Estou bem, apenas tive um pesadelo e resolvi observar a paisagem para espairecer.

- Entendo, por mais que não acho que essa noite escura vá te ajudar com isso. - Juntou as sobrancelhas olhando para os lados, notando mais um detalhe incomum. - Onde estão os guardas noturnos?

"Pelos céus, poderia ser um pouco menos questionadora?" foi o que ele pensou, a respondendo com um sorriso forçado que por pouco não fora detectado pelo olhar atento de Sakura.

- Eu os mandei sair por um instante. Como disse, tive um pesadelo bem ruim. - Se recompôs, determinado a mudar de assunto. - E por que está acordada?

- Ah, eu... - Virou o rosto desviando o olhar, uma mania que tinha quando achava difícil de explicar alguma situação. - também tive um sonho um pouco inconveniente.

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