Capítulo 21

56 7 0
                                    

Ficar longe de Rachel era uma das coisas mais dolorosas que já tinha acontecido comigo, só conseguia pensar nela. Ouvia "Here, There and everywhere" sem parar, usava o quartzo rosa que ela tinha me dado todo dia na esperança que isso me ajudasse a passar aquele sofrimento, peguei meu ursinho carinhoso que ela havia ganhado pra mim no meu armário da escola, abraçava-o na cama e chorava até não poder mais, lembrando dela e sentindo sua falta.

Tinha dado uma desculpa esfarrapada pra meu pai, disse que nós ficamos amigas, mas gostávamos do mesmo garoto, ela descobriu que ele queria ficar comigo e falou que não queria mais ser minha amiga. Ele pareceu engolir, por mais que não fizesse muito sentido, me deu dois tapinhas no ombro e murmurou algo como "Drama feminino, ta aí uma área que eu não posso te ajudar" e me deixou em paz.

Mal tinha forças pra ir pro colégio, mas não tinha manchado meu histórico escolar perfeito com nenhuma falta e não era agora que eu pretendia fazer isso, então fui.

Olhava os corredores procurando por ela, eventualmente achei-a. Ela me olhou, desviou e seguiu em outra direção, senti um aperto no peito e me segurei pra não chorar ali mesmo. Em um dia, ela era uma das pessoas mais próximas a mim do mundo, no outro, era como se nunca tivéssemos nos conhecido. Doía tanto, mas tanto que eu mal tinha palavras pra me expressar.

Fui pra minha aula de matemática e teria assistido a tudo de cabeça baixa, se algo não me chamasse a atenção:

— Professor, eu gostaria de mudar minha dupla. — Kevin pediu, a mão levantada.

O professor fez uma careta confusa, olhou pra mim e depois pra ele.

— Mas por que? Vocês foram tão bem, o trabalho de vocês foi o mais bem pontuado da sala. — Ele deu uma risadinha, sem graça. — Certeza que quer fazer isso?

— Sim, prefiro ficar sozinho. — disse, seco.

— Kevin, por favor... — sussurrei, chateada. — Me desculpa por aquilo, será que a gente não pode ser só amigos? Eu gosto muito de você.

— Eu sempre fui um cara legal com você, te ajudei nesse trabalho, te ajudei a achar sua mãe, te dava atenção... e você fala que simplesmente não quer nada comigo?! — falou, sem nem olhar pra minha cara. — Tudo que eu fiz foi pra nada? O que, sou muito feio pra você sequer considerar namorar comigo?! — ele me olhou, irritado. — Não, obrigado, não tem como sermos amigos depois de você ter me iludido dessa forma — Ele voltou o olhar pro professor. — Faço questão de mudar de dupla, por favor.

Olhei pra Kevin, mas ele já não fazia contato visual comigo, irritado. O professor suspirou e deixou ele ficar sozinho só porque o ano letivo estava acabando, mas disse que nosso projeto junto ainda iria valer, observei-o enquanto pegava sua mochila e ia pra outra mesa sozinho, os atletas murmuravam alguma coisa e riam. Suspirei, eu sei que ele devia ta chateado comigo, mas poxa, o que eu podia ter feito? Eu era obrigada agora a ficar com ele só porque ele gostava de mim?

Naquele momento, nada disso importou, só fiquei chateada de perceber que logo após perder Rachel, eu também estava perdendo um amigo.

• • •

Era o dia da apresentação do teatro, os ânimos estavam agitados entre o pessoal, muitos exercícios de respiração, pessoas recitando suas falas sozinhas e um vai e vem da minha parte constante, consertando pequenos erros e dando as direções de todo mundo. Não há dia que um diretor de um teatro se movimente mais do que o dia da peça em si, as tribulações surgem por brotamento, sempre tem alguém faltando e os pulmões chegam a cansar de tanto insistir pras pessoas irem pro lugar devido.

Todos já estavam vestidos e preparados pra entrar, observei Rachel relendo algumas de suas últimas fala do roteiro sentada em frente a uma penteadeira velha, parecia séria. Pensei em falar com ela, inventar qualquer desculpa teatral, podia ser sobre o figurino, alguma fala ou sei lá, o teto do palco caiu e não ia ter mais peça, qualquer coisa que fosse me fazer poder chegar perto dela e trocar cinco palavras que fossem com ela. Mas não fiz nada disso, ela nem estava olhando na minha cara, não teria essa coragem.

Roteirista do DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora