Retour en ville.

6.6K 677 43
                                    

CINCO ANOS DEPOIS

Minha melhor escolha foi aceitar a oferta de Magnus há cinco anos, quando ele me ofereceu a ideia de viajar o mundo contando minha história — conhecida como "conto do coração negro" — sobre uma mulher fictícia chamada Alicia viajante do tempo, intercalando sua vida entre o passado e o futuro. Na maioria das vezes eu gostaria de dizer tudo ter sido real e sendo um acontecimento meu, mas ninguém acreditaria.

Já havia visitado muitos lugares, cidades grandes e menores, conhecido diversas culturas. Se eu estivesse no meu ano verdadeiro não conseguiria fazer tudo o que estava fazendo.

O lado ruim era viajar dias em um navio de carga ou andar debaixo de chuva, montada em um cavalo em uma estrada estreita de terra para alcançar cidades pobres e com população bem pequena. As crianças desses lugares costumavam ser mais adoráveis e davam mais atenção ao conto, desejando até mesmo estarem no lugar da protagonista. Quando acabava de contar, elas vinham correndo até mim com brilhos nos olhos querendo saber mais de como a história terminava, mas eu mesma ainda não tinha decidido um final de conto de fadas para ela.

Magnus estava demonstrando ser um ótimo empreendedor, ele fazia propagandas e deixava as pessoas com vontade de ouvir. O homem tinha o dom de encantar a todos com sua voz grossa e o jeito de falar com um sotaque estadunidense davam-lhe um charme a mais. No começo tive uma boa e longa conversa com minha amiga decidindo se iria ou não e decidi ir, já não tinha mais nada a fazer em Birmingham.

Uma neve fina caía sobre a cidade de Santa Fé, na América do Norte. Os habitantes saíam de suas residências e brincavam com os flocos gelados. Eu observava tudo da janela de uma casa de somente um quarto onde estava ficando durante a estadia ali, que já acabaria em algumas horas, quando eu iria pegar um navio em direção da Inglaterra novamente. Sem meus documentos ali, pegar navios clandestinamente era o único método de conseguir viajar.

Magnus na sala com suas grandes malas me chamou a atenção, fazendo-me desviar o olhar do exterior ao interior. Ele era demasiadamente desajeitado e isso fazia dele muito engraçado, além de ser muito vaidoso e carregar mais de cinco malas onde ia lotadas de trajes bem diferentes dos utilizados pela maioria.

— Você já fez suas malas? — indagou-me, deixando as dele sobre o chão de madeira ao lado da lareira acesa que aquecia o local.

Balancei a cabeça assentindo. As minhas já estavam prontas desde o dia anterior, eu não gostava de fazer as coisas de última hora, assim conseguia me certificar de que não estava me esquecendo de nenhum pertence meu.

Ele caminhou até mim, sentando-se no sofá na beirada da janela em seguida. Seus braços rodearam meus ombros, esquentando-me com o agasalho que vestia. Magnus era um homem mais velho e nunca me falaria abertamente sobre o assunto, mas eu sabia sobre sua orientação sexual, ele me via como uma irmã assim como eu o via como um irmão. Já estávamos andando juntos para cima e para baixo há cinco anos, sabíamos muito um sobre o outro.

— Entrar de férias dessas viagens vai ser tão estranho — disse ele, colocando o queixo na curva de meu pescoço. — Já tem planos?

— Reencontrar minha amiga e beber com ela — sorri fraco, não estava animada com a ideia de tirar férias.

Por mais cansativo que fosse, eu não decidi parar por algum tempo de fazer minha tour de histórias. Ali era o meu refúgio, os palcos se tornaram meu lar e não havia outro lugar melhor para estar que não fosse na frente de centenas de pessoas falando sobre minha vida. Mas meu amigo e mentor precisava de um descanso.

Durante todos esses anos, trocava cartas com Paige, mas às vezes quando elas chegavam para ela eu já estava em outra cidade e ela não conseguia me mandar uma resposta. Então, basicamente, eu estava falando sozinha. Não tinha notícias dela há algum tempo e queria saber se ela ainda morava no mesmo lugar ou se finalmente tinha arrumado uma família. Eu torcia para isso ter acontecido, já que era o seu sonho ter filhos e um marido.

Coração Negro | Thomas ShelbyOnde histórias criam vida. Descubra agora