Dezoito - Confusão

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Melissa teve um dia cheio.

Na parte da tarde, fez a visita rotineira ao prédio A, e depois recebeu sua mais nova paciente, a que lhe foi destinada em substituição a Jonathan Reagan. Era Jamie Harper, a garota arisca e revoltada das sessões de terapia em grupo.

O motivo de Jamie ter sido trancafiada pelos portões do St. Marcus deixou Melissa particularmente perturbada. Seu Transtorno de Personalidade Esquizóide era grave, e marcado pelas características da dificuldade em manter relacionamentos, a forte crença no sobrenatural (e principalmente em achar ser a filha do demônio), desconfiança, tendência violenta, hostil e irritabilidade. Realizar rituais satânicos com criancinhas indefesas não era um dos assassinatos menos perturbadores que Melissa teve o desprazer de conhecer.

Além de ter que lidar com uma hostil sessão psiquiátrica, que não teve o resultado esperado, pois Jamie não fez questão alguma de cooperar com a doutora, o encontro com o rapaz desconhecido na tarde anterior ainda a atormentava. Sua cabeça chegava a doer, de tanto que se esforçava para se lembrar de onde o conhecia, mas o esforço foi em vão. Não havia nada ali. Melissa não o conhecia. Foi apenas impressão.

Era difícil, entretanto, não ficar curiosa com os motivos da reação exagerada dele. A sensação de impotência quanto a isso também era um incômodo, porque talvez nunca mais o encontrasse na vida, nem mesmo sabia quem era, então jamais teria a chance de perguntar qual era o problema, afinal. Assim, forçou sua consciência a se esquecer do acontecido, uma vez que tinha problemas maiores para lidar naquele momento.

Como o fantasma do banheiro e sua mensagem em uma língua desconhecida... Acontecera, Melissa tinha plena certeza disso. O fato de que a mensagem sumira, e seu batom também, eram apenas mais um mistério a ser desvendado. Junto com sua aparentemente recém-descoberta capacidade de lidar com o sobrenatural. Logo ela, que corria de filmes de terror como o diabo foge da cruz...

Quando o final do dia chegou, Melissa estava exausta. Queria alguém para desabafar tudo o que havia passado naquele dia, mas ainda estava brigada com Brian – sem previsão de reconciliação -, e Kate estaria ocupada naquela noite com o helvete. Melissa não tinha muita escolha, a não ser fazer sua refeição noturna e se trancar em seu quarto, para tomar um banho quente e relaxante. Seus planos foram frustrados, contudo.

O primeiro a frustrá-la foi Brian, quem reconheceu pela batida característica na porta. Melissa suspirou, sem ter muita certeza de que uma visita dele seria uma boa ideia naquele momento. Terminou de arrumar a mesa e apoiou o corpo nela, de frente para a porta, para depois autorizar a entrada do colega.

Brian colocou apenas a cabeça para dentro, com um sorriso meigo e o brilho cativante de sempre no olhar. Melissa não quis retribuir o sorriso, e notou que o brilho não a cativou.

— Vim em paz! – disse ele.

Suas duas mãos estavam espalmadas na altura dos ombros, como quem se rende.

— Nunca estive em guerra, Brian, ao contrário de você.

Ele torceu os lábios em descontentamento, então guardou as mãos nos bolsos da calça. Não vestia o jaleco.

— Talvez eu te deva um pedido de desculpas... – coçou a nuca e sorriu sem jeito.

Melissa tinha certeza de que ele devia, mas não disse nada, esperou que continuasse.

— Kate conversou comigo, eu contei o que tinha falado para você, ela me disse que eu sou um completo imbecil e que não deveria jamais sugerir que você está envolvida com um paciente. Em especial Corey Sanders. Então, me desculpe por ter me exaltado naquela situação toda com o Sanders. Eu realmente não sou seu dono e quero manter uma relação saudável. Ontem eu estava com raiva e acabei descontando em você, não acreditei quando você contou o que havia acontecido no banheiro e ainda te chamei de louca por tabela. – ele riu sem jeito.

Psicose (Livro I)Onde histórias criam vida. Descubra agora