Capítulo 18

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Duas semanas passaram.

Eu vivi no modo "piloto automático" por vários dia seguidos. Minha situação com a Clara continuava indefinida como uma tarde cheia de nuvens; eu já não a via há alguns dias, e eu evitava constantemente pensar nela quando não estávamos juntas, porque a incerteza de tudo sobre a vida dela me causava aflições e uma angústia que eu não havia experimentado até então.

Naquelas últimas semanas, eu havia participado de vários podcasts, e já conseguia articular boas mentiras pra discutir abertamente sobre a minha relação com a Clara. A minha habilidade de inventar histórias era incrível, e eu sempre convencia. O único problema era que eu não conseguia sair satisfeita, talvez por saber que a única pessoa não-convencida era eu mesma. Eu já estava de luto pelo pouco de caráter que me restava e agonizava na sola dos meus pés.

Centenas de seguidores por hora, dezenas de milhares de curtidas e comentários por dia, essa era uma constatação com base em relatórios que o João tirava constantemente. Tudo o que eu tocava, parecia virar ouro. Quanto maior o número de seguidores, maior o engajamento, e maior o lucro. João também acompanhava o Instagram da Clara, pra ter certeza de que ela não faria nada de errado, mas a movimentação era praticamente zero, o que às vezes me preocupava.

Eu lembro bem da quinta-feira em que as coisas realmente começaram a mudar. Era próximo do meio-dia e eu estava sentada no sofá da sala, com a cabeça tão distraída que não senti a aproximação.

— Querida? – A voz da minha tia me despertou, passando por mim.

— Oi. – Respondi automaticamente, antes mesmo de perceber que se tratava dela. – Ah, oi, tia.

— Que carinha é essa?

— Nada, eu só... Ando com a cabeça na Lua.

— Sei... – Ela riu, terminando de checar a bolsa sobre o próprio ombro. – Vou almoçar no clube, quer vir?

— Estou sem fome.

— Bom, venha pela companhia então, já faz alguns dias que eu quero conversar com você.

Relutei por alguns segundos, mas logo cedi ao pedido. Afinal, eu sabia que a minha tia era, provavelmente, a única pessoa que me amaria sob qualquer circunstância e apesar de qualquer crime que eu cometesse.

Depois de quase uma hora de trânsito e um século de bajulação entre o estacionamento e a mesa do restaurante, sentamos à mesa, a sós, como há muito tempo não acontecia.

— Como você tem passado? – Ela finalmente puxou um assunto objetivo, parecendo preocupada.

— Bem, e a senhora? – Repliquei, no modo automático.

— Eu estou bem, mas você está mentindo. O que está acontecendo?

— Nada, eu só... Ando meio preocupada. – Tentei dar de ombros e ser convincente.

— Com o quê, exatamente?

— Com a vida, sei lá, dinheiro e essas coisas...

— Você, preocupada com dinheiro? – Ela estranhou de imediato. – Por quê?

Contar à ela que meu namoro com a Clara era um contrato por publicidade, seria uma sentença de morte. Contar sobre a dívida da Clara, seria uma sentença de morte. Eu estava num mato sem cachorro.

— A senhora acha que 600 mil reais é muito dinheiro?

— Acho. – Ela respondeu sem titubear. – É mais dinheiro que muita gente vai ter na vida. Por quê?

A pergunta me pegou desprevenida. Minha tia não costumava me questionar, especialmente porque tínhamos as nossas rendas e finanças separadas.

— Por nada, é que eu... Estive pensando em fazer uns investimentos.

Sob Minhas Condições (Romance Lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora