Capítulo 11

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Quando a noite caiu, pedi ao capitão que nos guiava pra que retornássemos à marina. Havia uma equipe responsável por todas as nossas refeições no iate, mas eu não poderia perder uma única oportunidade pra uma aparição pública, e a noite estava perfeita; não havia uma única nuvem no céu e, talvez por capricho, o Universo decidiu iluminar ainda mais as estrelas que estavam sob as nossas cabeças. Uma brisa suave, típica da beira-mar, tocava a pele de uma forma delicada que me fazia arrepiar discretamente, e eu sabia que não era frio. Clara parecia um pouco mais à vontade com a minha presença e entrelaçou nossas mãos sem cerimônias assim que pisamos em terra firme, talvez já bem-treinada. João também nos acompanhava, mas eu sabia que ele nos deixaria assim a conta do jantar chegasse, como sempre fazia, e naquela noite a cena não foi diferente. Clara pareceu irritada em presenciar aquele momento que não o constrangia nem um pouco; no fim das contas, eu aceitava, porque ele era meu agente e boa parte da minha imagem na Internet e até das minhas palavras, na verdade, eram dele, então eu entendia aquilo como uma bonificação pelo seu emprego. Além do mais, naquela noite, ele me fez um favor quando nos deixou a sós, porque ali, finalmente, senti que começamos a aproveitar. Foi ali que eu percebi que havia alguma coisa diferente no ar. Só não sabia que era comigo.

Depois do jantar, caminhamos até o deck à beira-mar. Eu dava passos lentos, quase pedindo pra que o tempo passasse sem pressa alguma. Eu já havia misturado negócios com prazer algumas vezes, com o Felipe, e antes dele também, mas até então era só isso, negócios e prazer. Com a Clara, não havia prazer, mas por mais que eu tentasse negar, a presença dela era intensa demais pra simplesmente ignorar. Ela me fazia rir o tempo todo. Todas as risadas e sorrisos nas dezenas de fotos que temos são reais. Eu andava sempre com um sorriso falso no bolso, que sempre precisava colocar na boca quando via uma câmera, mas com ela, era natural.

Depois de alguns minutos caminhando, ela se sentou sobre o parapeito do deck, de frente pra mim, e trocamos algumas piadas bobas sobre o dia e a bravura dela em superar o medo de alto-mar. Mesmo sendo em um lugar um pouco mais afastado, as várias pessoas que passavam por nós paravam pra cumprimentar, pedir um abraço, uma foto. Nessa hora, eu também sorria verdadeiramente; era a hora da refeição do meu ego, e ele matava uma fome incessante. Clara permaneceu sentada, apenas observando, permitindo que todo o holofote fosse meu – algo que era fácil pra ela.

Honestamente, memorizar rostos e frases recebidas era praticamente impossível pra mim, mas lembro perfeitamente da primeira vez que vi Clara ser devorada pelos olhos de uma fã. Era uma garota mais nova que nós, talvez uns 17 anos, e enquanto eu tirava uma selfie com a amiga dela, com o canto dos olhos eu percebi que ela olhava Clara como se fosse um copo d'água no deserto. Sem nenhum pudor, a garota foi até ela e cochichou algo já no pé do ouvido, de forma totalmente desnecessária. Clara franziu o cenho, estranhando e ainda se familiarizando com aquela situação, mas apenas sorriu e em seguida a garota tirou uma selfie rápida com ela – o que eu também achei desnecessário –  e pediu por um abraço que pareceu não ter fim tão cedo. Assim que a garota fez a gentileza de soltá-la, eu tomei a mão da Clara, puxando-a na minha direção em uma tentativa discreta de assumir o controle novamente. Afinal, se a Clara seria o brinquedinho de alguém, seria meu, não dos outros.

Quando voltamos à marina, João ainda não havia dado o ar da graça, então eu decidi aproveitar o momento a sós um pouco mais. Adentramos o iate novamente, já livre das pessoas que haviam nos seguido até o último momento, e levei Clara até o último andar da embarcação. Lá, deitamos a céu aberto e conversamos mais um pouco, mas logo o silêncio dominou a conversa e só o que ouvíamos era o som do mar, quebrando manso em algum lugar perto de nós. Quando eu percebi que estava agindo como se aquilo fosse um encontro, já era tarde. Ela me olhava em silêncio como se estivéssemos realmente esperando o próximo passo daquilo, como se um próximo passo sequer pudesse existir. Dá pra entender como tudo aquilo era errado? Pra piorar a situação, a noite estava perfeita. Perfeita. Eu me odiava por estar saindo do papel. A cada segundo, eu recuava e avançava, como se em cada lado do meu ombro estivesse um anjo e um diabo fazendo um cabo de guerra pra decidir qual seria o meu movimento.

Sob Minhas Condições (Romance Lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora