CAP. 41 - TEMPO DAS FADAS

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Três anos depois...

EMILY

O tempo perdeu o sentido em nossa cabeça. A passagem pelo portal não foi dolorosa ou confusa, não passamos por testes mentais ou fomos desafiadas emocionalmente. Foi uma passagem tranquila e aparecemos em um lugar diferente. Demoramos alguns dias para perceber que se tratava de uma ilha, sem outros habitantes. Havia muitos animais, alguns que nunca havíamos visto. O mar banhava o litoral e a costa era bonita.

Uma casa nos fora entregue, grande e agradável. O lugar possuía dois andares, era em sua maior parte de madeira e possuía portas e longas janelas de vidro. O sol nascente pelo mar iluminava o ambiente, assim como as cores do crepúsculo reluziam no interior dos cômodos. O quarto era grande e ficava no andar de cima, com espaços de repouso na varanda. As cores, em tons terrosos, harmonizavam o lugar. A decoração era confortável. Durante a noite, as luzes eram em tons amarelados. O frio vindo do mar me fazia me agasalhar com roupas que tinham na casa.

A costa da praia parecia não ter fim e não importava o quanto andássemos, não encontrávamos outras residências. Havia calendários e mapas que nunca tínhamos visto, em alguns livros e agendas. Definitivamente, não estávamos em nossa dimensão, não havia sinal das terras dos Quatro Reinos ou do continente dominado pela Fterotós. Possuíamos alguns aparelhos, uma grande televisão digital mostrava redes de jornal com humanos, absolutamente apenas humanos. Aquilo se tornou o nosso único contato com os meios externos e, mesmo assim, não conseguíamos enviar mensagens. Sem internet, sem celulares ou computadores, nada além dessa televisão. Após as primeiras semanas, quando percebemos que não nos encontrariam, desligamos a conexão.

Quando chegamos, o calendário dessa realidade marcava fevereiro de 1997, havia um armazenamento de calendários para os próximos dez anos. Fui a pessoa que encontrou isso e me gerou um dia inteiro de distanciamento de mim mesma. Ficaríamos nisso por dez anos? Onde estávamos? Onde estavam Luana e Melanie? Como eu me alimentaria? Onde estavam as fadas?

Isabelle se esforçou para manter a calma e o controle no início, quando me deixei levar pela dúvida e pelo desespero. Nossa última lembrança era a de ver seres humanoides, alongados e azuis, de olhos violeta e cabelos brancos. Não ouvimos palavras, indicações ou apresentações. Não tínhamos para onde ir, não havia barcos, fossem manuais ou não. Deveríamos construir um barco? Esperar por outro portal? Luana sabia onde estávamos?

Tivemos que aceitar essa realidade. Isabelle descobriu uma espécie de bunker embaixo da casa, com um vasto armazenamento de comida. Cada detalhe indicava ainda mais que o lugar fora reservado para nós ou para quem quer que aqueles seres pensassem em esconder.

O dia hoje amanhece com chuva, a linha do horizonte se perde entre o mar e o céu, como um degradê por trás dos pingos d'água. O som da chuva é presente e me faz levantar da cama para fechar a porta de vidro. Isabelle não está no quarto, seu lado da cama não fora mexido. Passo a mão nos olhos e respiro fundo. Nas primeiras noites em que chegamos aqui, Isabelle desmaiava e se revirava com pesadelos. Alguns aspectos em seu corpo e comportamento se tornaram mais vivos.

Ela me ajudava com minhas crises de ansiedade durante o dia e, pela noite, eu tentava lhe acalmar. Isabelle também estava perdida, conseguia sentir, mas não me dizia nada. Por vezes, o seu silêncio me assustava, nos momentos em que sentava na varanda e só olhava o mar. O tempo, aos poucos, foi se perdendo em nós, jogamos os calendários fora e Isabelle colocou a televisão no fundo do bunker abaixo da casa.

Permaneço olhando para a cama e sorrio ao lembrar de como nossa relação se aproximou, se estreitou. Nos tornamos nossas únicas certezas. Caminho lentamente até o banheiro e tomo um banho quente demorado, fechando os olhos e tentando lembrar dos detalhes dos sonhos dessa noite. Nesse tempo, os sonhos se tornaram nossos únicos portais.

A Última Vampira (2ª edição) - Livro UmOnde histórias criam vida. Descubra agora