CAP. 26 - LABORATÓRIOS DO SUL

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(música: Demons - Imagine Dragons)

EMILY

Sair do cemitério foi uma tarefa desafiadora, para dizer o mínimo. Deixar para trás outra pessoa não foi a decisão mais tranquila, embora precisasse tomá-la rapidamente. Melanie, de maneira misteriosa, disse que deveríamos ir aos laboratórios do Sul, agora sei que deveria, naquele momento, ter perguntado a razão. A exaustão permanece em mim, precisei me preparar para reencontrar uma realidade que se afastou e se aproximou de formas estranhas nas últimas semanas.

Não se tratava de visitar algum dos laboratórios do Sul desse lado do oceano, mas do outro. Isso era o equivalente a ter que rever toda a minha espécie, depois de ter estado com uma vampira que matou alguns deles na minha frente. De algum modo, a companhia de Luana me transmitiu segurança naquela noite, a ideia de retornar não pareceu tão preocupante. Cada lembrança de Luana, e minha mente parece querer realçar ainda mais isso, me causa um leve aperto no peito. Melanie tentou me distrair e disse que me levaria para comer algo, mas suas falas às vezes vagavam em minha cabeça.

Ainda ligada ao fato de retornar aos Quatro Reinos, questiono-me se todas as notícias sobre Isabelle chegaram com detalhes por lá e imagino quais as reações de cada família. Minha cabeça permaneceu o caminho inteiro ansiosa. Demoramos um pouco até chegarmos em uma lanchonete simples, sentamos à última mesa, distante de muitos olhos, buscávamos apenas um pouco de calmaria. Esperamos enquanto a comida ficava pronta.

— Como era sua relação com Isabelle? — refaço a pergunta que já fizera, tentando distrair meus pensamentos que me deixam cansada. Também tento evitar pensar em Luana e em sua morte.

— Ainda é melhor não entrarmos muito nisso — ela sorri um pouco. Após chegarmos, Melanie prendeu o cabelo em um coque, isso lhe caiu bem. — Mas lembrei de como as fadas me enfeitiçaram. Faz muito tempo, elas me mantiveram viva para realizar suas missões e, para isso, apagaram detalhes importantes da minha relação com minha irmã. Era como se tivessem me dado um filme, mas com partes cortadas. Assim, eu reproduziria resultados de visões selecionadas. Elas cortaram meu vínculo afetivo com Isabelle.

Melanie é irmã de Isabelle, portanto deve ter alguns séculos, esse tempo inteiro esteve sendo manipulada por seres além dela. Isso faz com que, de alguma forma, uma parte de mim se solidarize mais. Estou viva há apenas vinte anos e não faz tantos desde que tomei mais consciência de mim mesma. Estar de frente para um caso como esse me faz achar que minha agonia é apenas um leve incômodo. Não faço ideia de como seria se meus superiores tivessem o poder de controlar minhas lembranças, meus sentimentos, minha identidade.

— Controlando minhas memórias, as fadas conseguiram me fazer acreditar que odiava Isabelle. Minha irmã nem sempre foi assim — talvez sem perceber, começa a entrar no assunto de Isabelle. — Não era algo difícil defender ela, entende? Como é hoje, digo. Ela era tão... Humana. Se é que hoje ainda é uma realidade imaginável. As fadas não teriam conseguido me controlar se não tivessem nos afastado e Isabelle não seria o que é hoje...

— A história seria diferente — completo.

— Exato — seus olhos estão focados no nada, perdidos em pensamentos. — Teria sido diferente. E quando volto para hoje — volta o olhar para mim. — Me sinto cansada, exausta. Sinto-me esvaziada por ter sido repartida emocional e mentalmente em tantas partes por seres tão além de mim, que jamais irei compreender. Também não consigo medir o poder das fadas, lembro da existência de portais e de feiticeiros que controlam outros tipos de portais para outras dimensões... A realidade se reparte, Emily...

— Como está lidando com todas essas informações?

— Não muito bem, mas melhor que a maioria, imagino — sorri. — Não sei se estou à beira da loucura, mas sinto como se minha cabeça fosse explodir, está pesada, doendo o tempo todo. Sinto, literalmente, o tempo passando por mim de novo. A cada segundo resgato sensações e momentos. Não é como se eu tivesse ficado desacordada por séculos, eu os vivi, só não tinha a autonomia de recordar da minha vida, entende? — me sinto sobrecarregada só de imaginar como sua mente está.

A Última Vampira (2ª edição) - Livro UmOnde histórias criam vida. Descubra agora