CAP. 1 - HIPNOSE

9.3K 701 79
                                    

(música: Bad - Royal Deluxe)

ISABELLE

Rodo mais uma vez a cadeira da sala enquanto giro uma caneta entre meus dedos. Quando a cadeira para, encaro minha mesa. Nunca a vi tão desorganizada.

Um painel digital mostra o mapa da cidade com vários círculos de diferentes cores e significados. Fotos de pessoas mortas se misturam entre papéis que guardam minhas anotações. Uma semana e nada. Nenhuma pista sobre o assassino. Não consigo aceitar que algum humano tenha conseguido cometer um homicídio de forma tão peculiar.

— Srta. Monther... — minha assistente entra na sala.

Layla, tem uma altura média, seus olhos são escuros e a pele é em um tom negro claro. Saio dos meus pensamentos e a encaro. Seus olhos por trás dos óculos parecem preocupados. Ela veste o uniforme, coisa que não estou fazendo.

— Mais uma vítima foi encontrada. Estava na floresta. Te trouxe algumas informações — se aproxima com alguns papéis na mão.

— Ótimo... Mais trabalho — deixo minha cabeça cair para trás e jogo a caneta na mesa.

— Dia difícil? — coloca os papéis na mesa.

— Não — pego a papelada enquanto me levanto.

— Pensei... — Layla parece se perder um pouco nos próprios pensamentos.

— "Difícil" é só apelido para a definição de hoje — sorrio e coloco os papéis na mesa outra vez.

— Se precisar de mim...

— Você estará lá fora — completo antes que termine. — É, você não me deixa esquecer.

Definitivamente não aguento mais ficar aqui. Pego meu casaco sobre a cadeira e o visto. Deixo tudo como estava e saio da sala, trancando-a em seguida. Anos e anos fazendo sempre a mesma coisa pode ser um tanto exaustivo, principalmente se você não puder morrer.

— Onde vai? — Layla pergunta ao me ver saindo.

Não falo nada, apenas ando pelo corredor até chegar ao elevador. A porta logo se abre e tento não dizer que foi sorte, isso é algo que só humanos precisam. Quando entro, aperto o botão, mas a mão da minha assistente faz com que o sensor pare a porta. Layla para ao meu lado e respira fundo, como se tivesse corrido um pouco. Não quero pensar no que ela tem a me dizer, ou mesmo se tem algo para falar, só quero sair logo desse lugar. A porta se fecha depois que pressiono o botão com força.

~~~

O reflexo do meu corpo por um momento chama a minha atenção. Meus cabelos com uma grande pigmentação de castanho vão até perto da minha cintura e se marcam sobre minha pele branca demais, sempre assim. A cor dos meus olhos é tão escura, que já cheguei a me perguntar se ficou mais densa com o tempo. Nunca fui de medir meu tamanho, mas costumo ser mais alta que as pessoas com quem convivo, se é que posso dizer que "convivo" com outros indivíduos. Calça jeans, bota, blusa e casaco, absolutamente tudo preto. Não me importo muito com fardamento.

— Posso fazer uma pergunta? — Layla parece temer algo enquanto fala.

— Já está fazendo — respondo séria ao saber que não conseguirei ficar no silêncio.

— Quantos anos você tem? — ela me olha nos olhos.

— Acredito que já tenha dito isso, tenho vinte e cinco anos! Temos a mesma idade.

— É verdade, mas não seria um problema se essa não fosse a sua idade há quarenta anos atrás. Seu nome está no registro de um caso há exatamente quarenta anos e... É o mesmo número.

Mesmo número. Apenas um número, mas... O mesmo número.

O sangue nas minhas veias parece gelar ainda mais por um momento, mas não mudo minha expressão de calma. Observo-a por completo. Não esperava que alguém fosse ver os registros da RDIC (Rede Detetive Internacional de Criminologia). Isso parece um tapa forte que acabou de acertar o meu rosto, sempre me gabei por conseguir destruir tudo e ninguém "comum" conseguir me encontrar, e não é simples dessa vez. Layla não é qualquer pessoa, ela não vai acreditar em desculpas.

— Eu poderia responder, mas não estou muito para conversas.

São rápidos segundos e ela não consegue acompanhar meus movimentos. Encosto-a na lateral com força e consigo sentir seu medo pela velocidade de suas batidas cardíacas e sua respiração. O meu reflexo no espelho novamente rouba o meu olhar por um instante, meus olhos queimam em um vermelho vivo.

— Você vai excluir da sua mente qualquer tipo de questionamento sobre Isabelle Monther — uso uma voz séria e rápida, focando o meu olhar no seu.

Os olhos assustados de Layla se perdem nos meus, ou em algo que parece estar além de mim, me afasto já sabendo o que causei em sua cabeça. Com pouco tempo depois, Layla sai do estado de hipnose. Muitos humanos já quase descobriram o que sou, mas essa habilidade os afastou da mínima possibilidade de total descoberta.

~~~

O estacionamento não fica tão distante do ponto em que deixei Layla com a mente apagada. Vários carros modernos se mostram parados, a maioria é branca e a outra parte se diverge entre preta e prata. A RDIC definiu um padrão para os seus carros, muito embora eu não os siga, por questões próprias. Sigo na direção de um veículo moderno e elegante, passei a ter uma vaidade por automóveis das últimas três décadas para cá. Minha vida se tornou como uma série com temporadas de temas e gostos diferentes, elas costumam variar de cinco a dez anos, esse gosto por automóveis resolveu se estender.

Foi complicado me acostumar com o que o sol fazia com a minha pele, não consigo recordar exatamente qual foi a primeira vez que senti a sensação dos raios adentrando o meu corpo como agulhas. Por essa razão, passei a evitar. Se eu iria queimar totalmente se ficasse exposta? Não faço ideia, nunca resolvi testar. Já no carro, ligo-o e saio do estacionamento e sei que irei roubar olhares com esse automóvel.

A rua em que encosto o veículo está calma, não há pessoas transitando pelas calçadas. Organizo meu cabelo pelo retrovisor e olho os meus olhos, já voltaram ao tom escuro. Abro uma pequena maleta que deixei no banco do carona na noite anterior. Há uma arma e balas pratas que brilham como se me chamassem para serem logo usadas.

Segurar essa arma sempre me traz uma sensação de poder, sinto que mesmo como humana eu seria capaz de ganhar com ela. Chegou a hora.

~~~

Música(s) do capítulo:
- Bad - Royal Deluxe

[Todas as referências estarão nos créditos no fim do livro]

A Última Vampira (2ª edição) - Livro UmOnde histórias criam vida. Descubra agora