CHEGUEI EM CASA pouco depois do meio-dia. Isso era o mais legal do Running Start: uma carga horária completa consistia em apenas três aulas. Duas delas duravam uma hora, cinco dias por semana, mas biologia, a aula que durava duas horas, era só às terças, quartas e quintas. O restante de meus amigos ainda estava no colégio, ouvindo as mesmas fofocas de sempre, comendo no mesmo refeitório de sempre, assistindo às mesmas aulas de sempre.
Como podiam ser felizes assim? Como não sentiam aquelas paredes horríveis de concreto se fechando, como um caixão para prendê-los eternamente?
A casa estava vazia, porque meus pais trabalham em período integral. Minha mãe é engenheira na Boeing e meu pai, professor de educação física.
Na Enumclaw High School.
E ele nem é o tipo de professor de quem as pessoas gostam, o que nunca me rendeu pontos com os colegas de turma. Pai, se por algum motivo estiver lendo isto, desculpe pelo que acabei de escrever. Não é por você não ser bom no que faz. Você é. Só que é muito exigente, não é o tipo de professor “legal” de quem os alunos gostam. Até você deve saber que preferimos professores tranquilos e divertidos, e não os que sempre nos pressionam. Mas é exatamente isso o que você faz. Quem você é. Você pressiona os alunos como sempre fez comigo.
Para ser justa, você só pressiona até onde sabe que pode. Só quer que todo mundo explore seu potencial. Eu sei disso. Você estava certo no ano passado: Ben Phillips era preguiçoso, e, se não fosse por você, ele não teria entrado no time de futebol americano, o que sempre disse que queria, mas ainda não havia conseguido. Em determinado ponto, antes do ensino médio, encarei tudo isso como um desafio. Quase uma paixão, na verdade. A busca da perfeição, a busca daquele abraço, da recompensa, de saber que me saí bem. Eu me tornava melhor a cada aprovação que recebia de meus pais.
E é por isso que, em todos os boletins ao longo de toda a minha história, havia um reluzente A em todas as matérias. Até em educação física, área de meu pai, o que era quase impossível de conseguir, já que herdei a capacidade atlética de minha mãe, e não a dele.
Bem, a questão é que, em algum momento da vida, percebi que havia subido em um avião e o observara decolar, e tudo que podia fazer era permanecer sentada com o cinto de segurança apertado, esperando pousar em um destino predeterminado. Um destino que eu não tinha mais certeza de desejar.
Em certo momento, decidi que não queria mais ser pressionada. Não queria ser perfeita em tudo, não queria o exato caminho que me levasse a Harvard ou ao MIT. Só queria parar, desafivelar o cinto de segurança e pular do avião, mas não sabia se haveria paraquedas, se teria um pouso seguro.
E, para minha mãe e meu pai, ter um plano B era absolutamente necessário. Não se pode dar ponto sem nó. Mas a admiração de meus pais já não bastava mais. Os comentários de “bom trabalho”, os tapinhas nas costas… não significavam nada.
Naquele dia, enquanto assistia à TV, em vez de me sentir sufocada e presa, minha mente se encheu de imagens suas, Bennett, sorrindo para mim. Repassei o momento em que seus olhos desceram, e, mesmo horas depois, minhas bochechas ardiam, e torci com todas as forças para não ter imaginado aquele olhar, porque ele me fez sentir… diferente. Viva. Desejada.
Às três da tarde, levantei-me do sofá e fui para o quarto. Espalhei os livros no chão, com algumas folhas aleatórias das aulas, e me sentei no meio de tudo. Como se cronometrado, a porta da garagem fez barulho. Então, a dos fundos foi aberta e fechada com um silvo, e ouvi os tênis de meu pai avançarem pelo piso velho de madeira, cada tábua gemendo conforme ele passava.
Cruzei as pernas e me inclinei para a frente, apoiada nos cotovelos. Peguei a ementa de sua aula e olhei para ela como se ali estivesse o sentido da vida. Meu pai entrou no quarto, sua sombra se espalhou pelo chão, e olhei para cima, fingindo surpresa.
— Ah, oi — cumprimentei-o, pondo a ementa no chão.
Para disfarçar, bocejei e me espreguicei.
Meu pai sorriu conforme passava os olhos por meus livros, desempenhando seu papel com precisão.
— Já se adiantando?
Assenti, e concluí que esfregar os olhos seria demais. Então, em vez disso, brinquei com uma mecha de cabelo, enrolei-a nos dedos, lembrando-me de todas as vezes que minha mãe prendera meu cabelo em um coque perfeito e brilhoso quando eu dançava balé.
— É. Acho que algumas matérias vão ser bem difíceis.
— Nada que você não consiga encarar — comentou ele, olhando-me nos olhos.
Não era uma pergunta, apenas uma simples constatação. Ele esperava que eu concordasse, que aceitasse o desafio, exatamente como sempre fiz, porque ele estivera lá para me ver entrar no avião e apertar o cinto. Ele assistira à minha trajetória durante anos, e aquele era apenas um quilômetro a mais para eu me aproximar de meu destino.
Nunca entendi o ditado “Não se vê a floresta quando se olha só para uma árvore”. Para mim, parece mais que não é possível enxugar direito quem está bem a seu lado o tempo todo.
Não dá para ver o momento em que essas pessoas mudam, o momento em que querem ser outra pessoa, porque você sempre as verá da mesma forma.
— Pode deixar — concordei, virando para me deitar de bruços e pegar o livro de inglês.
E então, bem quando o roteiro progrediu para saída de cena, ele foi para a cozinha preparar o jantar.
Bennett, todos os dias eram assim. Todos os dias eu fazia as coisas do jeito certo. Explorava meu potencial. Desafiava a mim mesma. Pensava no futuro. Blá-blá-blá. Dia frustrante após dia frustrante, eu permanecia no avião, olhando para a frente e me perguntando por que não queria mais ir àquele lugar que antes parecia tão promissor.
E naquele dia meu pai não me questionou porque viu apenas a pessoa que fui durante anos. A filha perfeita e estudiosa que eu não queria mais ser. Eu tinha seis anos quando, pela primeira vez, ele me disse que, assim como minha mãe, eu estudaria em uma faculdade da Ivy League. Que eu faria escolhas inteligentes, assim como ela, e não teria objetivos pretensiosos e idiotas, que poderiam se estilhaçar — assim como aconteceu com a patela dele —, nem teria sonhos que poderiam ser desfeitos, como o dele de jogar na liga de futebol americano.
Eu traçaria uma trajetória cuidadosa e alcançaria o sucesso de maneira calculada, ou então estaria fadada a uma carreira de segunda categoria como técnica de futebol americano em algum colégio ou professora de educação física. Porque se acomodar… era o mesmo que falhar. Veja bem, Bennett, eu estava cansada de tudo isso. Muito cansada. Escolhi o programa Running Start porque vi liberdade nele. Vi as horas que teria só para mim. Vi a fuga para um campus onde meu pai não dava aula no ginásio B.
E naquela noite, quando adormeci, vi você.
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A Verdade Sobre Nós
RomanceMadelyn Hawkins está cansada. Cansada de ser sempre perfeita. Cansada de tirar A em tudo. Cansada de seguir à risca os planos que os pais fizeram para ela. Madelyn Hawkins está cansada de ser algo que não é, algo que não quer ser. E então ela conhec...