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NAS SEMANAS SEGUINTES, você e eu passamos muito tempo em sua casa ou perto do rio, mesmo com o ar ficando mais frio e as folhas sendo sopradas pelo vento do outono. Acho que não era tão diferente de me esconder em seu armário... era nossa forma de ficar longe de olhos curiosos, de perguntas, de pessoas vendo o que não deveriam.

Nunca falamos sobre isso, porque reconhecer que estávamos fazendo algo contra as regras, bem, isso teria deixado claro demais que era errado ficarmos juntos. Portanto, deixamos a verdade pairar ao fundo, sempre presente, mas nunca evidente.

Certa noite, estávamos deitados lado a lado em seu quintal, sob dois cobertores espessos, olhando para as estrelas lá em cima, enquanto a grama alta congelava e ficava áspera a nosso redor, e nossa respiração saía em lufadas brancas. Até Voldemort, com o pelo grosso, havia perdido a vontade de ficar do lado de fora e se recolhera para sua cama quente lá dentro.

Novembro. Estávamos nos aproximando cada vez mais do inverno, e, naquela noite, nem estávamos aninhados; seria ir longe demais. Mas estávamos tão próximos que nos tocávamos dos ombros aos quadris e nos tornozelos, e o calor de seu corpo se espalhava por mim.

Eu deveria ter ido embora uma hora antes. Sabia que meus pais estariam se perguntando aonde eu fora, mas não consegui lhe dizer. Tinha deixado o celular dentro de sua casa, no silencioso, então nem fazia ideia se eles haviam começado a ligar. Ficamos conversando por horas, e eu não me separaria de você de jeito nenhum.

Eu olhava para as estrelas enquanto ouvia o tom melódico de sua voz, lembrando-me dela naquele primeiro dia de aula, antes de ficarmos assim tão próximos, quando eu não era ninguém para você.

— Ela era... linda. — Seu tom era amargo e saudoso ao mesmo tempo. Você olhou para mim antes de voltar a observar as estrelas. — Não bonita como você... — acrescentou, deixando a frase no ar.

E, de alguma forma, não me senti insultada nem magoada. De alguma forma, em poucas semanas, eu me sentia segura, sabia que você estava deixando todo mundo de lado por mim enquanto esperava as semanas passarem. Além do mais, você a estava elogiando como se fosse um defeito.

— Ela era como uma boneca de porcelana, ou como as estrelas. Bonita de se ver, mas intocável.

Puxei o cobertor até o queixo para afastar o frio que tomava conta de nosso pequeno paraíso.

— Ela era o tipo de garota que entrava em um lugar e todo mundo olhava. Eu sabia que não tinha a menor chance, então nem me aproximei, como todo mundo fez. Joguei sinuca e a ignorei. Mas aí... ela me desafiou a jogar uma partida. Jogamos durante seis horas e nunca terminamos esse primeiro jogo porque não conseguíamos parar de falar.

Eu não sabia aonde você queria chegar com a história, e ficava cada vez mais difícil ouvir sobre ela... sua linda ex-namorada.

— O que deu errado? — perguntei, depois de perceber que você tinha parado e que o silêncio reinava a nosso redor.

Eu esperava ouvir grilos, sapos, pássaros... mas estávamos bem no fim do outono, e a promessa do inverno afastava todos os animais.

— Moramos juntos por seis meses durante o último ano da faculdade. Fizemos muitos planos, sobre onde morar, onde trabalhar. Ela estudava moda, e ambos sabíamos que era um campo difícil fora de Nova York ou Los Angeles, então prometi me mudar para que ficássemos juntos. Mas ela ficou inquieta. Concluiu que não queria tudo que havíamos planejado e me abandonou.

— Sinto muito — falei. Embora não sentisse, não de verdade, porque, se tivesse ficado com ela, você não estaria comigo. — Quanto tempo faz isso?

— Pouco mais de um ano. — Você soltou um longo suspiro, e uma névoa branca surgiu acima de nós. — Cheguei em casa e o armário estava vazio, e ela havia deixado um bilhete na bancada. — Você riu baixinho, mas não achando graça de verdade, e sim com amargura. — Quer saber o que dizia?

A Verdade Sobre NósOnde histórias criam vida. Descubra agora