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DIAS DEPOIS precisei passar no colégio pela primeira vez desde o início do ano letivo. Quando abri a porta dupla do saguão principal, fui recebida pelo silêncio.

Foi estranho andar pelos corredores ouvindo o baque seco de meus passos no carpete gasto, escutando o tinido de um armário ao longe sendo trancado. As portas das salas a meu redor encontravam-se fechadas, estava tendo aula. Atrás delas, havia o zumbido baixo de vozes. Poucos meses haviam se passado desde o fim de meu segundo ano, mas pareciam séculos. Como se eu tivesse me formado anos antes e estivesse passando lá para dar um “oi”.

Era um sentimento bobo. Eu ainda estava matriculada lá. Ainda era uma aluna. E, mesmo assim, quando Marina Reynolds, uma garota de quem já tive medo, surgiu no corredor com aquele olhar penetrante e tão familiar, examinando minha roupa antes de soltar um sorrisinho de deboche, não senti a pontada de mal-estar de sempre. Não puxei a barra da camisa nem desviei o olhar na esperança de que ela não me visse.

Eu tinha um segredo, Bennett, um segredo que superaria qualquer troféu do ensino médio, as saias das líderes de torcida e os pares nos bailes. Era como uma vela brilhando dentro de mim, aquecendo-me, acabando com a escuridão.

Era isso que você representava para mim. Um brilho de calor em um mundo que parecia tão frio, tão vazio… tão sem sentido.

Virei em outro corredor. O letreiro Diretoria me recepcionou. Passei pela porta e segui por um corredor que me levaria ao escritório da minha orientadora. Eu precisava vê-la regularmente para planejar os estudos. Nem todas as aulas na faculdade contavam para os requisitos da formatura do ensino médio, então ela precisava ver meu planejamento, ter certeza de que eu me matricularia nas matérias certas no trimestre seguinte.

Acho que foi sorte biologia contar para meu diploma. E se tivesse sido química, Bennett?

Eu jamais teria conhecido você.

Espere: talvez não tenha sido sorte, não para você. Talvez tenha sido uma coincidência fatídica.

A porta do escritório estava aberta, então bati na imitação de carvalho, e ela ergueu o olhar do celular, a testa franzida transformando-se em um sorriso largo demais.

— Madelyn! Você chegou cedo.

Soou como uma acusação, como se eu tivesse interrompido algo mais importante do que a trajetória do resto da minha vida.

— Desculpe. Devo voltar depois?

Ela negou com a cabeça, e os cachos tingidos de ruivo balançaram ao redor das orelhas.

— Não, não, tudo bem. Vou pegar sua pasta. Venha, sente-se.

Entrei e me sentei rápido demais na cadeira em frente à mesa dela, e o acolchoado de vinil do assento chiou um pouco com a passagem de ar entre as fissuras. Ela atravessou a sala e abriu um dos armários pretos, passando os dedos pelas abas até encontrar o arquivo que continha os últimos anos de minha vida.

Havia tanto sobre mim acumulado naquela pasta fina… Tantos boletins, notas de simulados, panfletos de faculdade com marcas destacando as exigências para matrícula. Ainda assim, tão pouco estava ali de verdade. A pessoa presa naquela pasta era uma estranha, um robô. Uma garota em uma gaiola dourada que sabia sorrir na hora certa.

A garota que minha família conhecia, a garota com quem eu não conseguia mais me identificar.

— Muito bem. E então? Como foram as duas primeiras semanas? Algum problema?

Balancei a cabeça.

— Não, as aulas são boas.

— Não são muito difíceis? Eu estava um pouco preocupada com o volume de disciplinas dos cursos gerais logo de cara. A maioria dos alunos faz artes ou informática no primeiro trimestre. Para se acostumar com as coisas. — Ela fez uma pausa e me observou por cima do aro dos óculos estilosos, de um azul vibrante. — Afinal, você tem dezesseis anos e está assistindo às aulas com adultos.

A Verdade Sobre NósOnde histórias criam vida. Descubra agora