•Capítulo 23•

1.7K 212 179
                                    

Era o dia do casamento. 

Não dormi na noite anterior, mesmo com remédios. Estava tudo confuso, uma mistura de sentimentos que eu não sabia decifrar, mas eu tinha certeza que algo dentro de mim havia se partido e eu não sabia consertar.

Estava na mesma a dias, enrolada em um cobertor sentada no sofá. O catálogo da Netflix já não tinha mais nada de que me agradava, havia terminado todas as séries e filmes deixados pelas metade, na TV rolava algum episódio de Naruto clássico, o episódio em que o Naruto, a Sakura e o Sasuke estavam decididos a descobrir o que existia abaixo da máscara do Kakashi e isso me rendeu algumas risadas.

Eu não fui o suficiente? Eu não fui capaz de fazê-lo feliz e de o satisfazer? Eu sou tão ruim a ponto dele não resistir a algo do passado? Por quê?

Essas perguntas pairavam em minha mente a todo momento. O sentimento de ser insuficiente para meu parceiro. A culpa era dele, eu sabia disso mas não podia evitar me culpar também. Havia perdido noção de tempo, meu apartamento estava totalmente escuro a dias, meu celular, joguei na parede quando precisei afogar minhas mágoas no álcool. Me arrependo disso. E mesmo assim eu sabia que era dia do casamento, estava marcado no calendário em minha parede.

Minha campainha começou a tocar freneticamente. Quem poderia ser? Me levantei com muito esforço e atendi a porta.

ㅡ Kenma? O que faz aqui?ㅡ ele vestia um terno com uma gravata vermelha, os fios louros completamente no lugar e em uma das mãos uma caixa grande.

ㅡ Hoje é o casamento.

Um suspiro alto foi arrancado de mim com o peso da lembrança.

ㅡ Eu sei.

ㅡ Então? Você vai.

ㅡ Não Kenma, eu sei quando um lugar não me cabe.

ㅡ Ele quer você lá. 

ㅡ Para quê? Presenciar os votos e vê-lo eternizando sua felicidade?

ㅡ Ele não está feliz

ㅡ Quer saber Kenma, você já me cansou disso. Pare de defender ele.

ㅡ Não estou defendendo, estou falando a verdade. Ele mandou pra vocêㅡ colocou a caixa em minhas mãosㅡ Você não vai precisar falar nada, se sente na última fileira, faça o que quiser quando chegar lá, mas vamos comigo.

ㅡ Kenma…entre e espere eu me arrumar, não quero chegar só.

ㅡ Claro.

Ele entrou e se sentou no sofá, pegou seu Nintendo e me olhou uma última vez.

ㅡ Leve o tempo que precisarㅡ me ofereceu o sorriso e inclinou um pouco a cabeça para o lado. Kenma era lindo.

ㅡ Obrigado.

Me virei e fui para o quarto, minha ansiedade havia triplicado, eu tinha certeza que o que estava na caixa era lindo. Ele tinha bom gosto, sempre me ajudava a escolher as roupas e tinha paciência para isso. Eu não. Me sentei na cama e coloquei a caixa de lado, estava com medo, rezei para que não tivesse nenhuma carta ali dentro, nenhuma despedida ou algo que me fizesse chorar até ser incapaz de me levantar de volta.

Tirei o laço dourado que amarrava a caixa preta, hesitei um pouco em abrir mas no fim não resisti. Não dava para ver detalhes do vestido, mas ele tinha uma cor azul celeste, ele amava essa cor, ele amava essa cor em mim, ele amava a harmonia do azul com minha pele bronzeada, ele dizia que lembrava o céu e o céu é infinito, igual nosso amor. 

Deixei a caixa de lado e fui para o banheiro, tomei um banho demorado e me enrolei na toalha, fiz uma maquiagem e finalizei meu cabelo. Voltei para o vestido, o encarei por algum tempo e o segurei pela alça o erguendo, ele é muito mais lindo do que eu imaginava. Alças finas, decote em V, sem fendas e com pequenas partículas de brilho. Eu queria poder rasgar esse vestido, mas ele é tão encantador, não teria coragem nem em mil anos. Para finalizar, nos pés um salto baixo e branco.

ㅡ Estou pronta.

A atenção de Kenma se desviou do jogo e eu tive certeza que ouvi o Nintendo dizer K.O quando ele me olhou e seu queixo caiu.

ㅡ Ele acertou no vestido. Você está deslumbrante.

ㅡ Obrigado. Vamos? 

ㅡ Claro. Mas antes..ㅡ ele se levantou e veio até mim. Pegou uma caixinha de veludo preta do bolso e me entregou.

ㅡ Ele escolheu isso também? ㅡ perguntei sem graça.

ㅡ Não. Isso é um presente meu.

ㅡ Ele é lindo Kenma ㅡ uma fina corrente prateada e um pingente de diamanteㅡ e deve ter custado o olho da cara.

Ele riu e negou com a cabeça. Pegou o colar e o colocou em mim, agradeci novamente e saímos do apartamento, fomos até o estacionamento e entramos no carro. Depois disso não lembro se demorou muito para chegarmos, apenas me tirei daquela realidade tenebrosa. Apesar de Kenma ali do meu lado, o mundo ainda era um fardo difícil de ser carregado. 

A cerimônia seria em uma igreja, a festa no hotel, no mesmo dia em que decidimos que queríamos pertencer um ao outro. Só ficaria para a cerimônia.

Assim que entrei, encontrei o pai do Kuroo, me desvencilhei do braço de Kenma é fui em sua direção, ele me recebeu com um abraço caloroso e um sorriso mas ainda sim dava para ver que ele sentia pena de mim, e por um momento senti vontade de gritar com Ele, não precisava da pena de ninguém. 

ㅡ Como você está?ㅡ ele perguntou.

ㅡ Estou bem, mesmo com tudo issoㅡ mentira mentira mentira mentira. Quero gritar e virar esse lugar de ponta cabeça.

ㅡ Que bom. Precisar de alguma coisa sabe com quem falar, aproveite a cerimônia.

ㅡ Obrigado.

Kenma o cumprimentou com um aperto de não formal e saiu comigo, nos sentamos na última fileira. Podia escutar pessoas cochichando umas no ouvido das outras, queria ir embora. Não demorou para a cerimônia começar. E ele estava lá, no altar, completamente bem vestido e lindo. Não olhava para as pessoas que o assistia, imaginei que por medo de me ver lá, ou então, decepcionado por eu não estar lá. Mas aqui estou, em carne, osso e lágrimas querendo sair. Eu me imaginei ali, era para ser eu entrando na igreja. 

A música começou a tocar e meu coração batia exageradamente rápido, minhas mãos suavam e tremiam, se alguém chegasse muito perto com certeza ouviria as batidas exageradas e barulhentas coração partido que habita em meu peito.  A noiva entrou, sozinha, apenas com o buquê em mãos. Ela era linda, odiava falar isso, mas era, fatos não podem ser negados e naquela hora Kuroo olhou para ela, e rolou o olhar pelas pessoas me procurando, queria me esconder mas fui achada, seus olhos se fixaram em mim e mesmo de longe sabia o que se passava em sua mente, ele queria correr daquele altar, puxar minha mão e sair correndo, eu iria.

"Eu te amo" falou sem emitir som. E naquele momento a noiva me olhou com raiva. Não retribui o olhar, apenas abaixei a cabeça e deixei que aquilo tudo acabasse. Não ouvi os votos. E depois, finalmente acabou. 

Depois de falar com os convidados, Kuroo me procurou e eu me escondi o máximo que pude, implorei para Kenma me levar embora e ele não negou. Quando entrei no carro, finalmente consegui me acalmar e fomos embora. Me despedi de Kenma e subi até o apartamento, ele teria que ir para o hotel, era melhor amigo do noivo e fiquei feliz por isso, queria ficar só. Entrei no meu quarto, tirei o vestido e me sentei na cama ao lado da caixa. Percebi algo que não tinha reparado antes. Uma carta, na mesma cor que a caixa, preta e um selo de cera dourado. 

𝐃𝐄𝐒𝐓𝐈𝐍𝐀𝐃𝐀; Kuroo TetsurouOnde histórias criam vida. Descubra agora