Cap. 40 - Ela mentiu

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Pov Juliette Freire

Brookside, Texas

— Realmente não consigo entender essa fascinação. — Carla dá de ombros quando nos acomodamos no topo da torre da caixa d ́água de Brookside. — Além do mais, esta coisa está tão enferrujada que acho que vamos cair a qualquer segundo.

— Olhe em volta, não é lindo? — pergunto ao apontar lá embaixo para o campo árido e queimado pelo sol, que está começando a se pôr ao longe.

— Sinceramente? Acho meio sinistro aqui em cima.

— Sinistro? O que tem de sinistro aqui?

— Sei lá. Acho que é meio... — Ela tem dificuldade em encontrar a palavra certa. — Solitário.

Talvez Carla só esteja pegando minha vibração, porque é exatamente assim que tenho me sentido nos últimos dias: solitária. Embora Carla tenha estado comigo desde que voltei ao Texas, a tristeza e a solidão me consomem.

— Como você poderia se sentir sozinha quando eu tenho sido uma companhia tão maravilhosa?

Bato meu ombro no dela pela primeira vez desde que voltei. Estou num estado lamentável e nós duas sabemos disso.

— Você é um tipo de draga — ela brinca, ainda que seja verdade.

— Sinto muito.

— Não seja ridícula. Mesmo você sendo uma péssima companhia, ainda prefiro ficar aqui com você a estar no estacionamento de trailer tomando conta dos rebentos da minha mãe.

— Nossa, obrigada. Sou melhor do que os rebentos. Isso me faz sentir fantástica.

— De nada. — Ela força um sorriso.

Meu celular toca dentro do bolso. Ela tem ligado desde que fui embora, mas não consigo atender. Só vai tornar as coisas ainda mais difíceis.

— Vai atender?

— Não.

— Por que não?

— Por que atenderia? Só para ouvi-la dizer que nunca gostou de mim de verdade... que só estava me usando para ocupar o lugar dela.

— Sua tia Claire parece achar que ela realmente gosta de você. Sarah já foi à casa dela uma dúzia de vezes para tentar conseguir meu endereço.

— Por que eu deveria confiar em qualquer coisa que a tia Claire diz? Ela sabia de tudo. Por favor, pode parar de atender o telefone quando ela ligar?

— Tudo bem. — Ela bufa.

— Além do mais, a tia Claire não sabe da metade das coisas que Sarah aprontou. Se ela soubesse, ela não acreditaria que Sarah era tão verdadeira.

— Do que ela não sabe?

— A mãe de Emily me contou que Sarah sabia. Ela não hesitou em nenhum momento. Ela me disse, claramente, que ela estava me usando para substituir a filha dela. Ela a conhece desde que era pequena. Nós corríamos juntas. Ela corria com Emily o tempo todo. Essa era a coisa delas. Sarah a levava aos faróis.

— Tudo bem. Mas vocês eram gêmeas, Juliette. É tão estranho assim que vocês duas gostassem de correr e de visitar faróis? — Carla dá de ombros.

— Sarah mentiu na minha cara. Ela me disse que passava pelos faróis o tempo todo e nunca nem os notou até me conhecer. Mas tinha uma foto delas em pé na frente de um farol no quarto de Emily. E quando encontramos o Dr. Bennett no hospital, ela mentiu de novo. Ela me disse que o Dr. Bennett era um amigo da família. Por que mais ela mentiria?

— Não sei. Mas alguma coisa não bate.

— De que lado você está? Nem sabia que você gostava da Sarah.

— Estou sempre do seu lado. Estava preocupada que ela pudesse te magoar.

— Parece que você tinha uma boa razão para se preocupar.

Ela suspira.

— Tudo bem. Não vou ganhar essa discussão. Vou só continuar com o "eu te disse". Não tem que me perguntar duas vezes. É tão raro que eu tenha razão nas nossas vidas. — Ela sorri.

— Obrigada. Isso me faz sentir muito melhor. — Forço um sorriso. — Sabe o que mais está ferrado?

— Tem mais alguma coisa? — ela brinca.

— Eu perdi uma irmã e estou sofrendo mais por causa de Sarah.

— Você nunca teve uma irmã de verdade para perder.

— Também nunca tive Sarah.

                         *************

Sentamo-nos num silêncio cômodo até ficar escuro.

— Pronta para ir, Srta. Karla?

— Não acho que deva continuar me chamando pelo meu nome de celebridade se eu não vivo mais na Califórnia.

— Então vai ficar no Texas para sempre?

— Você é tudo o que tenho — digo com sarcasmo, embora seja verdade.

— Isso é bem triste. — Carla sorri e levanta-se, me oferecendo a mão. — Venha, vamos descer desse lugar deprimente.

Peças do destino - Versão SarietteOnde histórias criam vida. Descubra agora