Cap. 41 - Fui deixada para trás

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Pov Juliette Freire

Quatro Dias Depois

— Você checou o celular sessenta e três vezes em uma hora. — Carla despenca no sofá, do meu lado. Seu tom me faz perceber que ela está levemente mais impaciente com relação à minha obsessão de checar meu celular desde que cheguei aqui.

— Está contando quantas vezes checo meu celular? — Uso sarcasmo para encobrir o fato de que estou realmente consumida por isso ultimamente.

— Então me deixe entender isso direito. Você quer que ela ligue, para você não atender o celular? Só quero entrar na sua cabeça e entender que porcaria está passando aí.

— Ela não ligou nenhuma vez nos últimos dois dias — respondo com desânimo.

Carla é uma grande amiga, mas ninguém poderia entender o humor no qual me encontro nos últimos dias.

— Talvez seja porque você não atendeu as 987 ligações dela nos dois primeiros dias em que estava aqui. Já pensou nisso? Talvez ela tenha entendido o recado e sacou que você não quer falar com ela. Ou quer?

Carla tem boas intenções. Sei que não faz sentido, mas não quero falar com Sarah e, ao mesmo tempo, não quero que ela pare de ligar. Em vez de explicar, mudo de assunto.

— Vou ao Kroger ́s esta semana para ver se consigo meu emprego de volta.

— Você realmente tem a intenção de sair da escola e tirar um Certificado de Equivalência Escolar? Você era a melhor aluna da Brookside antes de ir embora — Carla me repreende.

Parece que trocamos de papéis ultimamente. Ela não levou muito tempo para se sentir confortável em seu novo tom maternal de dar sermão.

— Preciso economizar para ter um lugar meu, Cah.

Estou de volta ao Texas há quatro dias e a mãe de Carla já mencionou algumas vezes o quanto está apertado no trailer. Penhorar o anel de safira que minha tia me deu, pagou pelas passagens de ônibus e ainda tenho um pouco de dinheiro sobrando, mas definitivamente não é o suficiente para seguir minha vida sozinha.
Acho que nunca superarei a culpa de vender um anel que um dia foi da minha avó. Tenho tão poucas lembranças da mamãe sorrindo. O anel me deu visões da mamãe e da tia Claire, jovens, rindo juntas, enquanto brincavam de colocar fantasias, fingindo ser princesas.

Preciso espairecer.

— Vou dar uma corrida. Quer vir?

— Correr? — Ela olha para mim como se eu fosse louca. — Eu nem andaria, se pudesse escolher.

                         **************

Não contei a Carla que minha corrida me levaria ao cemitério; tenho estado deprimida o
suficiente nos últimos dias. Desde que voltei ao Texas, tudo o que quis fazer foi ver a mamãe. Só gostaria que não fosse uma lápide o que iria ver.

A única indicação do lote da mamãe é um simples marcador de ardósia, tão diferente da lápide enfeitada que indica o túmulo da minha irmã. Já faz tempo que estive aqui, a terra que deixei para trás se transformou em grama verde. O lugar dela se parece com o de todo mundo aqui. Sinto-me mal por não haver nada que faça seu lugar chamar a atenção.

Sento-me por um momento, pensando no quanto minha vida mudou desde a última vez em que estive aqui. Eu também estava triste naquele dia.

— Sinto saudades, mamãe — eu murmuro. — Pelo menos a Emily tem você. — Uma lágrima escorre pelo meu rosto. — Por que eu que fui deixada para trás?

Peças do destino - Versão SarietteOnde histórias criam vida. Descubra agora