Cap. 19 - Ela me faz sentir

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Pov Sarah Andrade

Ao entrar pela porta da frente de casa, percebo que não consigo nem me lembrar da volta da casa de Juliette. Isso acontece muito ultimamente. Minutos, horas e dias desaparecem. Estou viva, mas não vivendo de verdade. É o que eu mereço. Não mereço sentir nada. Não quando a Emily não pode mais sentir.

Mas estar perto de Juliette me faz sentir. E não está só dentro da minha cabeça. É físico também. Uma força, um baque, uma energia que me tira instantaneamente do mundo dos mortos. Até mesmo o toque mais leve, um simples aperto de mão, me traz de volta à vida.

Óbvio que me lembro da excitação de estar perto da Emily. A dor nos meus testículos só de vê-la em um biquíni. Mas não me lembro disso. Quando Juliette tropeçou ao sair do carro esta noite, minhas pernas ficaram tão fracas ao toque do corpo dela que eu quase caí. Que merda há de errado comigo?

Viro de um lado para o outro a noite toda, tentando aniquilar o sentimento, mas as emoções são simplesmente muito fortes. Tomo uma ducha antes de ir à escola na manhã seguinte, dizendo a mim mesma que tudo o que preciso fazer é ficar longe dela. Se não tocá-la, o sentimento não voltará. Deve ser simples.

                         **************

Fico triste que nada pareça ter mudado, mas, mesmo assim, que tudo esteja diferente. A falta de sensibilidade pela qual busquei tão desesperadamente a noite passada encontrou-me no momento em que pisei na escola. Talvez fosse a visão de um grupo de garotas tagarelas no pátio que me fez lembrar de Emily. Corpos lindos perfeitamente vestidos. Feitas para serem admiradas. O pátio era o lugar favorito de Emily para exibir seus modelos de passarela.

Entrar na escola não fica mais fácil com o passar dos dias. Meu pai disse que ficaria, assim como o líder de grupo de apoio ao qual minha mãe e meu pai me fizeram ir todas as semanas durante o verão. Mas estão errados. Todos estão errados.

Acontece a mesma coisa quando entro na sala do Sr. Davis. Percebo que o percurso entre o pátio e a classe está perdido. Mas, quando entro na sala de Inglês, sou puxada de volta diante da visão de Juliette. A única carteira vazia na sala é bem atrás dela. Ela está com os olhos baixados sobre o livro, aparentemente sem ser afetada por todos ao redor dela... Caras se exibindo, garotas falando de seus sapatos ridiculamente caros.

Suspiro profundamente e caminho até a carteira. Quase passo despercebida quando ela levanta os olhos e me vê. Reconheço a expressão no rosto dela. Ela não sabe como reagir à minha presença. É uma expressão com a qual me familiarizei muito nos últimos meses.

Thaís ou não nota ou ignora o minha morbidez.

— Ei, Sarah. Obrigada por levar o Bill e a Ju ontem à noite. Meu carro está fora de serviço por ora.

— Sem problema — resmungo enquanto sento atrás da Juliette e ao lado da Thaís.

Bill se joga na cadeira do outro lado.

— O treinador disse que é melhor você aparecer no treino de futebol hoje se quiser jogar na abertura. — Ele tenta soar como se só estivesse dando um recado, mas também está curioso querendo saber se vou voltar para o time.

— Só perdi alguns dias — eu retruco.

— Alguns dias e o verão inteiro — ele lembra rapidamente. — Se fosse qualquer outro, ele nem deixaria jogar. Mas acho que está falando sério. É melhor ir ao treino hoje.

Juliette levanta os olhos das anotações se esforçando para prestar atenção. Nossos olhos se encontram e ela rapidamente afasta o olhar. Não há um sorriso em seu rosto. Preciso vê-lo e ser a pessoa quem coloca o sorriso ali.

Tentando levar numa boa e aliviar a tensão no ar, respondo a Bill, mas olho para Juliete.

— Acho que terei mesmo que voltar ao time. A coitada da Juliette não precisa ver você tentando jogar de quarterback nas boas-vindas. Não seria justo com nossa nova colega de classe.

Juliette se vira na minha direção, um sorriso lhe iluminando o rosto. E lá está de novo: aquela sensação de estar viva.

Os quarenta e cinco minutos seguintes da aula de Inglês voam enquanto eu observo Juliette pelas costas. Não o tipo de "pelas costas" que a maioria gosta de observar. Em vez disso, observo seus cabelos balançarem pelos ombros enquanto ela se mexe para frente e para trás na cadeira. Ela parece quase inquieta, mal conseguindo ficar parada.

Penso em lhe dizer alguma coisa diretamente quando saímos da classe, mas Bill estraga a oportunidade, seu corpo gigante bloqueando meu caminho, ainda esperando por uma resposta de verdade; ele não desiste.

— Vou pegar leve no treino. Não quero te machucar, já que está tão fora de forma e tudo mais — Bill joga a isca para mim.

— Pegar leve comigo? É você quem está fora de forma, amigão. — Enquanto caminhamos pelo corredor, eu o empurro de leve para cima dos armários perfilados ao lado dele.
Bill se recupera e devolve o empurrão, resmungando.

— Essa sua cara bonita vai acabar machucada se tentar isso de novo. É uma ameaça, mas não há nada que não seja prazer na voz dele.

Alguns outros membros do time nos alcançam. Durante a semana toda, os corredores têm estado inundados com a conversa das boas-vindas e do grande jogo e hoje não é diferente. Os egos dos jogadores de futebol americano lotam os corredores enquanto eu desvio para minha próxima aula.

— Te vejo no treino — Bill grita para mim com convicção enquanto desapareço na aula de Química.

— Essa sua cara bonita vai acabar machucada se tentar isso de novo. É uma ameaça, mas não há nada que não seja prazer na voz dele.

Peças do destino - Versão SarietteOnde histórias criam vida. Descubra agora