MORTE

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Yori

Se é verdade que tudo termina como começa, aqui estou. De volta ao começo. Não um começo onde eu estava 'trepando' e levei chumbo no peito, mas a parte de estar morrendo.
Talvez essa seja mesmo minha sina: morrer.
Mas desta vez, tem algo diferente; morrerei ao lado de alguém com quem passei a me importar e amar.
Eu sei, parece clichê, a vilã que se apaixona e passa por uma redenção no final ao salvar a pessoa amada.
Pior que não estou vendo isso como uma redenção.

Passei vários dias viajando e depois tive que matar muitos homens pra entrar nessa montanha, sendo que eu não deveria transgredir a vida, espero que alguém lá no céu entenda que dessa vez não foi por prazer, mas por necessidade.
Não, espera, estou mentindo, senti um pouquinho de prazer, afinal não seria eu se não sentisse.
A questão é que nunca imaginei que encontraria o príncipe naquelas condições miseráveis.
No momento em que o vi, soube que não haveria retorno, não tinha salvação para nós.
Ambos estaríamos inúteis perante nossos inimigos, porque sequer passou por minha cabeça abandoná-lo.

Isso, porém, não mudou o fato de que ainda queria tirá-lo dali. O sombra poderia cuidar dele noutro lugar, longe da cidade imperial.
Com certeza, esse pequeno raio de esperança valia meu último esforço.
E por que digo último esforço? Simples, levei uma bela flechada no peito e o sangue que Aaheru viu é o meu e não dos inimigos, mas para que afligi-lo com isso, se já está todo quebrado? Ele tem suas próprias preocupações.
Definitivamente, não serei mais um peso.
Por sorte, o sombra entendeu que não deveria falar nada sobre meu estado.
Não havia mais o que fazer além de remover a flecha e fazer um curativo de emergência.
Se fosse em minha antiga vida, eu já estaria morta. Mas aqui tenho um corpo excepcional, o que me garante mais algum tempo de sobrevida.

Após nossa pequena reunião, seguimos adiante na tentativa de escapar desse lugar horrível.
Embora estejamos totalmente focados em manter o príncipe caminhando, vez ou outra o sombra me olha de esguelha, procurando algum sinal de que eu não esteja aguentando e vá cair dura no chão.
E pouco mais adiante nos deparamos com o que eu temia: nosso inimigo está a nossa espreita.
Que maravilha!

— É o fim da linha, demônio da guerra! — o comandante da tropa fala de uma forma séria e respeitosa, diretamente para  o príncipe.

Certo, ele parece um guerreiro de honra que só está fazendo seu trabalho, não que eu pretenda facilitar as coisas para ele.
Olho para meu homem totalmente abatido e falo:

— Ao menos tentamos! — dou um beijo nos seus lábios — Sombra, você ainda pode usar seu poder de se ocultar e cair fora daqui! — continuo com um sorriso meio de lado, só para provocá-lo, porque duvido que eles no deixe aqui sozinhos para salvar a própria pele.

— Fico com meus mestres até a morte! — ele afirma com uma breve reverência.

Soldado idiota!

— Seus tolos, por que não partiram quando lhes mandei?! — Aaheru esbraveja e vejo-o cuspir sangue.

— E perder a diversão, alteza?! — questiono, ignorando o fato de que não vamos dá nem pro começo nessa batalha.

— Eu não poderia amar outra que não fosse você! — ele me encara e solta essas palavras de despedida.

Assim do nada?!

— Agora já posso morrer em paz! — digo com melhor sorriso de menina má — Ah, alteza, eu também te amo!

Ele arregala os olhos diante da minha confissão, mas não temos como seguir com nossa conversa melosa.

— Já estão se despedindo? — o comandante me pergunta.

— Vocês também deveriam fazer o mesmo! — falo e dou uma piscadela pro sombra.

— Vamos morrer aqui, meu príncipe, mas levarei a montanha toda conosco! Deixaremos a cidade imperial na miséria, vamos ver se seu o imperador se ergue sem suas riquezas.

Aprendi muito na minha outra vida, então usar pólvora pra fazer bananas de dinamite e construir um pequeno detonador, foi a minha lição de casa durante os dias de viagem. O sombra me ajudou, embora não soubesse o que eu estava fazendo.
Arrumamos as bombas em locais imprescindíveis à sustentação desse lugar e com apenas um toque do meu dedo no pequeno detonador, tudo iria pelos ares.
Se a família imperial quisesse resgatar seu tesouro, iria levar centenas de anos pra revirar os escombros e faliria no processo.

Morreríamos sim, mas, de certa forma, levaríamos nossos inimigos junto, quer fosse por uma morte real ou a morte de suas finanças.
Os segundos pareciam eternos, quando os soldados começaram a vir sobre nós como um enxame de abelhas, era como se os visse em câmera lenta.
O sombra derrubou os três primeiros, enquanto grita para mim:

— Faça, princesa, AGORA!

— Então, vamos morrer juntos! — volto-me para o príncipe e o beijo — Pronto?

— Sempre! — diz e me beija.

Aciono o botão e o barulho das explosões parece uma sinfonia bem elaborada.
Imagino a dor, mas nada acontece, ao invés disso sinto uma sensação quente.
Será se desci pro inferno?
Bom, dado o meu histórico, não dá para duvidar de nada.
Apesar que o calor é confortável como num sonho. Sinto como se estivesse flutuando, mas são só sensações, não vejo nada de fato. Tudo é como se eu tivesse num sono profundo e caísse lentamente, dava até para sentir o friozinho na barriga.

De repente, me vejo entrar com um homem num quarto e estamos no maior amasso.
Isso não é real, porque não estou aqui realmente, minha figura é espectral e estou vendo a mim mesma brincar de cavalinho com o homem que meteu chumbo no meu peito na minha primeira vida.
Como assim? Por que estou revivendo essa cena como um espectador?
Não faz nenhum sentido nada disso.
Não é legal reviver essa merda.
Do nada estou levando chumbo e caindo.
Maldição! Sempre tive medo de morrer pelada, e isso foi ainda pior. O modo como meu corpo fica é tão deprimente que minha vontade é ir lá arrumar, mas não consigo me mover; uma força me mantém no lugar.

Espera um pouco, não foi o Henry que atirou em mim; o tiro veio de trás.
Olho naquela direção e tem um homem parado com uma pistola com silenciador na mão. Ele  é o Alysson, meu antigo parceiro, que por sinal dei um fora.
Mas que vadio, miserável! Ele continua a atirar mesmo depois que estou morta e Henry, apesar de levar alguns tiros também, consegue acertá-lo com uma estrela ninja,o que rasga sua garganta.
Não entendo o porquê, mas o movimento ninja do meu namorado parece tão familiar.
Puxo pela memória tentando lembrar o quê é exatamente e de súbito vem a imagem de Aaheru lutando comigo quando invadi sua mansão.

Que maldição é essa?

Novamente sou arrastada desse plano, e não é algo suave como antes, é brusco e repentino.
Caio com um baque forte no chão e solto um gemido de dor. A voz é estranha aos meus ouvidos, o que me deixa de cabelo em pé. Isso está ficando cada vez mais estranho.

Não, não...que voz é essa?

Uma Assassina Em Outro MundoOnde histórias criam vida. Descubra agora