21

47 8 96
                                    


Matthew Nighy

Sinto o meu corpo flácido e ardente, mas a cabeça não. Quase como se a minha alma tivesse saído do corpo e o visse de cima, os meus pensamentos não param. Ainda não entendi o que aconteceu, nem me lembro de muita coisa. Um breve resumo do que consigo precisar: Baile, Duquesa Sara, sangue e um cabelo castanho comprido a flutuar antes de apagar. Por algum motivo, a carta do meu pai vem-me à mente.
"Lembra-te que há um sítio. Há um sítio..." Mas que sítio? Tudo o que mais quero é ser normal, o trono não é para mim. Pai, envia-me algo, um sinal, por favor. De repente, lembro-me da caixa onde estava a carta. M.N! As iniciais são de Matheus Nighy, não de Matthey Nighy. Isso explica o porquê de haver uma fotografia de um casal e do meu pai novo, com um edifício atrás. Será esse o tal sítio? Mais importante ainda, o meu pai já lá esteve? A minha cabeça está a queimar com tanta agitação e sinto-a a girar, a girar, a girar...
De repente, os meus olhos abrem-se e nem tenho tempo de processar. Aparentemente, estou num quarto e ele está a a tremer levemente, mas posso estar em qualquer lado. Sento-me e olho melhor, vendo um rapaz alto e moreno a olhar para mim, é familiar mas não faço a mínima ideia de quem seja.

-Estás bem?- ouço-o a perguntar entre dentes, como quem não quer a coisa.

- Não? Le penses-tu vraiment, aveugle ? Que diable...- vejo-o a olhar para mim incrédulo e depois ri-se.

-Vai à merde, oui ?- vira costas e sai. Fico ali parado , por uns 5 minutos, a processar. Depois de uma sesta, tenho que aguardar que o meu cérebro comece a trabalhar. Levanto-me e saio da espécie de quarto, porque não sei onde estou. Ao andar, reparo numa porta semiaberta, espreito na esperança de encontrar a Eduarda, acho que o seu nome era assim. Até que presencio o beijo na testa que o outro dá à Sara, sentindo uma forte conexão no olhar deles. Prossigo e viro à esquerda, encontrando a Eduarda sentada a ler "Emma".

-Coucou! Comment as-vous?- levanta a cabeça, pousa o livro e salta para cima de mim, num abraço "caramelizado".

-Cazzo! Tinha-me esquecido dos meus ferimentos- diz Eduarda após sair do abraço.

-Puta Madre! Hijo de puta! No me jodas! - ouço alguém a atirar ao ar e a Eduarda afasta-se de mim, com um olhar mortífero.

-Qual é que a tua? Dylan, não.

- Qual é a minha, Maya? Qual é a vossa, ou melhor, qual é a tua-diz o tal Dylan olhando para mim enquanto se aproxima da Eduarda, descansando o braço na cintura da mesma. Ela tira o braço dele, sentando-se e pegando no seu livro.

-Fils de... Ainda à pouco estavas a beijar a Imperatriz Sara na testa e agora passas a mão na cintura da Eduarda.

- O que é que acabaste de chamar à minha irmã? Imperatriz Sara?- contra-ataca o outro.

-Irmã? Preciso de me acalmar, alguém me pode trazer um copo de água?- pedi, já com a boca seca e o cérebro mais confuso do que quando acordei.

-Eu trago. E Dylan... vamos falar sobre o teu comportamento, mais tarde- a Eduarda diz e, quando o Dylan faz menção de ir atrás dela, ela levanta a mão- Senta-te, adesso!

O ambiente ficou tenso e quase tenho pena dele, quase; ninguém o mandou começar aos gritos e a proferir palavras ofensivas perante os outros. Ela finalmente voltou com um pacote de bolachas de água e sal e um copo de água, retirei-me do cômodo quando vi nos olhos da Eduarda o fervor que de lá transcendia. Dirigi-me até o quarto da Duquesa Sara, uma vez que, da última vez que a vi não estava no seu estado mais saudável. Bato à porta e não obtenho resposta, por isso entro sem permissão.

-Sara- ainda tento chamar, mas ela estava a dormir profundamente. Não quero voltar para a sala, então acomodo-me numa cadeira e como uma bolacha, deixando o restante. Nunca pensei que viria a revelar isto, mas... se não fosse tão arrogante, seria agradável a sua presença. O seu aspeto é angelical e fatal, como se isso fosse possível. Irmã do Dylan? Quem diria...

Será que vai poder andar? Quem é que ela realmente é? Não a chamaram de Mya? Mya, Maya, quem são essas? Calma. Isto pode ser considerado rapto, não sei para onde vou, com quem estou e o que vão fazer. Não sei nada da minha mãe, não que me importe, o castelo ardeu e perdi todos os meus bens. Como estará a Rosetta? Fui interrompido desta linha de raciocínio, quando a Sara se mexeu e acordou.

-EU NÃO ACREDITO NISTO! O que é que estás aqui a fazer?

-Isso gostava eu de saber. E a dama parece-me muito envolvida nesta espécie de gangue.

-Eu não lhe devo nada, já fiz demasiado por ti. Aliás, a culpa de eu estar assim é toda tua, desanda!

-Desculpa? Eu não pedi nada disto, pelo contrário, estava bem antes de vocês chegarem. Na verdade, apenas me refiro a ti.

-Não sei quem pensas que és, seu mimado da merda. Mas tem cuidado, agora estás no meu território. Então és tu quem me deve respeito- dito isto, tenta levantar-se mas é mal sucedida e apanho-a antes de cair ao chão. Levanto a sobrancelha e sussurro-lhe ao ouvido:

-Que estavas a dizer, petit coeur?- provoco-a. Ela desperta o meu lado mais ardente e juro que não gosto de sair a perder. Pelo menos, não neste jogo.

-Que quem manda sou eu, corazón- sussurra-me ao ouvido sensualmente e depois empurra-me- Agora, põe-me na cama.

-És a única pessoa que me dá ordens e...

-Oh, obrigada, significa muito para mim- percebi que me estava a tomar por tonto- Agora podes ir, de vez.

Faço uma vénia e reviro os olhos, deixando uma bolacha como oferta.

-Não tens mais?- incrédulo, dou-lhe o pacote.

-Para si, oh Grande Deusa- os meus olhos saíram-me da cara, ao qual ela reage com um dedo do meio, virando a cara para o outro lado e continuando a dormir, pacificamente. Quem a visse até pensaria que ela é deveras tranquila, mas quanto mais lenha maior é a chama.

Decido entrar no jogo, ela que se prepare porque eu não gosto de ficar por baixo, e ao que parece ela também não. Isto é um jogo de poder e eu... vou sair a vencer, isto é, por cima.

Spy GirlOnde histórias criam vida. Descubra agora