Capítulo 3: Um poeta entre rosas

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O som metálico, que ainda continuava sendo insuportável mesmo após ter sido tocado cinco vezes na semana por um mês, despertou somente Gibril. Ele já esperava que Yakov não acordasse com o despertador porque, de alguma forma desconhecida, o pintor tinha acostumado com som.

O músico levantou da cama com o coração palpitando forte, mas não de susto como sempre, e, sim, de animação e ansiedade causada pela curiosidade. O primeiro pensamento logo que abriu os olhos foi automático: "Yakov disse que me prometeu mostrar um lugar". 

Então, ele se aproximou do amigo que dormia enrolado voltado para a parede e chamou seu nome:

- Ya... kov... Yakov...?

Chamou umas sete vezes e nenhuma resposta.

Para a surpresa de Gibril, a respiração do outro começou a ficar mais rápida e agitada, o que o deixou preocupado. Nunca tinha visto alguém assim e esperava que fosse só um pesadelo e não um infarto em pleno sono.

Deferentemente do poeta, Yakov estava deslumbrado por um lugar que só poderia ser de sua imaginação. Era impossível que existisse algo tão lindo assim na realidade e nem os mais diversos livros de belas paisagens que usava como inspiração para pintar e desenhar poderiam se comparar com o que via agora.

O céu do entardecer ou amanhecer (ele não sabia dizer) era banhado na cor de um azul-escuro arroxeado e as constelações eram perfeitamente aparentes e brilhantes e mais um sorriso, possivelmente o centésimo desde que se vira ali, surgiu em seus lábios por encontrar a constelação de escorpião. As nuvens eram um dégradé de laranja até o lilás, semelhantes à uma pintura e Yakov desejou que um dia pudesse fazer algo assim. Era, definitivamente, o mais lindo lusco-fusco que testemunhou em toda sua vida.

Estranhamente, havia duas luas cheias enormes se comparadas à Lua real, coexistindo com um sol minúsculo e, por consequência de seu tamanho diminuto, seu brilho era demasiado fraco. Apesar disso, tudo era perfeitamente visível e nítido, mesmo que uma névoa lilás com pontinhos de brilho cobrisse grande parte do horizonte.

Uma ventania gelada fez com que seu cabelo rodopiasse para todos os lados, imitando a grama e as flores do mato que o cercava. A pradaria inteira estava a dançar com uma música assoviada no ritmo excêntrico do vento. De repente, Yakov ouviu seu nome ser chamado por uma voz familiar distante.

Ao virar-se na direção da voz, Agnieszka estava rindo, correndo, rodando e pulando, mostrando com seus dedinhos as estrelas tão brilhantes. Suas bochechas rosadas pela agitação junto com o cabelo decorado com fiapos de grama a fazia parecer uma fada. A cena fez o pintor sorrir gentilmente. Ambos, por fim, podiam presenciar uma beleza mínima na vida, embora fosse tudo um sonho.

Em seguida, ele deitou na grama macia, sentindo-se como uma flor selvagem enquanto a brisa o fazia ter arrepios agradáveis pelo corpo e acariciava seu rosto friamente. A sensação o obrigou a respirar fundo e o ar fresco preencheu seu peito, completamente em êxtase e desejando que esse momento durasse uma eternidade. Nas raras vezes que sonhava, a maioria era uns lugares mágicos assim, seu perfeito paraíso. Assim, esse era o único motivo para ele ansiar por noites de sono.

Novamente, o vento chamou seu nome e ele virou a cabeça para o lado. Não conseguia ver ninguém, mas sentia uma presença calorosa, similar à sensação do sol no inverno. Era conhecida, porém não familiar, como uma lembrança recente que ainda não se tornou profunda em sua memória e precisaria de tempo para que se tornasse preciosa.

A quantidade de vezes que foi chamado aumentou gradativamente e um desespero podia ser ouvido a cada palavra. O vento revelou sua presença física e tocou gentilmente em seu ombro, como se Yakov fosse de cristal ou desapareceria caso o toque fosse mais firme.

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