nós não fizemos nada

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Resolver o problema da coifa foi mais fácil do que pensei. Não levou mais que uma hora e meia, o que me trouxe certo alívio, embora tenhamos começado a preparar as coisas um pouco tarde. O único problema mesmo é lá no escritório, que ainda está do jeito que deixei ontem, porque não tive oportunidade de limpar e organizar. Eu só termino de mandar Erick preparar o mise en place e saio da cozinha.

Lamar bota os olhos em mim e me acompanha durante minha jornada para o andar superior. Eu pergunto o porquê de estar me seguindo, mas ele não me responde e só fica sério. Assim que entramos no escritório, Morris fecha a porta e depois se vira para mim.

— Você é burro, Beauchamp? — ele parece estar meio irritado. — Eu nunca conheci alguém tão burro...

— Eita, vai me detonar agora, é? — eu reclamo.

Caminho até me aproximar da mesa praticamente vazia, depois me agacho para pegar o teclado do computador e coloco em cima da mesa de novo. Faço o mesmo com o mouse, inclusive depois eu checo se está tudo bem com ele ou não. Ontem as coisas saíram do controle de um modo bom. Na verdade, embora a luz do dia esteja clareando o ambiente, consigo me lembrar do Noah em cima de mim e do corpo dele se movimentando com o meu e... Porra, eu não posso ficar pensando nisso durante o trabalho. Não posso.

— Eu sei o que vocês fizeram aqui — Lamar faz meu coração gelar de tensão.

— Vocês...? — fico de joelhos no chão e me inclino para juntar alguns documentos.

Ele nem está me ajudando, só está parado no meio da sala, praticamente surtando. Idiota.

— Você e Noah. A não ser que você esteja pegando outra pessoa também, é claro — ele responde.

Viro meu rosto na sua direção, fazendo a egípcia.

— Nós não fizemos nada — explico.

— Oh, claro que não... — Lamar ri ironicamente. — Nem parece que vocês transaram aqui ontem...

Meu chão é arrancado de mim e eu sinto até um frio percorrer pelo meu corpo. Eu não gosto de ser descoberto numa mentira, porque fico bem ansioso e agoniado. Mas eu vou negar... Vou negar... Vou negar...

— A gente não fez isso, relaxa — eu rio de nervoso.

— Vocês fizeram, sim — ele caminha até estar ao meu lado e cruza os braços. — Estive procurando por alguma pista de algo ter sido roubado, enquanto você estava lá com ele... Então, sim, eu descobri que vocês fizeram uma festinha aqui e depois foram para a sua casa ou para a casa dele, por isso que estavam juntos agora de manhã. Eu não te julgo por isso, só julgo sua burrice de não arrumar tudo e não fingir que nada aconteceu. Quando se faz isso num lugar não muito aconselhado, Beauchamp, a gente faz de tudo para que o ambiente fique do jeito que estavam antes.

— Lamar, eu vou ter que desenhar? — reviro os olhos.

— Uhum, porque... Bem, eu achei isso daqui... — ele tira do bolso um frasco e põe sobre a mesa. Quando checo do que se trata, sei que não tem escapatória.

Porra.

— Gel lubrificante de morango 100g — ele acrescenta.

Porra. Merda. Que burrice eu esquecer isso aqui. Que burrice. Que burrice. Que burrice.

— Caiu da minha bolsa, só — eu minto na lata.

— Eu não sabia que você gostava de morango — Lamar ri da situação e depois se encosta na pontinha da mesa. — A não ser que seja de Noah, o que também pode ser possível. Morango é mais a cara dele do que a sua. Você vivia dizendo pra mim que lubrificante de morango, cereja, uva, frutas vermelhas, tutti frutti... Como é mesmo aquela fruta? Ah, framboesa... Sim... Você disse que esses e parecidos são pura frescura e a coisa mais brega do universo... Ah, e que são sabores de gloss infantil, o que é meio sinistro.

crises et chocolat  ✰  Nosh  ❖  Now UnitedOnde histórias criam vida. Descubra agora