nós estamos tendo problemas

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Finjo dormir o voo inteiro. Minha mãe às vezes consegue ser um chaveirinho irritante quando quer. Mas assim que chegamos, eu dou um suspiro aliviado no meio do caminho com James. Ele fica conversando com minha mãe, mas eu me distraio com outras coisas. Gosto de ver as árvores e de como nos afastamos de todo mundo. Gosto de lembrar de quando as coisas eram boas, mas não melhores. Porém, tenho consciência que saudades e memórias formam uma bonita ilusão de que o passado era melhor. Não era. Mas sinto falta mesmo assim.

- Duas vezes no mesmo ano, Josh? - é assim que minha tia me cumprimenta quando passo por ela pela parte principal do jardim. Ela está organizando uma festa do chá ou algo do tipo. - Estou surpresa.

- O ano já está acabando. Conte como se já estivéssemos no próximo ano. Minha visita anual já foi cumprida - quase reviro os olhos, mas me viro para trás com o intuito de olhar minha mãe. - Eu vou para o meu quarto, ok?

- Ok. Seu avô vai querer vê-lo mais tarde ou amanhã - ela me conta.

Balanço a cabeça positivamente e continuo seguindo. Eu não trouxe muita coisa, apenas uma bolsa com coisas importantes. Como sempre, eu praticamente nunca trago nada. Mas vou caminhando e fugindo de todo e qualquer parente que apareça. E se eu me encontrar com o primo ator, vou falar para ele procurar algo melhor, porque aquela atuação não foi tão boa quanto o público especulou. Sei que não é culpa dele, mas mesmo assim. Eu gosto de ser seletivo.

Interações desnecessárias é o que quero evitar. Então, eu cruzo todas as casas pelos fundos. No máximo, encontro funcionários e alguns seres irritantes que estejam na quadra praticando algum esporte. Levo mais tempo para chegar, mas chego. Vou de elevador. Não encontro ninguém no meu andar, porque só tem eu. E, num passo de mágica, já estou jogado na minha cama e pensando seriamente em não sair daqui nas próximas horas.

Só tiro meu tênis, largo minha bolsa em qualquer canto, ponho o celular para carregar e vou de berço. Não vejo nada, não quero nada, só preciso tirar todo o cansaço do corpo.

É estranho quando deitamos para dormir e num segundo estamos conscientes de tudo, mas no outro já estamos acordando com o corpo meio dolorido e os pensamentos turvos. Só tenho a impressão de sentir os braços de Noah ao redor de mim, sua respiração contra o meu pescoço e eu estar na minha casa aninhado ao seu corpo. Mas, ao acordar, não há nada disso. Eu estou só no quarto. Ninguém mais. Foi só um sonho.

Com sono e lento, eu deslizo o corpo para conseguir tirar o celular do carregador. Não tenho muito o que fazer senão lamentar. Malmente desbloqueio, quando duas batidas na porta me obrigam a sair da cama. Não penso muito antes de abrir. E no instante em que checo a pessoa, sou atacado por um abraço e acabo sorrindo no meio disso.

- Você está com a cara péssima! - minha irmã dá batidinhas nas minhas costas. - Nunca te vi tão feio!

- Você errou - resmungo com o queixo em seu ombro. - Eu nunca fico feio.

- Meu sonho ter sua autoestima.

- Impossível. Você não é tão bonita quanto eu. Não tem porque ter a mesma autoestima.

Ela se afasta de mim com um sorriso no rosto. Acabo lhe dando espaço para entrar no quarto e fecho a porta.

- Quer beber? - questiono, após um tempo observando-a decidir onde irá sentar. No fim, ela se senta no sofá e cruza as pernas.

- Eu vim aqui só para isso.

- Em falar nisso... - encaminho-me ao bar perto da televisão. Passo os olhos nas garrafas para saber o que é que eu quero beber dessa vez. - Por que está aqui mesmo? Você não tinha uma pós-graduação para estar se debruçando?

crises et chocolat  ✰  Nosh  ❖  Now UnitedOnde histórias criam vida. Descubra agora