RENASCENDO

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Matheus Molina


Ser médico não significa ser um super-herói, que supera absolutamente todas as adversidades. Na verdade, é algo simples, singelo, que tem muita haver com gostar de gente, das relações humanas, de olhar o outro com respeito e tratá-lo com amor e dignidade.

Entretanto, ter nas mãos a possibilidade de salvar vidas, é algo inumano. Vai além de qualquer sensação já existente. Tamanho privilégio e poder, pode te viciar, e acabar te tornando dependente dele. Ajudar as pessoas se torna tão essencial quanto o ar.

Não saberia dizer, nem se tentasse, quantas horas, minutos e segundos, passei dentro de um hospital. Tampouco poderia colocar em números os pacientes que atendi.
Estar no ambiente hospitalar, sem dúvida era uma grande paixão.

Há quem diga, que todos os médicos são ateus, que confiam mais na ciência do que em um ser invisível poderoso, que nunca teve início, e que jamais terá um final. Contudo, nunca deixei de acreditar em Deus, nem de incentivar outros a crer nele. Sei bem que, se tenho a capacidade de fazer algo por outros, é porque ele me habilitou.
Toda vez que presencio a evolução no quadro clínico de alguém, mais fé eu tenho nessa parceria. Os médicos, na verdade, são um canal que Deus usa, para tentar salvar as pessoas.
Fernanda vinha se recuperando. E eu conseguia ver em cada avanço, sua mão e glória.

Houve um momento, enquanto ainda tentavam estabilizá-la, que seu coração parou.
Mas ela voltou. Foram horas, e mais horas na tentativa, para no final, o resultado ser um milagre. Tanto Fernanda, quanto o bebê, seguiam vivos. Ela precisou ficar entubada por 15 dias. Hoje, completando um mês do seu acidente, ainda estava em coma. Porém, o risco de morte é nulo, todos seus órgãos funcionam perfeitamente bem. E a parte cerebral também estava boa, e a gestação, embora com dificuldades, seguia seu curso natural.

Se não fosse Deus nos guiando, como isso seria possível? Simplesmente não seria.

Durando esse mês que passou, muitas certezas nasceram no meu coração. Assim como reflexões profundas, e pensamentos significativos. Me questionei, me avaliei, e encontrei o caminho do qual havia saído.

Tomei muitas decisões, enquanto me revessava.
Durante o dia, ficava na minha nova casa, ajeitando e arrumando tudo por lá. Já minhas noites eram reservadas exclusivamente para ficar ao lado da Fernanda. O que foi difícil de explicar para Eduardo Sanchez, que conforme o tempo ia passando, começou a desconfiar.

Só de relembrar o dia em que ele descobriu que eu era o pai do seu neto, bem como, o cara com quem sua filha estava envolvida, meu rosto dói.
Levei no minuto, uns 6 socos.
****

- Seduziu a MINHA FILHA, e ainda por cima a engravidou? - Gritava, sem parar de me bater - Você tem idade para ser pai dela, ESTÁ ME OUVINDO? - Eu já havia desistido de tentar falar, e aceitava os socos, sem lutar. - Não conseguiu ter a MINHA MULHER, aí foi correr atrás da MINHA FILHA? -Disparava sem intervalos.

Jhon até tentou segurar o pai, assim como Lia, o marido. Mas, ele estava em sua razão.
A situação como um todo era péssima. E como se não pudesse piorar, havia como fator agravante, o fato dele saber que eu tinha beijado sua esposa, no dia do acidente da sua filha. Que no caso, era a pessoa com quem eu estava. Enfim, se eu fosse ele, também me socaria.

Todavia, uma hora, graças a Deus, ele se cansou.
Fui socorrido, pelo meu irmão, e pelo meu amigo, Vinicius.

Quando a poeira baixou, convidei tanto Lia, quanto Eduardo para uma conversa.

- Eu sei que a situação não é boa. - Os encarei com firmeza. - Mas, eu me apaixonei pela filha de vocês. - Fiz uma pausa, dando ênfase na afirmação. - Sei que ela só tem 18 anos, e que eu tenho muitos anos a mais. Também estou ciente do meu histórico com a família Sanchez. - Respirei fundo, antes de continuar - Se eu pudesse escolher, juro que não.... minha voz morreu com o pensamento.
- Não o que, Matheus? - Questionou Eduardo.
Apenas balancei a cabeça, afastando a ideia.
- Eu ia dizer que, se eu pudesse escolher, não me envolveria com ela. Só que seria mentira. Eu a escolheria, sempre.

Um meio sorriso se abriu nos lábios de Lia, que segurou minha mão por cima da mesa, levando seu marido á me olhar atravessado.
- Ela é incrível, assim como você. Estou feliz por terem se encontrado.
- Não poderia existir casal mais improvável, isso sim. - Esbravejou, Eduardo.
- Assim como eu e você, meu bem? - Lia questionou, sob o ombro.
- É diferente ...
- Não é nada diferente . - O interrompeu. - Não somos ninguém pra julgar a relação dos outros, nem mesmo se esse outro, é a nossa filha. - Se impôs. - Por isso, eu fico feliz sim, que ela tenha se apaixonado por um homem como o Matheus. Assim, como fico feliz de você, Matheus, ter encontrado um amor tão puro como o da minha princesa.
Eduardo revirou os olhos, e xingou baixinho.
Ajeitei a postura, e usei meu tom mais convincente.
- Eu prometo, que vou me dedicar a ela. Fernanda vai sair daqui, como era antes. E o bebê ficará bem, eu cuidarei dos dois. Ambos vão ser felizes.

- Eu ainda não gosto de você. - Disparou, Eduardo. - Mas, se é pela felicidade da minha filha... Que seja. - Lia o cutucou. - O que foi ? o máximo que vão ter de mim, é isso.

Nos encaramos.
E apenas com o olhar, selamos um acordo em silêncio.
****


(...)

Passei a viver na expectativa de ver Fernanda acordar. Se não fosse pelo apoio emocional que minha mãe estava me dando, acho que já teria enlouquecido. Jhon também me dava um suporte e tanto, mesmo eu sabendo que ele também estava sofrendo.
****

- Fernanda é Forte, vai sair dessa, e acredite, tela ainda vai te dar bastante trabalho. - Dizia Jhon, entre sorrisos esperançosos. - E eu aposto 100 reais, que o bebê é menino.
O encarei, e sorri.
- Aposto 300, que é menina.

Conversas desse tipo era o que mantinha minha perseverança acessa.
Pensar em um futuro, me movia a agir de modo positivo.

(...)

Olhar o céu, pela janela do quarto da Fernanda se tornou uma mania.
Eu fazia isso toda noite. E não foi diferente dessa vez.

Passava da 00:00 quando fui até a janela e abri as cortinas. O Céu estava estrelado, como nunca antes. Minha mente instantaneamente, buscou por uma lembrança.
****

" - Porque uma estrela? - Perguntava, a Fernanda.
Ela orgulhosa, e feliz, me explicou:
- Porque elas estão sempre lá em cima, brilhando. E mesmo depois que morrem, contribuem para que outras nasçam no lugar."
****

Engoli em seco ao pensar no quanto essa frase significa para mim, agora.
Ela realmente era como uma estrela.

Segurei as lágrimas que queriam caiam, e me virei para olhá-la.
Quando me aproximei, vi seus cílios se mexerem, e sua mão direita querer levantar.
Poderiam ser só reflexos, dizia a mim mesmo, para tentar acalmar o coração. Mas, quando Belmonte chegou e começou a examina-la, entendi que algo estava acontecendo.

Em questão de minutos, Fernanda Sanches abriu os olhos, renascendo, junto com um novo Matheus.

O irmão do meu tioOnde histórias criam vida. Descubra agora