COMO NOS FILMES

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Fernanda Sanchez



Saímos do cinema e ficamos zanzando pelo shopping, falando sobre o filme. Como de costume, não segurei as lágrimas, enquanto Matheus, reclamava o tempo todo por ter sido só mais um clichê, com um final óbvio.


-  O filme foi lindo!  Você que é insensível. - cutuco-o, fazendo com que revire os olhos. 
- Claro! O problema sempre sou eu.
Dou risada, e entrelaço meu braço no dele, que me encara.
- Que tal comermos alguma coisa?
Ele pareceu analisar os prós, e os contras.
- Depois, vamos embora, certo?
- Nossa! Sua sutileza me comove - pouso a mão sobre o coração
- Cala boca Sanchez, e vamos comer de uma vez.
Saio andando atrás dele, que finge me ignorar.

Irritá-lo se tornou algo muito prazeroso.

Quando por fim, chegamos ao restaurante, decidimos comer comida japonesa.
O lugar era muito bonito, e super bem decorado. Parecia mesmo que estávamos em algum lugar do Japão.

- Me falaram de você. - cortei o silêncio, de repente.
- Tipo o que ? - Levantou a sobrancelha, me direcionando toda sua atenção.
Cruzei as mãos, e apoiei o queixo em cima.
- Bem ... - fiz uma pausa - Ouvi dizer que você era uma pessoa animada, divertida, engraçada, carinhosa. - o encaro, com firmeza  - Fico pensando .. onde foi parar essa pessoa?
- Tá dizendo que eu não sou animado, nem divertido, muito menos, engraçado e carinhoso?
Fiquei apenas encarando-o.
Ele riu.
- Que inferno! E eu achando que estava abalando.
Me endireitei na cadeira, e cruzei os braços.
- Porque mudou tanto ?
Com a pergunta direta, Matheus ficou sério, inclinou um pouco o corpo, e pareceu buscar a resposta em suas lembranças.
- Muita coisa aconteceu.
- Minha mãe, seu pai, seu ... - parei imediatamente
- Meu irmão - completou.
- Desculpa.
Seus olhos foram de um canto, ao outro do restaurando, antes de fixar-se em mim novamente.
- Está tudo bem. Ninguém sabe como falar do Lucas comigo. - disse, com a voz embargada. - A verdade é que eu sinto saudades da pessoa que eu era antes, e das coisas que eu tinha.
Me aproximei, capturando sua mão por cima da mesa.
- Ás vezes, por mais que machuque, a dor precisa ser sentida. - entrelaço nossos dedos.
Seus olhos encontram os meus.
Uma lágrima escorre por seu rosto.
- Num dia, eu tinha uma família supostamente feliz. Um pai que achava ser um herói, um irmão mais novo que adorava, e uma mãe perfeita. - mais lágrimas escorrem - Já no outro, meu pai era um assassino, sem caráter ou escrúpulos. Minha mãe, mentirosa. E meu irmão ... - respirou fundo - meu irmão já não estava mais.
Com a mão livre, limpo algumas de suas lágrimas.
- Lidar com tantas coisas, deve ter sido complicado.
Matheus, sutilmente prende minha mão com a sua, paralisando-a em seu rosto. Em seguida, me lança um olhar tempestuoso.
- Nunca soube lidar com nada. Por isso sou assim.
Sorrio com carinho, e acaricio seus dedos com os meus.
-Você não precisa ser exatamente como era antes. Até porque, tudo que acontece na nossa vida, deve fazer parte de quem somos. Mas, usar a dor como escudo, o tempo todo, não nos protege. Ás vezes, na verdade, nos tira a visão. Não nos deixa ver, e ir além.

Ficamos em silêncio simplesmente nos encarando.
Então, nos afastamos lentamente.

Matheus pediu, e pagou a conta, mesmo eu insistindo para dividirmos.
Antes de nos levantar, ele me bloqueia, e segura meu braço.

- Obrigado.
- Pelo que ? - franzo a testa.
- Poder falar, me aliviou, pelo menos um pouco. E ouvir o que você disse, me tocou. - confessou, sem tirar os olhos dos meus. - Pra quem tem só 18 anos, você fala com muita propriedade sobre a vida.

- Ao contrário do que muitos pensam, eu não vivo em um bolha.

O silêncio mais uma vez, se faz presente entre nós.
Pigarro, para preencher o vazio.
- Bem .. eu vou ao banheiro.
- Claro! Tudo bem. Te espero naquela loja - avisou, enquanto apontava para ela. - Nos vemos lá?
- Sim senhor. - bato reverencia, e saio , ouvindo um xingamento baixo.



O irmão do meu tioOnde histórias criam vida. Descubra agora