Capítulo 23 - A minha verdadeira Razão

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Fechei os meus olhos e vi a imagem do meu avô a minha frente sussurrando no meu ouvido. "Qual é a sua verdadeira razão Maly? A razão que te fará querer a liberdade mais do que tudo? A liberdade da mente e do corpo?"

Os meus pulsos doeram e lembrei-me de que já não tinha a liberdade do corpo. Sufoquei uma gargalhada constatando que esse fora retirado de mim descaradamente! As amarras apertaram a minha carne e senti a minha pele rasgar, mas a dor não era pior do que os meus joelhos ardendo em contato com o piso duro da sala do trono.

Lógico que aquilo não era privar-me da minha liberdade de todo, apenas estavam com medo de uma criança que mal completara quatro anos. Aquele facto fazia-me querer gargalhar ainda mais e chorar ao mesmo tempo.

Tentei não admirar a grandiosidade da sala. Os pilares eram ornamentados por ouro e os abobados cobertos por pinturas que retratavam a história de Luanovia, pelo menos aquele que eles queriam que soubéssemos.

Senti uma leve tontura e foquei-me no trono dourado. Três degraus faziam com que ele estivesse mais alto do que nós, lembrando-nos do nosso verdadeiro lugar. Até as janelas eram exageradamente grandes, fazendo com que a luz refletisse nos lustres e iluminasse a sala ao extremo.

A minha sobrinha revirava-se numa gaiola perto do trono, assustada. As suas bochechas estavam sujas e encharcadas de suor. Soluçava baixinho e olhava para a mãe e depois para o pai suplicando por ajuda.

Resmunguei sentindo o meu interior queimar. A minha sobrinha era uma autêntica pólvora viva e só faltava o fósforo para que tudo aquilo explodisse! As bombas não deveriam ser provocadas e o rei como um diplomata deveria saber disso.

O casal ao meu lado grunhiu de frustração e encararam as suas mãos igualmente presas.

— Ainda faltam dois. — A voz do rei preencheu os espaços vazios da sala, fazendo o meu corpo estremecer. Algo não estava mesmo certo e fui idiota em perceber isso tardiamente.

— Eles estão nos dormitórios majestade. — Só naquele momento apercebi-me da presença do duque ao lado do rei, como uma projeção da sua própria sombra. Ele olhava para todos os lados, mas evitava olhar-me diretamente. — São apenas crianças. Iriam atrapalhar mais do que ajudar.

O rei assentiu e presumi que falassem da Alina e do Lucas. Agradeci internamente por não estarem presentes. A cena era grotesca de mais.

O Vítor esfregou de leve os seus calcanhares nos meus, mostrando-me que ele estava comigo. Tentei oferecê-lo um sorriso, mas os meus músculos travaram e fui incapaz do gesto naquele momento.

Hermes levantou da cadeira e colocou-se a nossa frente examinando-nos como se fossemos algum tipo de mercadoria de baixo valor exposta na praça pública.

— Traidores! — Ele apertou os punhos e rangeu os dentes sendo tomado por um ataque de cólera descontrolado. — Dei-vos tudo. Casa, comida, roupa lavada e como agradecem-me? Destruindo a minha casa! Quem faz isso são os ingratos e os ingratos merecem uma lição. — Ele apertou os olhos respirando fundo. Ao abri-las, uma expressão meiga tomava-lhe as feições. — Não queria fazer isso, mas eu sou um rei e os reis devem fazer o que é melhor para o seu povo. O que as pessoas de Luanovia pensariam de um líder que não estabelece limites?

Horácio tremeu ao lado da mulher e Cecília acariciou as suas mãos, impedindo-o de explodir. Os seus olhos tomavam uma tonalidade avermelhada a cada palavra que saía da boca do rei e sufocou um grunhido olhando para a filha.

— Diga-me Nick, qual é o castigo para os traidores? — O duque olhou confuso para o rei e depois abaixou o olhar.

— A morte majestade. — Respondeu em um fio de voz.

O Despertar Das Rosas Negras - Melhores histórias 2022 LPOnde histórias criam vida. Descubra agora