Capítulo 24 - O cheiro da maresia, o cheiro do amor

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Mãos quentes taparam os meus olhos e voltei para trás assustada. O Vítor estava deitado ao meu lado e abraçou-me cheirando o meu pescoço. Abracei-o de volta, olhando para a pequena janela do dormitório. A escuridão ainda reinava lá fora, o que significava que estava de madrugada.

— O que estás a fazer aqui? — Perguntei-o e ele pegou as minhas mãos apertando-as nas suas. O seu sorriso iluminou os meus olhos, fazendo-me sentir vontade de percorrer a sua pele de chocolate com os dedos e absorver o seu calor só para mim.

Um movimento na cama ao lado chamou a minha atenção e lembrei-me de que não estávamos sozinhos. A Juliana levantou a cabeça e depois voltou a deitar-se com uma cara de poucos amigos. Ela nunca gostou do facto de eu e o Vítor estarmos juntos, muito menos no mesmo quarto, na mesma cama. Não entendia se aquilo era ciúmes de prima ou algo a mais.

— Queria mostrar-te uma coisa. — O Vítor levantou-se, pegando duas capas no criado mudo, estendendo uma para mim.

Peguei-a confusa e olhei para o chão. A Alina, a Clarinha e a Cecília não estavam presentes como de costume. Muitas coisas tinham mudado tão rapidamente que mal tivemos tempo de lamentar a morte da Marta como deve ser. Sentia que a tínhamos desrespeitado, não dando-a o respeito que ela verdadeiramente merecia.

Suspirei, atando a capa ao pescoço e levantei-me da cama ainda sonolenta. O Vítor pegou uma bolsa de couro no chão e cruzou-o sobre o corpo empolgado, amassando o material imaleável. Olhei para ele por alguns segundos, apreciando a sua figura esguia e imaginando quanto tempo ele tinha ficado comigo no quarto.

— Aonde vamos? — Esfreguei os meus olhos e agarrei-me aos braços do meu noivo. Ele sorriu mais uma vez, colocando os dedos nos lábios pedindo-me silêncio.

— Surpresa. — Dei de ombros e saímos da ala dos dormitórios, tentando fazer o mínimo de barulho possível, entrando no grande corredor da ala leste.

Olhei além do pequeno jardim de orquídeas e o meu coração apertou. Imaginei como a Clarinha estava-se saindo na ala oeste. Agradeci internamente pelo rei ter aceitado a presença da Alina e da Cecília também, pelo menos nessa primeira noite. Bem lá no fundo acreditava que ele ainda tinha medo dos poderes da minha sobrinha e temia que ela tivesse outro descontrolo.

— Venha. — O Vítor agarrou-me melhor e paramos em frente a grande porta da cozinha.

Ele retirou uma chave grossa das suas vestes e abriu a porta fazendo o mínimo de barulho possível. Sufoquei uma gargalhada imaginando o que iríamos fazer em uma cozinha de um palácio em plena madrugada.

Ele puxou-me para dentro e voltou a fechar a porta. Era estranho não ver a cozinha abarrotada de pessoas, tachos por todos os lados e o aroma de comida recém feita.

— Vítor. — Sussurrei baixinho. Ele olhou para mim e depois agachou-se debaixo de uma grande mesa de pedra, reservado exclusivamente para cortar legumes. — O que estás a fazer? — Ele ignorou-me, esticando as mãos com um semblante sério.

Senti algo arrastando-se em algum lugar e pulei de susto, agarrando ao meu peito. O Vítor riu com gosto e aproximou-se do grande forno, que ficava no meio da cozinha. Como a senhora Agnes tinha o hábito de dizer, era o coração do cômodo, o que dava a vida, o calor e os cheiros ao lugar.

Ele entrou pelo espaço aberto, desaparecendo pela escuridão. Aproximei-me devagar e tateei a entrada. Uma camada de cinzas despencou-se do alto, sujando as minhas vestes e fazendo-me tossir.

— Entra Maly. Não tenhas medo. — Arrastei-me pela entrada, entrando em um túnel escuro e húmido. O Vítor tateou a parede ao nosso lado e a passagem fechou-se em um "Ban" suave.

O Despertar Das Rosas Negras - Melhores histórias 2022 LPOnde histórias criam vida. Descubra agora