Capítulo 29 - Fera felina

440 61 1
                                    

Entrei no quarto e deslizei pela porta, sentindo-me cansada. Precisávamos sair do palácio o mais rápido possível. Esfreguei os meus punhos e levantei o olhar, encontrando os da Juliana.

Ela estava sentada na sua cama, segurando firmemente com uma mão a caixa de Ava e a outra a rosa negra, como se quisesse esmaga-las.  Os seus glóbulos oculares estavam vermelhos, como se tivesse chorado por demasiado tempo.

— Juliana, o que pensas que estás a fazer? — Levantei-me devagar sentindo o meu corpo fraquejar mais uma vez naquele dia infernal.

— Aparentemente mexendo nas tuas coisas. — Ela olhou para mim, como se quisesse fazer cada pedaço meu desintegrar-se e transformar-se em pó. — As rosas negras não existem Maly. Isto é algum tipo de bruxaria? — Ela contemplou a rosa e depois jogou-a para o lado como se essa tivesse alguma substância tóxica. Corri e segurei-a nas minhas mãos trémulas.

— Não tinhas esse direito. — Gritei aproximando-me da sua cara. Ela levantou-se da cama furiosa e colocou a caixa do lado, balançando os seus cachos de um lado para o outro.

— Tu é que não tinha esse direito! — Olhei-a confusa e depois para a rosa sem ter a certeza do que verdadeiramente estávamos falando. — Ele foi-se embora e a culpa é tua!

Sentei-me na cama agarrando a caixa. Depositei a rosa nela, amuada. 

— Eu não queria que ele fosse. O rei exigiu. — Retirei a grinalda esquecida da minha cabeça e contemplei-o sentindo o meu interior arranhar. — Eu seria a última pessoa a deixá-lo ir por livre e espontânea vontade.

Juliana percorreu o quarto num tique nervoso.

— A culpa é tua sim! Se ele nunca te tivesse conhecido ele não estaria condenado a morte agora. Eu amo-o e nunca tive a oportunidade de declarar-lhe o meu amor. — Ela pegou-me pelo braço e fez-me cair no chão fazendo a grinalda escapar das minhas mãos.

Desvencilhei-me das suas mãos em um safanão, olhando-a assustada. As palavras morreram na minha garganta e eu não sabia o que dizer.

— Juliana. — Levantei-me do chão, tentando aproximar-me dela, mas essa afastou-se evitando olhar nos meus olhos. — Eu sinto muito. Sinto mesmo.

O seu olhar queimou a minha pele enraivecida. Cerrou os punhos e colocou-se à minha frente com a respiração elevada.

— Eu sei que não sentes coisa nenhuma! Sempre sendo o centro das atenções, a menininha inteligente, o exemplo a ser seguido e não a puta da Juliana. És podre como eu Maly, só que o teu disfarce é melhor. — Ela pegou a caixa em cima da cama e colocou-a debaixo dos braços. — Eu vou mostrar a todo o mundo o que verdadeiramente és. Uma ladra sem escrúpulos. Mostrarei ao rei esta caixa que tanto escondes e esta rosa amaldiçoada. Vais ter o que mereces.

Corri e cerquei a porta com as mãos, desesperada.

— Juliana, pensa bem. — Ela olhou-me em reprovação, tentando tirar-me do caminho. Respirei fundo e conjurei todas as minhas forças. Ela não iria passar por mim, não a iria permitir. — Foi a Clarinha quem criou a rosa e o rei já sabe que ela tem poderes. Não vai adiantar-te de nada!

Ela olhou para mim confusa e depois para a caixa nas suas mãos, fazendo-me engolir em seco. Ela não podia!

— A caixa não é tua e eu sei. É muito fina para uma plebeia como tu. Eu até não posso saber ler Maly, mas eu não sou burra. — Ela levantou a caixa a nível dos meus olhos triunfante. — Ela tem o símbolo da coroa.

Contemplei o pequeno barco gravado em negro em uma das extremidades e pensei em como não tinha-o visto antes. Fiz menção de arrancar a caixa das suas mãos, mas ela escondeu-a atrás das costas dando uma risadinha sarcástica.

O Despertar Das Rosas Negras - Melhores histórias 2022 LPOnde histórias criam vida. Descubra agora