Capítulo 5- Músculo

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       Como já foi dito Tiago não era especialista em relacionamentos. Possivelmente as mulheres que passaram em sua vida tinham mais interesse em seus conhecimentos de informática e línguas (no caso não a dele) do que propriamente no homem de beleza sutil. Era praticamente virgem por assim dizer, isso já contando aquele evento no porta malas da Parati 1984 do pai em Boracéia cuja mancha no estofado não deve ter saído até hoje (só se fala disso no desmanche de carros).

       Quando Marília apareceu desesperada atrás da terapeuta ele ouviu os sinos tocarem, estrelas caindo do céu ou como se diz em croata (outro idioma que dominava) “Ti si ljubav mog života”, algo como “sei que é a mulher da minha vida”. Tiago era um pouco exagerado por certo. Sua idade mental em se tratando de sexo oposto não passava dos quinze anos “com corpinho de treze”.

         Tentou acalmá-la juntamente com a secretária, explicando que Dora tivera que fazer uma viagem de urgência mas que logo voltaria. Sua nova diva, inconsolável, sentou-se no chão com a expressão tensa, incrédula de sua atual condição de miserável.

        Tiago resolver que a hora de agir era aquela, não poderia deixar o trem passar dessa vez, não dessa vez e convidou Marília para um café. Ela, curiosamente, num misto de compaixão e auto compaixão aceitou prontamente. Amparada por ele, já começou a mudar sua aparência quando o viu, desastrado, deixar cair café em sua camiseta que por sinal chamou sua atenção e a fez pensar que seu pai talvez nem o cumprimentasse , fruto da rivalidade histórica entre os bascos e os chamados “espanhóis de verdade”.

     Com meia hora de prosa já estava rindo de suas histórias desconexas, assim como um personagem de Woody Allen e suas neuroses tragicômicas.

         Tiago há tempos não se sentia tão bem. Solto, relaxado, seria capaz de ficar ali horas contando suas aventuras como professor de alemão em plena Blumenal, de como tentou em vão tornar “Faroeste Caboclo” patrimônio artístico e cultural da humanidade, enviando dezenas de e-mails, correspondências e videos 'a UNESCO. Nem ele sabia o porque desta fixação, talvez se identificasse com a estupidez e pelo non sense da história, assim como a sua própria vida, de um sem sentido completo. Ou pelo menos, até aquele instante.

        Marília, já refeita do choque imediato, decidiu partir, procurar a família da Lolita, enfim, tornar digna a morte de uma grande amiga; trocaram telefones e contatos em redes sociais e, mais uma vez surpreendeu-se com uma frase daquele desconhecido .

        Tiago queria impressioná-la ao se despedir mas sua inexperiência amorosa o fez lembrar daquilo que tanto gostava, a música. E sem pestanejar soltou a pérola: “meu coração é um músculo involuntário e ele pulsa por você”.

      Nossa protagonista não sabia se ria, chorava ou o beijava.

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