Capítulo 6- Origem e Destino

32 1 0
                                    

               Gechina Perugorria. Quando o funcionário da alfândega espanhola escaneou o passaporte da comunidade europeia de Eleadora, este nome se destacou com os alertas de “checar procedência e destino”, protocolo do governo madrilenho desde a adoção de uma política mais rigorosa sobre os viajantes bascos, principalmente os procedentes de países periféricos. Dora já esperava por isso. Desistiu do convite de representar a televisão local no Brasil justamente por temer uma investigação de seu passado. E ficou curiosa ao saber por intermédio do Tiago que seu nome constava no site da Euskal Telebista até hoje, já passados dez anos da oferta recusada, fato que o fez conhecê-la. Sabia que a revista da polícia federal local não resultaria em nada uma vez que 'a época tudo fora devidamente destruído. Só se recusou a mudar definitivamente de nome; preferiu o risco de um passaporte falso no Brasil a renegar suas origens definitivamente. Mas não contava com o rigor excessivo da autoridade de plantão, um cidadão ressentido, filiado ao Partido Popular, monarquista e membro da Opus Dei que não sabia se odiava mais os bascos ou os catalães.

          Porém Eleadora conseguiu entrar no país sem maiores dificuldades. E partiu para San Sebastian, sua cidade natal. Sem familiares vivos, pretendia somente rever seu primeiro lar, sua escola, sua praia favorita enfim, saudosismo comum 'a qualquer migrante ausente há décadas.

                A situação econômica da Espanha não estava favorável, ela sabia muito bem disso, mas se surpreendeu com a mobilização popular por emprego; como era esperado em situações de crise, o desejo de independência ganhou força entre a população, principalmente os jovens, grandes vítimas do desemprego. No auge dos seus 72 anos, sentiu um sopro de vida, de jovialidade, de esperança e energia que a fez relembrar seus tempos de militância.

            Com sua facilidade em se comunicar, decidiu de súbito visitar a sede do Batasuna, braço político do ETA (mas também ilegal desde 2003) e procurar por sua ala juvenil, saber dos anseios, desejos, sonhos e projetos deles para o país. Num misto de interesse profissional e pessoal percebeu que unir sua experiência como fundadora da organização com sua capacidade intelectual poderia trazer uma luz aos seus concidadãos.

                 Para sua surpresa, lá chegando, havia uma parede repleta de fotos dos considerados “pais da revolução” e dentre elas a sua. Linda, jovem e jovial, mas com um detalhe que, mais que a foto, a deixou perplexa: uma frase sua, que nunca mais ouvira ou pensara, de um época em que sonhava com um mundo melhor:

                “Bihar inoiz ez da, eta horregatik da bizitza hain eder eta scary”

                 (“O amanhã nunca chega e é por isso que a vida é tão bela e assustadora”).

                Gechina Perugorria não sabia mas ali começaria sua grande e definitiva jornada.

MendekuaOnde histórias criam vida. Descubra agora