002.

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Tecna aprendeu a viver em sociedade, graças à Silva. Quando criança, passou metade de sua infância trancada em um quarto, com livros à sua volta e sob a tutela de várias babás diferentes.

Nunca teve uma convivência ou uma idéia real do que se tratava o significado de "família". Quando passou a morar com Saul e Sky, foram os dois que lhe mostraram que ser uma família, era muito mais do que apenas dividirem o mesmo sangue ou sobrenome.

Era estar lá um pelo outro, independente das dificuldades. Era cuidar, brigar por coisas bobas e voltar a se falar em segundos. Era deixar o último pedaço de bolo ou dividir a cama em uma noite assustadoramente chuvosa.

Era amar, acima de qualquer coisa.

Por isso, quando Farah Dowling chamou a garota para sua sala naquela manhã de volta às aulas, Tecna estranhou ouvir o que a diretora tinha a anunciar.

- Electronomo Regnum irá vir para Alfea - contou a mais velha, a voz cuidadosa. Por mais que soubesse o quão direta estava sendo, não tinha maneira melhor de contar à adolescente uma notícia como aquela. - Ele... passará um tempo aqui conosco.

Electronomo Regnum.

Desde a fatídica noite em que Tecna sairá de casa nos braços de Silva, a garota só havia visto o pai mais duas vezes. E, todas elas, não foram nem de longe receptivas.

- O quê!? - perguntou Tecna, confusa. - Estão brincado comigo? - seu olhar parou sobre a figura de Saul Silva, que observava tudo em silêncio, parado perto da porta, com os braços cruzados para trás.

- Infelizmente não, querida - respondeu Farah. - Sei que pode ser difícil para você, mas...

- E Zenith? - interrompeu. - Ele irá deixar o reino sozinho? Ele é o rei! Não foi isso que ele passou a vida toda me dizendo, para justificar o pai de merda que é?

- Tecna - repreendeu Silva, lançando um único olhar severo para a mais nova, que se calou.

O clima não demorou ao pesar dentro da sala. A relação entre Tecna e o pai era péssima e ela não escondia isso de ninguém. O homem morava e governava o reino de Zenith, sendo um rei severo e atencioso, ao mesmo tempo que era um pai distante e sem consideração.

Tudo que importava para Electronomo, era o sobrenome Regnum. O qual Tecna - para sua infelicidade - também havia herdado. E, desde pequena, sofria as consequências por isso.

- Olha, Tecna - a diretora voltou a dizer, sentando-se diante sua mesa. - Todos nós aqui temos muito carinho por você. Entendemos o quão isso pode ser complicado para que se acostume, mas, te peço que tente.

- O que ele irá fazer aqui, senhora Dowling? - perguntou mais uma vez a garota, tentando se manter tranquila. - Quer dizer, quais são suas intenções em aparecer justo agora?

A mulher suspirou.

- Eu não sei - confessou. - Tudo que sei é que a rainha Luna permitiu, sem nenhum detalhe a mais - continuou. - Ele irá chegar amanhã a noite, vai viver por aqui e trabalhar junto ao Silva, com os especialistas.

Tecna riu nasalado, desacreditada.

Ser uma Regnum sempre pesou em suas costas. Até porque, um dia, ela seria a herdeira não só do sobrenome da família, mas de toda Zenith. E, toda a pressão que sofria com isso, a fazia sentir tanta raiva que mal podia pensar no assunto.

Mas, longe do pai ou do reino, era mais fácil ignorar o inevitável e fingir que nada a abalava. Agora, com Electronomo tão perto, seria quase impossível não pensar em sua realidade.

- Ok - disse a acastanhada, simplesmente. - Posso me retirar agora?

Farah assentiu devagar. Tecna se virou, a postura erguida ao sair pela porta da sala de Dowling. Andou até estar no meio do corredor, parando ao ouvir que chamavam por seu nome.

A jovem se virou mais uma vez, encarando Saul Silva, que a analisava preocupado.

- Eu não sabia que ele viria - soltou o homem. - Eu teria contado a você, Tecna.

- Eu sei, Saul - respondeu ela, sincera. - Não se preocupe, uma hora ou outra eu teria que lidar com isso, não é? Afinal, é a minha vida - tentou sorrir. - Tenho o fardo de ser a princesa de um reino ao qual nem me lembro como é, com um progenitor que só lembra que teve uma filha, quando o convém... tenho que viver conforme as coisas são.

O especialista respirou fundo. Tecna e Sky eram tudo para ele, que mesmo não demonstrando sempre ou admitindo, daria sua própria vida por suas crianças. E, quando doía em um deles, doía nele também.

- Não precisa ficar próxima à ele - retrucou Silva, tentando achar uma solução. - Quer dizer, se não for te fazer bem. Só viva sua vida, como sempre fez aqui! Você está em casa, Tecna. Ele não pode tirar isso de você, quem você é e o que conquistou aqui em Alfea.

- Ele nem sabe quem eu sou de verdade, Saul - Tecna murmurou. - Isso não importa para ele. E o que eu poderia ter conquistado? Não tem nada que possa me prender aqui se ele estiver com intenções de me levar de volta à Zenith. Ou você acha normal essa situação? Ele nunca deixaria o reino assim, do nada.

- Eu sei quem você é - começou o mais velho. - E todos que te amam a sua volta, foi por mérito seu. Você conquistou um lugar só seu, Tecna. E ninguém vai te tirar daqui, a não ser que você queira ir. Você está comigo, não vou deixar que façam com você algo que não queira - suspirou. - Ele pode ser o rei de Zenith, mas não tem o que nós temos - seu olhar então parou atrás da figura de Tecna, onde Sky e Riven esperavam distantes, os braços cruzados e cochichando um com o outro.

A fada sorriu para o homem, que piscou em sua direção antes de sair andando. E - como sempre - Silva tinha razão. Electronomo Regnum tinha poder, mas estava sozinho. Tecna também tinha poder e, melhor ainda, tinha pessoas que se importavam com ela ao seu lado.

Em uma disputa, o que valeria mais?

- O que querem? - perguntou a garota, se aproximando dos especialistas.

- Você - respondeu Riven. A acastanhada olhou para o amigo, arqueando as sobrancelhas. Sky fez uma careta para o outro garoto, que só então percebeu que sua resposta soara estranha. - Quer dizer, nós viemos te encontrar para irmos até a lanchonete! Estão dando sanduíches, e...

- Relaxa, Riv - a garota riu do nervosismo dele, deixando um tapa fraco em seu ombro. - Vamos nessa, estou com fome e ainda preciso encontrar as garotas na suíte.

Os três saíram lado a lado.

- Você está bem? - Sky perguntou baixinho, se referindo ao ter encontrado ela em uma conversa longa com Saul.

Tecna sorriu novamente.

- Sempre.

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𝐢. 𝐄𝐋𝐄𝐓𝐑𝐈𝐂 𝐋𝐎𝐕𝐄. ! ༉ 𝗿𝗶𝘃𝗲𝗻Onde histórias criam vida. Descubra agora