Mundos diferentes, ideias iguais.

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Quando abri os olhos, o teto de madeira envelhecida e a janela que emoldurava a densa floresta do lado de fora me disseram que eu não estava mais no castelo. A luz do sol filtrada pelas árvores projetava sombras dançantes no chão, e o ar carregado do cheiro de terra úmida e folhas secas me trouxe uma sensação de estranheza. Tentei me levantar, mas uma dor aguda percorreu meu corpo, como se cada músculo tivesse sido esmagado e depois costurado de volta às pressas. Um gemido escapou dos meus lábios antes que eu pudesse contê-lo.

Olhei em volta, tentando entender onde estava. Alex estava sentado em um canto, afiando uma faca com movimentos precisos e quase hipnóticos. Dois homens conversavam à sua frente: um baixinho, de pele negra e barba bem cuidada, resmungava algo em voz baixa, enquanto um homem alto, de pele pálida como a neve e cabelos platinados, assentia com a cabeça, ouvindo atentamente. Percebi que meu movimento não passou despercebido quando Alex parou o que estava fazendo e fixou seus olhos em mim.

— Parece que a bela adormecida acordou — disse ele, girando a faca recém-afiada entre os dedos com uma destreza que me fez sentir um frio na espinha.

— Onde eu estou? — perguntei, tentando me sentar. A dor foi tão intensa que quase perdi o fôlego.

— Não se mexa muito, os pontos podem estourar — advertiu o baixinho, aproximando-se para me ajudar a me acomodar melhor. Ele tinha uma postura elegante, vestindo roupas que lembravam as de um duque, e sua barba bem cuidada contrastava com a expressão preocupada em seu rosto. — Sinceramente, Alex, olha quem você traz para cá!

O homem platinado se aproximou de mim com um copo de água, oferecendo-o com um sorriso gentil. Seus movimentos eram calmos e deliberados, e percebi que ele não falava. Em vez disso, fez alguns gestos com as mãos, que o baixinho interpretou.

— Ele quer saber se você precisa de mais alguma coisa — explicou o baixinho.

— Não, obrigada — respondi, ainda tentando processar a situação.

— Aquieta o facho, Blitzen — Alex interveio, arremessando a faca em direção a uma tábua de madeira na parede, onde ela cravou com um som seco. — Queria que eu deixasse ela para morrer?

— Não, mas sei lá, podia ter deixado ela perto do palácio. Eles se viravam — Blitzen resmungou, afastando-se com um passo decidido. Ele era baixo, mas carregava uma presença imponente, e sua pele negra reluzia sob a luz do sol que entrava pela janela.

O homem platinado, que agora eu sabia se chamar Hearthstone, permaneceu ao meu lado, observando-me com olhos curiosos. Ele era alto e magro, com uma palidez quase etérea, e seu cachecol branco parecia contrastar com o ambiente rústico ao redor. Seu sorriso era reconfortante, mas havia algo melancólico em sua expressão.

— Quem são vocês? — perguntei, minha voz carregada de desconfiança.

— Sem informações, bonitinha. Não precisa saber nada de nós — Alex respondeu com um tom de desafio, cruzando os braços.

— Eu ouvi "sua majestade". Foi assim que você se referiu a um tal de Magnus. Quem é Magnus, e por que ele se interessa por uma suposta criança que deveria estar sob a guarda do rei? — coloquei todas as minhas cartas na mesa, observando como os dois homens trocaram olhares significativos antes de voltarem seus olhares para Alex.

"Parabéns, Alex," sinalizou Hearthstone com um deboche silencioso, suas mãos movendo-se rapidamente.

— Vai à merda, platinado — Alex respondeu, irritado. — E você — ele acrescentou, voltando-se para mim —, se não quiser perder a língua, é melhor não falar nada.

— Eu quero explicações — insisti, ignorando a ameaça. Antes que Alex pudesse responder, a porta se abriu com um rangido, e um novo personagem entrou na cena.

— Não precisavam ser tão agressivos — disse Nico, atravessando a porta com uma postura calma e controlada. Ele olhou para mim, depois para os outros, como se esperasse uma explicação.

"Ela estava muito machucada," começou Hearthstone, seus sinais traduzidos por Blitzen.

— Quer saber? Não precisa. Apenas entreguem o livro para ela e facilitem meu trabalho — Nico interrompeu, folheando alguns documentos que carregava consigo.

— Você está por trás dos ataques? — perguntei, fixando Nico com um olhar acusador.

— Essas pessoas trabalham para a Grécia. Eu estou resolvendo alguns problemas com a realeza de lá. Pode crer que não estou por trás desses ataques idiotas — Nico respondeu, sua voz firme e impaciente. — Deixe-a ir.

— Mas ela vai entregar a nossa localização — Blitzen alertou, sua voz carregada de preocupação.

— Ela não vai, porque está tão curiosa quanto qualquer um sobre o que está acontecendo lá — Nico respondeu, virando-se para mim com uma carta na mão. — Aqui. Em troca de seu silêncio, uma carta para seu pai e esses livros proibidos. Eu sei que você quer saber mais sobre essa nação e é ambiciosa demais para recusar.

Ele estava certo. Eu não apoiava a maneira como o governo se organizava, nem como haviam censurado tudo sobre o período anterior à monarquia, como se tivessem algo a esconder. A curiosidade e a sede de conhecimento eram mais fortes do que qualquer lealdade cega ao trono.

Peguei os livros e a carta, ignorando a dor que ainda latejava em meu corpo. Eu não abriria o meu bico sobre qualquer coisa relacionada a isso. Até porque, agora, eu tinha em mãos uma carta do meu pai... escrita diretamente pela rainha da Grécia.

A Realeza | Percabeth | Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora