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Quando cheguei em casa, os meninos estavam sentados no sofá, seus rostos inchados e vermelhos de tanto chorar. Eles pareciam ter se acalmado um pouco, mas assim que me viram, as lágrimas voltaram a escorrer como se eu fosse o lembrete vivo da dor que todos estávamos sentindo. Meus irmãos mais novos, tão pequenos e frágeis, correram em minha direção, abraçando minhas pernas como se eu fosse a única âncora que os impedia de afundar naquele mar de tristeza.

Eu não consegui falar uma palavra. Meus olhos estavam vermelhos e ardiam de tanto chorar, minha cabeça latejava como se alguém estivesse martelando por dentro. Sentei-me no sofá, quase sem perceber o que estava fazendo, e os meninos se aconchegaram ao meu lado, como se meu colo fosse o único lugar seguro do mundo. Eles choraram até não aguentarem mais, até que o cansaço os venceu e adormeceram, seus rostos ainda marcados pelas lágrimas secas.

Enquanto isso, Percy estava na cozinha, tentando acalmar minha madrasta. Eu mal conseguia olhar para ela. Quando finalmente nossos olhares se encontraram, vi que ela estava tão destruída quanto eu. Seu rosto estava pálido, as olheiras roxas denunciavam noites sem dormir, e seus olhos, outrora cheios de vida, agora pareciam vazios, como se toda a luz tivesse sido sugada deles. Ela estava desolada, mas algo em seu olhar me dizia que ela precisava de tempo para processar tudo antes que pudéssemos conversar.

— Percy — chamei baixinho, tentando não acordar os meninos. — Me ajuda a levá-los para a cama?

Ele veio imediatamente, pegando um dos meninos com cuidado, enquanto eu carregava o outro. O quarto deles ficava embaixo da escada, um espaço pequeno e aconchegante que dividiam em uma cama de casal. Colocamos os dois juntos, como sempre dormiam, e eu os cobri com o cobertor que meu pai havia comprado no inverno passado. Aquele cobertor ainda cheirava a ele, e por um momento, senti como se ele estivesse ali, cuidando de nós.

Subimos as escadas em silêncio. A casa, embora simples, tinha dois andares. O primeiro era modesto, com paredes que precisavam de uma nova pintura e móveis que já haviam visto dias melhores. O segundo andar abrigava meu quarto e o quarto do meu pai. A escada era cheia de emendas e degraus desgastados, cada um deles contando a história de uma família que, apesar de tudo, sempre tentou se manter unida.

— Você quer ir lá em cima? — Percy perguntou, apoiando-se na parede enquanto eu parava no meio da escada.

— Meu quarto fica lá — respondi, subindo os últimos degraus. Ele me seguiu, e eu evitei olhar para o final do corredor, onde ficava o quarto do meu pai. Entrei no meu quarto o mais rápido que pude, como se fechar a porta pudesse me proteger da dor que insistia em me consumir.

Meu quarto era exatamente como eu havia deixado. As paredes estavam cobertas por páginas de revistas rasgadas, todas com imagens de monumentos reconstruídos após guerras. Era um reflexo do meu amor por arquitetura, um sonho que meu pai sempre apoiou, mesmo quando as coisas estavam difíceis. Tudo ali era familiar, ao mesmo tempo, parecia distante, como se pertencesse a outra vida.

— Seu quarto é a sua cara — Percy comentou, olhando para as imagens nas paredes. Ele parecia genuinamente interessado, como se cada detalhe contasse uma parte de mim que ele ainda não conhecia.

— Eu gosto de arquitetura — respondi, sentando na cama e tentando segurar as lágrimas que insistiam em voltar.

— Eu sei — ele disse, sentando ao meu lado. Seus olhos verdes estavam cheios de uma tristeza que eu nunca havia visto antes. — Eu sinto muito, Annabeth. Ninguém deveria perder o pai.

— Ele era incrível — comecei, minha voz falhando. — Depois que minha mãe foi embora, ele fez de tudo para me fazer feliz. Ele era... — As palavras se perderam em um soluço, e eu não consegui mais me segurar.

— Se quiser desabar — Percy disse, sua voz suave e reconfortante —, eu estou aqui para te segurar.

Eu me joguei em seus braços, chorando como se o mundo estivesse desmoronando ao meu redor. E, naquele momento, ele era a única coisa que me impedia de cair.


🩵👑


Finalmente consegui dormir, exausta física e emocionalmente. Quando acordei, senti um peso sobre minha cintura e percebi que Percy ainda estava ali, deitado ao meu lado. Seu rosto estava sereno, seus cabelos rebeldes caídos sobre a testa. Sem querer acordá-lo, levantei a mão e brinquei com uma de suas mechas, sentindo uma estranha paz naquele momento.

— Você está se sentindo melhor? — sua voz rouca me surpreendeu. Ele abriu os olhos, e eu me senti um pouco envergonhada por ser pega.

— Desculpe, não queria te acordar — murmurei, tentando afastar minha mão. Mas ele me puxou para mais perto, seu sorriso reconfortante iluminando o quarto.

— Continua — ele disse, fechando os olhos novamente. E, assim, ele adormeceu, deixando-me ali, com meu coração batendo mais rápido do que eu gostaria de admitir.

Aquele príncipe, com seu jeito despretensioso e seu coração enorme, era definitivamente um pecado.

A Realeza | Percabeth | Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora