Cap 1: Bolo melhor que sexo?

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Deixe-me ver se consigo entender — disse Mild para seu melhor amigo, Gulf Kanawut. — Você acha que o bolo que você fez é melhor do que sexo?

   Mild pousou o garfo e empurrou delicadamente o prato com a fatia do bolo até o centro da mesa da cozinha da casa de Gulf.

  — Talvez seja a cobertura de brigadeiro... Sei que será difícil para você, já que é recém-casado. Mas suponha que pudesse fazer sozinho um enorme e delicioso bolo de cenoura em qualquer noite da semana. Agora imagine não fazendo sexo por, vamos dizer... Quase um ano.

  — Ora, Gulf... Vou melhorar a proposta — atalhou Mild, batendo com o dedo de leve na borda do prato. — Vamos falar de um bolo perfeito. Com cobertura do melhor chocolate suíço em que já botei as mãos. E então? Iria preferir o bolo ou o sexo?

  — Você irá contra argumentar seja qual for a minha resposta. Não é? — Gulf suspirou e passou distraidamente a mão pelo cabelo rosa.

  — Deve ser difícil para você entender o que estou dizendo, já que se casou com o homem do seus sonhos. Mas é duro para nós que temos de escolher entre um bolo de cenoura e... Um bolo de brigadeiro. Hoje faz seis meses que meu divórcio foi homologado e... E...

    Droga! Estava chorando. Detestava sentir pena de si mesmo. Não que tivesse saudade de seu ex-marido. Afinal, era difícil sentir falta de um homem que o havia traído antes mesmo de poderem comemorar o primeiro aniversário de casamento. Sendo assim decidirá presenteá-lo com o divórcio.

  Mild afastou-se da mesa e ofereceu-lhe um lenço de papel que apanhou numa caixa sobre a bancada da cozinha.

   — Você está bem?

  Gulf enxugou as lágrimas e livrou-se do lenço de papel.

  — Estou ótimo. — E diante da expressão de total descrédito do amigo, acrescentou: — acho que é apenas cansaço.

  Mild pareceu acreditar.

  — Não me admiro. Com o número de horas que tem trabalhado...

   A vida na cidade de Mai Kao Beach resumia-se a uma existência feita de invernos vazios e verões agitados. A cidade fora descoberta por opulentos moradores de Bangkok em busca de um lugar mais relaxante. A cada verão, o número cada vez maior desses turistas chegava à cidade. Enormes mansões de veraneio iam de pouco a pouco substituindo os modestos chalés e boutiques da moda ocupavam as vitrines antes fazia.

    Alguns moradores antigos se ressentiam do progresso e do grande fluxo dos banhistas agitadores, como foram apelidados os moradores de fim de semana. Mas Gulf vislumbrará nesta avalanche de pessoas uma grande oportunidade e traçou um plano perfeito para alcançá-lo.

   Estava trabalhando em um ritmo frenético para expandir o salão de cabeleireiro que possuía para serviço completo de spa diário para captar os moradores de verão. Ainda estavam no início de Fevereiro, mas precisava correr contra o tempo para obter êxito em seu empreendimento.

  — O que lhe adianta ter o serviço de spa acabado no prazo se estará tão estafado que não conseguira pô-lo em funcionamento?

  — Muito engraçado.

   Levando a conversa para outro rumo, Gulf pediu ao amigo mais detalhes sobre o mural que estava planejando para uma das salas do seu Spa que receberia o nome de Éden. Não que estivesse preocupado com o desenho. Tinha plena consciência do talento de Mild.

   Enquanto o amigo discorria sobre o assunto, Gulf, absorto em seus pensamentos, serviu-se de outra fatia do bolo. Sentia-se um pouco ridículo pelo seu súbito acesso de choro. Quando cursavam o colegial, Mild havia sido o par de Fiat numa das festas de veteranos. Fora apenas um flerte de uma noite. O amigo estava tentando esquecer uma briga que tivera com Champ, um rapaz mais velho e de família abastada, que agora era o seu marido. Fiat, por sua vez, numa atitude idiota, estava tentando provar a Gulf, por quem nutria uma paixão que ele não era o único homem que ele podia ter.

  Ele cairá na armadilha. Uma coisa levará a outra e Mild acabará sobrando depois de uma calorada sessão de desculpas com os dois nus no banco de trás do carro de Fiat.

    Gulf sentira-se terrivelmente culpado pelo incidente até o verão anterior quando o amigo retornará a Mai Kao Beach depois de muitos anos fora da cidade. Mild e Champ se apaixonaram e os dois fizeram as pazes, tornando-se grandes amigos.

   Mild apontou o garfo em sua direção.

— Não está ouvindo uma só palavra do que estou dizendo.

  Gulf estremeceu de leve.

  — Devo admitir que não.

   — Estava dizendo que deveria concentrar-se em outras coisas que não o trabalho. Após uma pausa estratégica acrescentou: já te falei que Mew terminou com Art semana passada?

   — Várias vezes. — Mild referia-se ao seu irmão mais velho. O amigo sempre tentará promover um namoro entre os dois. Mas Gulf pretendia manter-se bem afastado de Mew Suppasit. Estar perto dele o deixava fora de controle.

   Mild interrompeu seus pensamentos.

  — Que tal dar um descanso a sua mente? Apenas por dois dias.

   — E quem iria cuidar do salão? — O lado bom de não ter sócios era o fato de ninguém contestar suas decisões. Mas o maior desvantagem era ficar prisioneira do seu próprio negócio.

   — Você não trabalha aos domingos e segundas-feiras. Remarca os compromissos que por ventura tenha no sábado e ignore as reformas por um fim de semana.

  De jeito nenhum. Você tem suas obrigações, o responsável empresário que residia em Gulf manifestou-se. Mas ele o fez calar-se. Mild tinha razão, era uma questão de saúde mental.

   — Bem, falando hipoteticamente, para onde eu iria?

    Um sorriso largo delineou-se no rosto do amigo.

    — Vamos para Bangkok.

  — Bangkok — repetiu suspirando, como se estivesse falando de um paraíso.

Um garoto rebelde Onde histórias criam vida. Descubra agora