VI

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Você tem a música em você, não tem?

Já era tarde demais, em qualquer sentido que essa expressão pudesse significar.

Hassan era novamente um criminoso sem localização.
A lua minguante no céu se tornava mais nítida conforme as nuvens iam se espalhando para voltarem pela manhã e eu... ainda seguia me sentindo vulnerável demais para conseguir congelar minhas emoções.

Quando coisas ruins voltam repentinamente para te assombrar, você não tem escolha, a não ser passar pelo trauma de novo e de novo e de novo. Porém mostrar esse lado na frente de Ghost tinha sido uma das ações que me deixavam com mais remorso.

—— Qué pasa hermana! - era Farah, no batente da porta do quarto, escondendo as mãos atrás de seu corpo.

Bom, depois do desastroso fracasso que a missão tinha feito questão de acontecer, nós voltamos para base de Alejandro para aguardar mais informações sobre o paradeiro de Hassan.
A Shadow Company sobrevoava os arredores do terreno para encontrar pistas, enquanto nós ficávamos sem fazer nada. E quando digo nada, era nada mesmo.

Tudo estava de acordo com os procedimentos e comandos de Sheperd, que sinceramente eram ridículos, já que quanto mais pessoas se esforçassem para caçar linhas na fogueira, menor seria o tempo para que o fogo cessasse.
Mas, não, tínhamos que seguir meticulosamente cada passo que ele nos mandava fazer e enquanto isso, morrer de angústia em não saber o próximo passo da missão.

—— Eu só quero acabar com esse filho da puta - digo ao deitar no colchão.

—— Não consigo pensar em ninguém que não pense exatamente isso agora.

—— Odeio quando as coisas não acontecem do jeito que são planejadas - eu sinto seu peso sentar ao meu lado - Primeiro Graves, o iraniano e...

—— Ghost - ela pontua cirurgicamente, mas eu tento disfarçar - Ele ficou o tempo inteiro quieto depois do que aconteceu. Não abriu a boca nem para jogar baralho com os outros.

Os olhos dela repousam na minha feição cansada. Eu me sentia cansada a um bom tempo, e até ela percebe.
Bom, quem não estava?

—— Mas, você vai ter que aprender a lidar com essas coisas - ela dá de ombros - Nem tudo vai sempre sair como planejado.

Eu suspiro alto. Sermões não eram para mim.

—— É sério, Ice, não existe destino aqui. Você vai ter que aprender a cair e levantar sozinha, mesmo que isso te custe caro.

—— Caro como?

—— Você se fechou depois do que aconteceu na lagoa... você sabe o que aquilo te custou.

Eu engulo seco, tirando ela da minha visão ao olhar para o teto.

Mas, mesmo que seria difícil de aceitar mais uma lição de vida, era inevitável dizer que ela estava certa. Na verdade, estava com toda a razão em suas mãos, e agora, eu parecia uma criança birrenta que não sabe como manejar as próprias ações.

Talvez eu fosse.

Nunca me ensinaram como processa-las mesmo.

—— Não quero ser fraca - eu aperto seu braço e sussurro em seu ouvido com uma voz que parecia presa dentro de mim.

Aquilo era humanamente doloroso demais para admitir e ela vê esse custo em mim. Farah chega a aproximar nossos corpos e encara meus olhos como se aquela fosse a única vez que alguém tivesse realmente me olhado de verdade.

—— Você é a pessoa mais forte que eu já conheci - ela chacoalha meus ombros - Não é pelas histórias que Gaz e Soap falam ou sobre o que está escrito na sua ficha quando entrou aqui... Eu tô falando de experiência que eu vi com os meus próprios olhos.

𝐔𝐥𝐭𝐫𝐚𝐯𝐢𝐨𝐥𝐞𝐧𝐜𝐞, 𝗌𝗂𝗆𝗈𝗇 𝗀𝗁𝗈𝗌𝗍 𝗋𝗂𝗅𝖾𝗒.Onde histórias criam vida. Descubra agora