Oito

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Sina Deinert's point of view

— Sina, preciso te lembrar de que você está de férias? — Julio Marquez, meu chefe na MetroNews1, bufou ao telefone. Revirei os olhos.

— Estou dizendo que posso adiantar grandes reportagens, não que vou ficar o dia todo trabalhando — argumentei e ouvi um resmungo bravo. Julio era meu superior desde a época do meu estágio. Devia saber que um mês de férias não me deixaria longe do jornal.

— É a primeira vez, em três anos, que você tira férias, Sina. É melhor deixar de lado todo o serviço de pesquisa. Se eu souber que está perto de qualquer site que não seja de vestidos de noivas… — começou e eu ri.

— Certo, você venceu. Só me fale se um dos estagiários tiver iniciado a…

— Não, nada disso. Nada de vigiar estagiários — implicou. — Vai fazer compras, riscar itens nas suas infinitas listas ou qualquer outra coisa que tiver, mas pare de ligar para esse jornal — brincou. Ou pelo menos eu achava que era brincadeira.

— Ok, nos vemos em um mês, então — me despedi e suspirei, colocando o celular na mesa, ao lado do meu notebook.

A página em branco do Word parecia ficar mais vazia a cada segundo que eu a olhava, e não ter um tema para escrever só piorava. Eu tinha tirado os dias de preparativos para o casamento como folga, mas, mesmo com os avisos do meu editor para eu me concentrar em ajudar Heyoon e parar de tentar trabalhar nas férias, uma pilha de ideias acumuladas me chamava, sem sucesso.

Eu estava na editoria de Ciência desde meu primeiro dia no MetroNews1 e já tinha me habituado aos textos difíceis. Com um dicionário de sinônimos, calma para entender o que os pesquisadores queriam dizer e a vontade de traduzir jargões da ciência para os leitores, eu podia trabalhar por horas.

Não naquele dia.

Geralmente eu não tinha bloqueios. Como jornalista, a notícia estava sempre ali. Eu só precisava encontrar a melhor maneira de contá-la.

Bufei e me levantei para buscar uma nova xícara de café, por mais que eu não me sentisse sonolenta, esperando que o caminho até a cozinha me desbloqueasse para a escrita. Meu pequeno e silencioso apartamento não estava fazendo muito em relação à minha inspiração. Talvez eu devesse colocar mais água em Jane Austen, Virgínia Woolf e Agatha Christie, minhas samambaias de estimação. Mas eu já tinha colocado mais cedo…

Senti falta de Heyoon. Quando eu tinha qualquer tipo de trava, pedia sua opinião, que, apesar de ser uma excelente repórter de esportes, sempre conseguia me ajudar. Mas, naquele momento, minha amiga estava lidando com burocracias, como garantir que ela e Lamar não fossem considerados foragidos da polícia ou casados em segredo com outras pessoas. Eu não podia ligar e, para ser sincera, nem queria. Tinha que me acostumar, afinal de contas, em poucas semanas, ela estaria deixando os Estados Unidos.

— Merda de café — reclamei ao tomar um gole da xícara recém-posta e surpreendentemente fria. — Preciso lembrar de comprar um copo térmico.

Tinha uma coisa revoltante sobre a solidão. Eu gostava de estar só, de ter meu próprio espaço, do silêncio, da solitude da minha companhia. Mas a solidão em si, esta era diferente.

Eu tinha crescido com sete primos que, além de serem irmãos de sangue, também tinham tudo em comum. Todos eram religiosos e boas crianças. Eu, porém, era o ponto fora da curva, a filha da irmã rebelde que, de repente, era mais uma boca para ser alimentada. Por ser diferente demais, eu estava sozinha, mesmo em uma casa com mais nove pessoas. Aos poucos, tinha me acostumado com a solidão, mas nunca a quis para mim. Sempre a temi.

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