Capítulo 2 - A pequena Koslov

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A festa estava animada, colorida e feliz. Todos celebravam a vitória da Madrinha.  Altagraça estava em cima de uma alta sacada observando a todos, como uma rainha que especta seus súditos. Notou um rosto conhecido. Pablo Escobar. Sorriu feliz e foi de encontro ao jovem rapaz.

- Hola, Madrina! Vim te ver - Pablo Escobar,  uma promessa no mundo do narcotráfico.  Altagraça sabia e se aliar foi a melhor opção. Ele fornecia, ela vendia e transportava.

- Olá, meu querido! Que bom que veio! - Rivera abraçou-o, tinha verdadeiro apreço pelo jovem adulto. O homem tinha uma visão ampla sobre os negócios e uma ambição invejável. Lembrava a si mesma quando mais jovem.

- Sinto muito por Alberto... - Pablo segurou suas mãos, tentando a consolar. Sabia que era difícil perder alguém que amava. Ele não tinha a menor ideia, tinha? A mulher sorriu doce e disse:

- Oh sim! Que Deus cuide de sua alma! - o tom profererido foi de puro escárnio, porém, Pablo não notou.

- Vim para comemorar junto a ti, mas também para comunicar que o carregamento de armas russas podem não chegar no mês combinado. - Rivera junta as sombrancelhas confusa

- Como não? - O cartel da Colômbia tinha uma aliança com a máfia Russa Orekhov, comandada por Ivan Koslov. Era um trato único, de importação e exportação constante. Muito lucrativa.

- Koslov informou que o FBI está na cola deles. Você sabe, os Estados Unidos sempre tão pretencioso. Ele precisa de um lugar seguro para fazer um álibi perfeito. Disse a ele que as praias colombianas são perfeitas para as férias... - Escobar sorri sugestivo, e oferece um dos seus charutos cubano para a mulher, que prontamente aceitou.

- Bom, minha casa é grande e espaçosa o bastante para hóspedes. - a mulher solta o fumo e sente a nicotina penetrando seu corpo.

- Certo, madrina! Falarei com ele. Agora me voy! - o jovem homem se despede com um beijo no dorso da mão da mais velha, um sinal de respeito a hierarquia.

Altagraça ficou sozinha, já estava acostumada. "Para quê ficar com um homem inútil ao meu lado, se posso ser gloriosa sozinha?" A madrinha não tinha mais paciência para estas tolices de romantismo e afeto. Era trabalhoso demais, exigia muito de si. A mulher preferia seus casos de tesão e paixão de uma noite só. Nascera para ser adorada.

6 de outubro de 1975, Medellín, Colômbia

Eram três da tarde, e a mulher estava na cadeira de seu escritório lendo suas planilhas de vendas, tinha faturado mais de 2 bilhões de dólares em 6 meses. Vender para os americanos foi realmente uma ótima ideia. Altagraça sempre soube. O país não é uma super pontência à toa, eles trabalham demais, precisam relaxar. Ela, uma alma bondosa, só facilitou os meios. Sorriu, altiva.

Um barulho alto é ouvido, o helicóptero estava pousando. Seus convidados chegaram. A mulher se levanta caminhando até a entrada principal, foi conferir se estava tudo e todos preparados para a chegada dos hóspedes russos. Pelo que haviam informado eram somente pai e filha que estavam a caminho.

- Están todos listos? - a resposta é óbvia. Até porque, se não estivesse perfeito, como Altagraça havia ordenado, a morte era certa. Os empregados acenam a cabeça em concordância. - Meninos! Sejam legais com os nossos convidados, são pessoas muito importantes. - ela adverte os filhos, sabia os anjinhos que tinha em casa. Os meninos afirmam com a cabeça, fazendo sua mãe sorrir e deixar um beijo na cabeça dos três. Era uma mãe carinhosa.

A porta é aberta, um homem muito esguio e magro entra pela mesma.Tinha uma pele bronzeada, cabelos castanhos claro e olhos verdes como uma esmeralda. Muito atraente a quem quer que fosse.

- Altagraça Rivera! É uma honra conhecê-la. Ivan Koslov. - o homem alto pega a mão da Madrina e a beija - É um prazer! Agradeço por acolher a mim e minha filha. São momentos difíceis.

- Não há de quê. Fazemos tudo quando o assunto é proteger nossos filhos, não é?! - a chefe do cartel diz com um ar superior retirando sua mão do aberto do homem - Y donde está la niña? - Altagraça pergunta, querendo apresentar a menina aos seus filhos. Quem sabe no futuro, uma união matrimonial entre os mesmos seria possível. Interessante para os negócios.

A menina, que estava atrás do pai, não é nada daquilo que Altagraça esperava. Supunha que a garota tinha a idade de um de seus filhos, mas viu que estava enganada. A menina era uma jovem adolescente, aparentava ter entre 16 e 17 anos.

Seus cabelos eram mui longos e negros, da cor do ébano, lisos como uma seda negra. Diferentemente de seu pai, sua pele era pálida e parecia macia, se assemelhando a uma nuvem recém moldada pela condensação.

Seus olhos eram negros e profundos, era como se galáxias estivessem presas nestes, as pupilas eram dilatadas como as de um gatinho excitado, os cílios eram como cortinas que protegiam seus olhos da luz do sol.

Sua boca arredondada e carnuda era de um vermelho natural, assim como suas bochechas. A jovem parecia de uma porcelana mui frágil, e de repente, surgiu a para Altagraça a vontade de quebrar. Que irritante!

Altagraça solta o ar que nem sabia que prendia. A imagem da jovem russa desconhecida, lhe deixara desconfortável, e não sabia o porquê. Um miado ecoa pela casa, e só então, a mulher percebe que há um gato em sua casa.

O animal era laranja tigrado, de pelo longo e grande para o padrão dos gatos. O bichano caminhou em sua direção como se fosse dono de sua propriedade, enroscou-se em sua perna, cumprimentando de forma amigável.

- El gato con botas - uma voz suave e com um sotaque forte, é audível ao seus ouvidos. Rivera olhou a menina de cima a baixo, caminhando em sua direção

- Que dices, niña? - a mais velha eleva suas sombrancelha incitando a jovem moça repetir a frase falada antes, sua postura era no mínimo, intimidante.

A menina acuada volta para detrás do pai, apertando-lhe o cotovelo com as pontas dos dedos, uma mania de infância. O pai era seu herói. Sempre estave lá para salvá-la, desde os monstros que moravam em seu armário ou homens maus que viviam pelo mundo. Foi superprotegida durante sua vida toda, era isso que conhecia sobre o mundo. Somente o que seu pai lhe contara.

- Ela não fala espanhol, Madrina. - o homem toma a frente da situação, tentando tirar sua doce filha do foco de Altagraça, porém, sem êxito

- Então, que não tente falar! - falando em inglês, em um tom rude que foi dirigido para a garota que estava com as lágrimas prontas para ser derramadas, se sentia sem saída. - Qual é o seu nome, garota?! - Rivera estava em um tipo de transe sombrio, onde não conseguia ver outra coisa que não fosse aquela fedelha irritante 

- Clara. C-Clara Koslov - a mais velha sorri debochada. "Colocaram Clara como nome para uma menina que é mais branca que o leite?! Ora, quanta criatividade!"

- Me diga, Clara... O que tinha dito antes? - o questionamento saiu em um sussurro, como se fosse um segredo de estado que só elas duas pudessem saber

- O gato. Ele se chama gato con botas - o sotaque russo era muito evidente quando a pequena Koslov falava o espanhol. Isso quase fez Altagraça sorrir. Quase.

O ambiente estava tenso. Todos ali naquele cômodo sabia do que a mulher era capaz de fazer. Era insana. Rivera sorriu para menina e disse:

- Bem-vinda a Medellín! - deu-lhe um abraço forte. Quem a visse de fora, parecia uma mulher muito cortes e simpática, porém por dentro estava desconfortável. Aquela garota a tirava da zona de conforto. Quase como se existisse uma fraqueza, uma falha no sistema milimetricamente calculado de Altagraça Rivera. Um sentimento de revolta lhe prenchera o peito. "Por que me sinto assim? ". Ela não iria parar. Não enquanto não descobrisse.

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