Quais as possibilidades disso ser verdade? Clara assistia uma novela mexicana, onde o casal protagonista se beijava ardentemente e trocava juras de amor, era tão belo e inédito, nunca havia visto algo tão íntimo. Então é isso que os casais fazem?
Clara sempre esteve distante de tudo, isso inclui a máfia e informações, de todos os tipos. Depois da morte de Arabella, sua mãe. Ivan jurou a esposa que protegeria a filha. Tinham regras muito específicas que a russa mais nova tinha que obedecer, como: não sair do quarto depois das oito, - era quando os homens de seu pai adentravam a casa - ou ver televisão, - para que não houvesse contaminação - é claro que a menina seguia tudo arrisca, pois: "o mundo só tem coisas ruins", "você não tem nada a ganhar lá fora", mas ainda assim, a menina sempre esteve curiosa para conhecer as maledicências do mesmo.
"Tú és mi primero amor, Letícia! Necesito tu calor, tus besos..."
A menina assistia a cena da telenovela encantada - Besos... - Clara repetia a fala do ator, enquanto tocava seus labios sutilmente - Quero beijar.
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Sua perna direita se movia em sinal de nervosismo e ansiedade, o cigarro em sua mão também indicava isso. O prazer de sentir a nicotina perfurando suas veias era um perfeito calmante. Já fazia duas semanas que não esquecia o que tinha feito pensando em Clara. Foi tão inapropriado, mas não conseguia esquecer.
Duas semanas que não parava de fumar ou balançar os pés nervosamente, duas semanas que evitava a garota, duas semanas que se excitava com os pensamentos impuros que antes tivera. O que eu deveria fazer? Era uma ótima pergunta. Altagraça se sentia como uma prisioneira dentro de sua própria casa, não podendo sair do quarto, ou melhor, da cela.
Fazia tempo que não passava algum tempo com seus filhos, eles estavam crescendo tão rápido e se tornando meninos valentes. Pensava em José, e em como havia sido inocente de confiar nele. Amava seus meninos, porém faria diferente se tivesse chance. Talvez entraria em uma escola e aprenderia a ler e a escrever. Alberto havia lhe ensinado, e fora muito difícil aprender depois de "velha", mas foi fácil segurar uma arma e apertar um gatilho. O crime compensa, se bem feito, é claro.
Já passava das nove da noite e a mulher mais velha nem havia se dado conta, porém seu estômago deu-se por ela. Chegando na cozinha, a mesa estava posta. Clara conversava animadamente com Díxon, seu menino mais velho.
- Você gostou dos HQ's que eu te mostrei? - o pequeno filhote Rivera estava animado por poder mostrar coisas novas para a menina
- Ah, sim! Liga da Justiça não é muito comum de onde venho - Clara sorri, levantando os ombros, envergonhada. A verdade era que ela não sabia dizer se era o não comum, pois nunca havia tido contado com mais ninguém da sua idade.
- Oh, sério?! E quais dos personagens você mais gostou? O Superman? Ele é incrível, verdade? - Díxon enchia a menina de perguntas, completamente eufórico. Seus irmãos não gostavam muito dos HQ's e fazia tempo que sua mãe não lia junto a ele.
- Sim, ele é incrível! - A filha do Capo sorria docemente com a absorção do menino. Suas bochechas cheias pela comida e a fala muito bem gesticulada era deveras divertido.
Já Altagraça quase passou mal ao ver o sorriso doce de Clara, como uma hiperglicemia. Ela acompanhava a conversa atentamente, parecendo indiferente. Notava os trejeitos da menina, como era doce e delicada a falar, a forma como manuseava os talheres e levava a comida até sua lindíssima e bela boca. Clara recebera uma criação digna de uma princesa. Então fechou os olhos, engoliu o pedaço de carne a seco e se viu adicionando mais um cenário impuro aquele que antes tivera. Um onde a princesa fosse obrigada a se curvar e fosse açoitada, pobrezinha. Perdeu a conta das vezes que imaginou a menina implorando por piedade pela sua vida. Ela faria Clara implorar.
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La Madrina
RomanceAltagraça Rivera. Ela foi a mais bem-sucedida traficante dos anos 70, uma rara matriarca no crime na América Latina. Em uma época em que as fronteiras eram muito menos fiscalizadas do que hoje, Altagraça foi a primeira a enviar cocaína em uma escala...