Prévia 7

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As aulas que o Deco me deu de "piloto de carro bicho" realmente surtiram efeito...

Eu estava de frente aquela quadra que me trazia tanta recordação...

Lembro de quando  saí dali correndo, porque tinha visto o que o Ramon tinha feito ao Pablo, por ciúmes, por minha causa...

Nunca me senti tão culpada por algo na minha vida...O cenário era o mesmo!
Mas a situação era outra!
Meu Deus...uma guerra...a Rocinha...não precisava ser envolvido, ou muito menos ser carioca para saber o potencial da Rocinha!

A MAIOR FAVELA DA AMÉRICA LATINA

A ROCINHA VIROU BAIRRO, TAMANHO SEU POTENCIAL E REPRESENTAÇÃO!

Não...sacudo a cabeça...pensar nisso só me traz pensamentos terríveis e conflitantes!
Ainda seguro o volante, por mais que esteja estacionada.

São tantas coisas, me sinto numa centrífuga...o que fazer?
O que falar?
Eu sou só uma pirralha qualquer!
Puta que o pariu!
Como fui estúpida!
Quem eu penso que sou?!
Knock - knock

Batidas no vidro insufilmado

Desço a janela com um toque
_"A...er...oi...eu sou o truta, mas na verdade - ele olha pro lado - bem, na verdade meu nome é Raul...er...a senhora...quer dizer...você,sei lá...veio curtir o baile hoje?

Eu olho por ele por sobre o vidro que arriei só até a metade.
Um homem que parece ter o dobro da minha idade, sei lá, tá se tremendo todo por falar comigo.
Que bizarro!

_Er...Raul, né? Então...Raul...
_Pode me chamar de Truta...quer dizer...sei lá...chama se preferir!

Eu olho pro volante e depois pra frente...lotado de gente!
Abro a porta.
Ele arregala os olhos.
Olhos cor de jambo, ele todo tinha uma cor bonita, mas cara de quem estava metido nisso há muito tempo!

_ Eu quero curtir o baile, Raul...quer dizer...Truta!

Ergui o queixo e sorri sem vontade!
Ele faz que sim com a cabeça e pede pra eu esperar ali.

Vários olhos me encaram, me esquadrinham e eu vejo que estou com uma roupa qualquer...um short jeans e um body...não decidi me arrumar pra nada! Apenas saí!

Consigo me libertar dos olhos que me observam e vejo os "meus seguranças" conversando...aliás, eles pareciam estar discutindo!

Me sinto mal, não queria criar alarde nenhum... porra, porque esses caras me seguiram, cacete?!

Bato a porta do carro e isso parece assustar eles de alguma forma; todos me olham e ...mano, dá um bug, e o "Truta" volta com um outro cara; outros dois saem da moto e seguem.

_ Vamos, vamos acompanhar a senhora até o camarote!
Eu ouço o "senhora" e me lembro da linguagem que o cara da associação usava pra falar com a minha mãe.

"Senhora" Que merda!

Os dois estão com armas bem ostensivas e isso não era problema pra mim...cresci em meio a isso!
Só que percebi, em determinado momento, que eles formavam uma bolha ao redor de mim...os quatro! Eu estava no meio, os da frente Abriam espaço para eu passar e os de trás, cuidavam para que não me encostassem! 

Era bizarro, pq na verdade, eu não conhecia bem como funcionava os bailes...não sabia, inclusive, como eram cheios!

Só vim umas duas vezes  e...mano...hoje, entrando pela entrada normal, eu me sentia meio...claustrofóbica , de novo!

_ Pera! - Segurei na mão do Truta, a pessoa mais conhecida ali, no final das contas!
Eu ainda estava abalada por muitas coisas....o voo, a chegada, a notícia do perigo que o Ramon corre...e eu tenho certeza de que ele iria querer mostrar tudo que pudesse para provar o quanto era capaz de ter a confiança do meu pai e do Deco...e era exatamente isso que me colocava a flor da pele!

A necessidade dele de pertencer a algo...a fazer por merecer...a vida dele sempre foi uma merda! Tratado como nada...largado, desprezado!
Minha mãe sempre pagou psicoterapia pra mim, pois achava que era muito difícil crescer visitando um pai na cadeia, mas...cara, eu nunca tive o menor problema...cresci com essa realidade, não sabia diferenciar!

Cresci rodeada de tudo que o dinheiro pode comprar...não tenho sequelas de infância...mas ele?Ele tinha muitas...e tão profundas...A única solução pra ele, era se sentir pertencendo a algo...ter um laço...e ele lutou muito pra chegar onde chegou...ser aceito!
Eu tive tempo pra pensar, lá no México...tive muito!
Ele era uma criança ferida, sem ter quem o defendesse...eu era a criança super protegida!

_ Quer algo? Vamos te levar ao lugar onde a diretoria fica...lá não tem esse tumulto, você...er...conseguirá ficar mais a vontade! - O Truta me fala e o rapaz ao lado dele parece olhar ao redor como se qualquer pessoa fosse um perigo em potencial; vi quando eles empurraram na marra várias pessoas, que não tinham aberto espaço pra eu passar...mas a grande maioria se tocava, e fazia seu papel, distanciando o quanto podia pra que o meu caminho fosse alcançado.

Eu fiz que não com a cabeça.
Via os olhos me olhando , famintos

_ Falta muito? - Perguntei, exausta por tudo....Ele não podia entrar nessa!
Essa guerra não era dele!
Ele não precisava provar nada a ninguém!
Caralho, ele é muito jovem...ele tem...ele tem...uma vida pela frente! Ele já era um Yssuz!

_Tá vendo aquela luz negra ali?, só precisamos chegar até ali! Consegue?

Acho que eu estava mesmo com uma cara muito ruim....o Truta estava me tratando como uma senhora de 70 anos!
Fiz que sim com a cabeça e , comecei a andar; ele segurou meu pulso e fez um sinal com a cabeça.
Os dois rapazes que estavam atrás tomaram a frente e a partir dali foi como um enxame de abelhas ao contrário; todo obstáculo que estava a nossa frente, abriu como o mar vermelho nas histórias bíblicas que o pastor contava nos cultos que eu ia com minha mãe e a Jô!

_ Vem! - O Truta/ Raul, segura meu cotovelo e eu ando naquele meio de multidão que se separou em meio a 4 homens armados de fuzil.

Subo escadas que não me eram desconhecidas, apesar de eu lembrar bem que, da outra vez que estive aqui, o lugar em que fiquei era do lado esquerdo...mas, enfim...sei que eles estavam me levando ao melhor lugar de agora!

Eles sabem quem eu sou...isso estava claro!

Passei por um corredor , com varias micro entradas; haviam vários camarotes, mas nos direcionavam para o final...óbvio...o mais perto do palco possível...ali que meu irmão, na verdade, os grandes, ficavam!

É ...eu sou irmã do Deco...entendo a dinâmica!

Assim que entramos, no que era o "Meu lugar", percebi a diferença de decoração...era perfeito! Parecia uma boate! Não lembro se quando estive aqui era assim...eu estava tão focada em...

_ Vem, vou te levar até sua cunhada!

Gelei "Cunhada"?
A mulher do meu irmão estava com ele no México!

Vi quando os 3 meninos ficaram afastados, me olhando como cães de guarda, enquanto o Truta me levava até uma loira.
Linda, preciso ressaltar!

Ele falou algo no ouvido dela, enquanto ela sugava algo no canudo...uma bebida em uma taça dourada. Ela me olhou de cima abaixo e eu acabei fazendo o mesmo...

Ela usava um vestido vermelho justo, usava unhas longas e seu cabelo loiro descia como uma cascata sobre os ombros.

Eu olhei pro lado e olhei de novo pra mim.

Me senti envergonhada, pq parecia uma pirralha sendo apresentada a uma dama da sociedade.

Ela sorriu um sorriso branquíssimo pra mim e me abraçou.

- Que grande prazer em conhecer a irmã do Ramon! - Ela diz, cheirando a Angel, perfume que minha mãe chama de cheiro de piranha

O Truta sorri orgulhoso e diz no meu ouvido, por causa do som altíssimo da equipe de som

_ Essa é a Bianca, mulher do seu irmão Ramon!

O NOVO DONOOnde histórias criam vida. Descubra agora