004 - Física & cereja

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As semanas se passaram voando e eu me encontrei com a Merlina quase todos os dias depois das aulas e durante os intervalos

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As semanas se passaram voando e eu me encontrei com a Merlina quase todos os dias depois das aulas e durante os intervalos. Temos passado muito tempo juntas ultimamente.

Quase sempre almoçamos juntas numa mesa que fica no fundo da cantina. Ela sempre pega uma porção pequena de arroz e uma salada exageradamente colorida, junto a um pedaço de bife de frango. Enquanto isso, eu aproveito os biscoitos doces que compro na lojinha de conveniência perto da escola. Ela diz que devo comer algo mais saudável, mas eu não consigo me livrar desses biscoitos. Eles são perfeitos!

Ela é divertida, atenciosa e é uma pessoa que às vezes é muito fácil de decifrar. Já sei que ela gosta de meninas. Ela mesma me disse depois que perguntei se ela namorava ou gostava de algum menino.

Não sei se ela é lésbica, pan, bi ou queer. Sei apenas que ela gosta.

Agora, a reação que ela teve quando descobriu que estou no mesmo barco que ela não foi algo "normal". O rosto dela ficou completamente vermelho e ela deu um sorriso exagerado, junto com mini ataques de gritos. Óbvio que os gritos não foram na minha frente, mas ela não contava que as paredes do banheiro não seriam o suficientes para abafar aqueles gritinhos. Eu acho.

Estamos na biblioteca, em breve ela vai fechar e faz horas que estamos aqui.

Admiro a paciência que ela tem comigo.

— De onde saiu esse número?! — Me encolhi ao perceber que gritei. — Eu não entendi nada.

— Presta atenção, se você quiser transformar isso, naquilo, faz essa conta aqui — E quanto mais ela falava e colocava números, mais a minha cabeça girava. — É simples!

— Só é simples porque você sabe fazer — Puxei meus cabelos. — Merlina, eu odeio a função horária. Odeio física em geral.

— Para com isso. Você vai conseguir.

Fechei o caderno, não quero mais saber de nada.

— O que você acha da gente ir comer alguma coisa? A biblioteca já vai fechar mesmo.

Ela olhou para o celular, e não fez uma cara muito boa.

— Eu vou falar com a minha tia, já volto aqui.

Merlina se levantou e levou junto a bolsa que carregava. Continuei ali dentro lendo a página aberta do livro de exercícios.

Isso é horrível.

Fechei o livro. Chega de física por hoje.

Olhei para fora através da grande janela de vidro que ilumina a biblioteca, para onde Merlina estava. A luz do sol batia diretamente nela, o cabelo reluzia diante daquela luz. Estava linda. Mas a cara dela não estava linda como de costume, na verdade, ela estava emburrada.

Acho que a tia dela está incomodando de novo.

Merlina me pegou olhando para ela, e aquela cara emburrada logo se acalmou e um sorriso nasceu em seu rosto.

Que linda.

Ela fez sinal para eu ir até ela e guardou o telefone na bolsa.

— E aí, ela deixou? — perguntei assim que cheguei perto. — Não vem com mistério pra cima de mim.

— Tenho até às sete e meia pra ficar com você.

Foi inevitável não sorrir com tamanha doçura vindo dela misturada com alegria. Ela sorriu também, e seus olhos estavam fixos aos meus, às vezes desciam até minha boca e voltavam para onde estavam.

Meu rosto ficou quente.

— Vamos logo, meu cérebro tá doendo de tanto cálculo e números.

Me afastei para não fazer outra coisa e deixar o clima estranho entre nós duas.

É curioso, sempre quis saber o porquê onde eu ia, ela sempre estava. Em jogos, corredores e na cantina. Ela sempre estava por perto e isso era pra ser assustador. Mas pra mim, sempre foi estranho ter ela perto até demais. Porque era a Merlina, a Merlina Evans, sobrinha da diretora que quase nunca falava com ninguém, porque a maioria das meninas são apenas garotas interesseiras achando que vão ter algum tipo de luxo ou privilégio.

Nojentas. As meninas dessa escola são nojentas. São poucas as que se salvam.

— Ah, Nana! — Ela segurou no meu braço. — Olha que lindo aquele brinco!

O brinco era feio.

— Um brinco de cereja?

— É lindo! — Lina deu pulinhos. — Quero comprar!!

Ela saltitou para dentro da loja.

— Vamos comprar então…

Valeu a pena. Só de ver o sorriso dela, valeu a pena comprar aquele brinco feio que misteriosamente ficou lindo nela.

— Eu juro que vou te pagar, Nana! Eu prometo! — ela disse segurando meu braço.

— Estou até hoje te devendo cinquenta wons. E você tá sendo uma professora melhor que aquele chato que dá física pra gente — Ela corou. — Fica como um presente em agradecimento.

Merlina apertou meu braço e deitou a cabeça no meu ombro, mas logo se afastou de novo.

— E aí, o que vamos comer? — ela perguntou.

— Tem uma lanchonete que eu queria muito te levar, é incrível! A comida de lá é ótima!

— Então vamos lá, ainda temos uma hora pra ficarmos juntas!

"Ficarmos juntas"

Isso definitivamente fez meu coração acelerar, e não tem nada demais na frase.

É muito cedo pra isso, Jenna.

𝘁𝗼𝗱𝗮𝘀 𝗮𝘀 𝘀𝘂𝗮𝘀 𝗰𝗼𝗿𝗲𝘀 . jenna ortega Onde histórias criam vida. Descubra agora