12 - O desabafo.

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Micaela mandou Noah se vestir, e esperar por elas do lado de fora, com Orfeu. Ainda um tanto relutante, ele obedeceu, então Micaela se sentou ao lado de Mirela, mas não sabia ao certo por onde começar.

- Primeiro me explica... como é que Noah acabou ferido, e como vieram parar aqui?

Mirela suspirou.

- Eu saí pela noite... E arrumei encrenca com uns marmanjos... o Noah me seguiu, e quando me viu lutando, jogou o cavalo pra cima deles e me ajudou a escapar. Infelizmente, numa distração, um deles enfiou o canivete no braço dele, mas eu dei um jeito neles, depois coloquei Noah no carro, e escondi ele aqui... porque eu sabia que você ia surtar quando descobrisse.

Micaela ficou em silêncio por um tempo, sem saber o que falar... então perguntou.

- Mas o que tu estava fazendo na rua, a essa hora da noite?

Mirela encarou o chão, e disse com voz magoada.

- Estava procurando vingança!

Micaela abraçou a irmã e afagou seus cabelos. Finalmente estava pronta pra acolher Mirela, que esteve ferida por tanto tempo.

Mirela não teve ninguém por ela, e estava se reconstruindo sozinha... E Micaela, tão preocupada em manter os filhos numa redoma, nunca tirou um tempo pra ser o ombro amigo da irmã.

- Eu sei que pode ser doloroso relembrar... mas na época, tu não conseguia falar, e eu nunca consegui te ajudar. Por favor, minha irmã... me conta o que aconteceu! Quem fez isso contigo?

Mirela chorou nos braços de Micaela, enquanto ela lhe afagava os cabelos. Depois de se aliviar, Mirela começou a contar.

- Foi no dia da morte do Jean. Todos estavam ocupados, e eu saí pra comprar pão. Mas quando passei pelo beco, o Joaz e seus amigos estavam usando drogas. Eu tentei fugir, mas eles me pegaram... E decidiram que ia acabar comigo pra eu não testemunhar...

Mirela contava tudo como se fosse uma sonâmbula. Contou como eles colocaram uma coleira em seu pescoço e a trataram pior que um animal. Contou dos abusos que sofreu, e dos momentos angustiantes que passou.

- Um belo dia, o Joaz pegou pesado e me deixou quase morta. Eu senti alguém me tirando de lá, e me carregando... mas eu estava tão mal que pensei que fosse a morte... então acordei na sua cama, no rancho.

Micaela estremeceu com essa lembrança. Mirela continuou.

- Aqueles monstros me destruíram! Eu tinha nojo do meu corpo quando lembrava como eles abusaram de mim... eu tinha nojo de ter que viver nesse corpo. Eu revivia todos aqueles horrores, vezes sem fim... pensei em colocar um fim na minha vida pra tentar esquecer... Então na noite que a Melissa morreu... o Noah apareceu. Ele era tão puro... parecia um anjo! E na inocência dele de criança, ele me tocou de um jeito que reconstruiu meu coração.

Mirela parou, e depois de encarar a irmã, continuou.

- O Noah, sem perceber, foi minha salvação. Eu tinha remorsos por me apaixonar por alguém que não sabia o que estava fazendo... mas o Noah não é assim! Ele cresceu! E se lembra daquela noite, a quinze anos atrás! Ele não é um ser irracional! Ele pode ter algumas limitações, e acho que muita coisa se deve ao jeito que você o criou, mas ele sabe o que quer. Ele quer ser o homem da minha vida, e estou disposta a retribuir. Acredite em mim, eu tentei! Tentei várias vezes... mas nunca consegui ir até o fim com ninguém sem surtar... só com ele!

Micaela abraçou a irmã. Esse com certeza era um assunto pra se pensar com calma e resolver depois. Por hora, ela queria saber quem eram os comparsas de Joaz.

Era uma vez... no sertão Onde histórias criam vida. Descubra agora