Capítulo Nove

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Eda Yildiz

Há momentos que eu odeio sentir alguma coisa.

Há dias que eu me levanto da cama pela manhã e penso como seria mais fácil ser um poço vazio de emoção. Uma pessoa fria e sem coração. Alguém que não sentisse o turbilhão de angústia, medo e saudade que crescia em meu peito feito erva-daninha em um jardim.

Respirei fundo e me recostei no sofá. Fechei meus olhos.

Tudo estava silenciosamente agoniante.

O sol já se esgueirava pelas frestas da cortina, pintando o piso com sua luz e seu calor. Eu estava cansada. Esgotada. Preocupada. Theo havia sido transferido para uma enfermaria há poucos minutos.

Meu coração implorava para que eu fosse vê-lo. Fosse conferir seu estado com os meus próprios olhos. Enquanto meu cérebro gritava que ele não era mais preocupação minha. Ele tinha uma família presente. Uma família que ele nem tinha se dado ao trabalho de me apresentar.

Ele está bem! Está vivo!, confortei-me em pensamento.

Talvez fosse uma desculpa confortável para a minha fuga. Eu não precisava vê-lo, certo? Ele estava bem. Estava em boas mãos.

Dou um pulo no sofá, assustada, quando ouço alguém entrar na sala dos médicos de supetão. Espiei sobre meu ombro e afundei meu corpo de volta entre as almofadas. Os passos de Efe cruzavam a sala preguiçosamente, como em uma marcha lenta. Era uma das características dele que me agoniavam às vezes. Efe era um poço de calma em sua vida particular. Nunca se exaltava fora de um procedimento médico. Desfilava pelo hospital como se não houvesse pacientes terminais que precisassem se auxílio até alguém bipá-lo e ele sair correndo feito um louco pelos corredores.

-Seu amigo está bem.

O ouvi dizer, enquanto enchia sua caneca com o café recém passado na cafeteira.

-Ele está na enfermaria 304 – bebericou sua bebida – Se quiser vê-lo.

Balancei a cabeça em silêncio.

Manter minha vida pessoal longe da rádio corredor do hospital era uma das minhas necessidades básicas. Eu não queria sentir que cada pessoa com quem cruzasse estivesse analisando-me para me tornar o alvo principal das fofocas na hora do descanso. Não queria dar munição a ninguém. Não mais do que as pessoas já produzem sozinhas.

Perdi-me por um instante, encarando o vaso artificial de planta que decorava a mesinha de apoio perto do sofá.

Uma parte de mim queria que a vida fosse tão fácil quanto substituir uma planta viva por uma de plástico só para evitar que fosse necessário ficar regando-a ou limpando sua sujeira de tempos em tempos. Só porque era mais prático e fácil.

-Ele não está tão grave como pensamos a princípio – senti o sofá afundar ao meu lado e o cheiro de carvalho me atingiu. – O raio-X não está ruim. Ele realmente quebrou o braço e teve algumas microfraturas pela força do cinto e dos air bags, mas ele vai sobreviver. Só vai precisar de repouso e paciência. A tomografia dele foi enviada para você dar uma olhada, como pediu.

-Eu vi.

Efe deu mais um gole em seu café e senti seus olhos sobre mim.

-E?

-Foi só uma concussão.

Ele suspirou.

-Você tá legal?

Não respondi.

-Pareceu tão abalada quando o viu. Fiquei preocupado – ele soltou uma risadinha nervosa – De onde o conhece?

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