Victor Decker:
No meio daquele momento de alívio, uma sensação incômoda começou a se infiltrar em meus pensamentos. Havia algo que eu não podia ignorar, uma verdade que se escondia por trás de nossa situação. Eu e Puck tínhamos sido banidos dessas terras. A regra era clara: se voltássemos, a sentença seria a morte. Não havia exceções, não havia misericórdia. E agora, ali estávamos, de volta a um lugar onde nossa mera presença poderia nos condenar. A pergunta silenciosa pairava no ar, uma sombra ameaçadora: o que eles fariam agora? Como poderiam justificar nossa sobrevivência?
Antes que pudesse ponderar mais sobre isso, algo inesperado aconteceu. Kierran, o filho de Ash, rompeu a tensão que nos envolvia e, com um sorriso radiante, correu em nossa direção. Em um instante, ele me envolveu em um abraço caloroso, e logo depois, abraçou Puck com a mesma intensidade. A surpresa me deixou sem palavras por um momento. Sua energia era contagiante, um raio de luz em meio à escuridão que nos cercava.
— É muito bom ver vocês — disse ele, com um sorriso que fez minhas preocupações vacilarem por um instante.
Eu fiquei ali, um pouco rígido no início, incapaz de compreender completamente o que estava acontecendo. Aquele gesto tão simples e genuíno era algo que eu não esperava. Puck, por outro lado, soltou uma risada curta, mas verdadeira, e retribuiu o abraço com uma leveza que parecia, por um breve momento, dissipar qualquer sombra de perigo.
— Kierran, meu rapaz! — Puck exclamou, batendo no ombro dele com um toque brincalhão. — Você cresceu desde a última vez que nos vimos, não é?
Eu sabia que algo ainda estava por vir, algo que não podia ser ignorado, mas naquele momento, havia uma trégua. O sorriso de Kierran, a presença de Ash, tudo indicava que havia mais em jogo do que simples regras sobre banimentos e execuções. Algo havia mudado — talvez nas próprias forças que governavam essas terras — e, por alguma razão, eles não estavam dispostos a nos matar... pelo menos, não ainda.
Mas a dúvida ainda persistia. Qual seria o preço dessa inesperada recepção calorosa?
— Vocês chegaram em ótima hora — disse Ash, sua voz carregando um tom grave que me deixou desconfiado.
Franzi a testa, tentando entender o que ele queria dizer. Nossa chegada não poderia ser mera coincidência, especialmente com o perigo que nos cercava. Havia algo grande acontecendo, algo que escapava à nossa compreensão imediata.
— O que aconteceu? — perguntei, a ansiedade crescendo dentro de mim.
Kierran foi o primeiro a responder, sua expressão séria contrastando com o abraço caloroso de antes.
— Os três reinos estão em guerra com o Reino das Sombras — ele disse, a voz carregada de urgência. — A escuridão já se espalhou por todo o Nevernever. Eles começaram invadindo o Reino do Inverno e, depois, avançaram para o Reino do Verão. Agora, o País das Maravilhas está nos abrigando, onde as duas terras se uniram para resistir. O Reino de Ferro está à beira da destruição.
Meu coração deu um salto ao ouvir aquilo. A guerra estava muito além do que eu imaginava. A expansão do Reino das Sombras não era uma simples invasão — era uma campanha de destruição. Ambres não estava apenas me perseguindo. Ele estava consumindo tudo em seu caminho.
Antes que eu pudesse processar completamente a gravidade da situação, Puck falou, sua voz carregada de uma tensão que raramente demonstrava.
— Até o véu entre os mundos está sendo atacado — ele acrescentou, com um tom de seriedade incomum. — As fronteiras que mantêm os reinos separados estão enfraquecendo. Se o véu cair, não haverá mais barreiras. As sombras vão engolir tudo, e os outros mundos serão arrastados para essa escuridão.
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Anjo das sombras | Livro 4: O Rei Das Fadas
AventuraDentro de menos de vinte e quatro horas, Victor celebrará seu décimo sétimo aniversário e enfrentará uma escolha crucial. Apesar de tecnicamente já ter vivido dezessete anos, sua estadia prolongada em Nevernever o deixou apenas alguns dias mais velh...