CAPÍTULO 23

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Finalmente chegamos, uma caminhada que era para ser apenas de dois dias acabou virando uma semana.

Ainda não me caiu a ficha de que Zanya colocou-se em risco ficando perto de Darren. Mas ela está segura, e logo voltaremos para buscá-la. Assim também será com Katherine, não sabemos onde ela está e nem como, mas vamos encontrá-la.
  
– Como chama para entrar? – perguntou Mathew – gritando? Espancando esses portões enormes de gelo?
  
– Não sei, deveria ter algum guarda aqui fora – disse Hadria.
  
Olhamos ao redor, apenas árvores cheias de neve e um frio horrendo. Aliás, queria muito saber como só metade da floresta está escondida na neve.
  
– Oi – disse uma voz suave atrás de uma das árvores – quem são vocês?
  
– Olá – falei, procurando de onde vinha a voz, que soava mais como um sussurro. – Somos do reino de Brishighet, viemos para ajudar nos ataques.
  
– Ah sim, mas não ficaram sabendo? Os ataques diminuíram. O rei e a rainha ficaram preocupados com a demora de vocês.
   
– Sim, demoramos mais do que o esperado – disparou Eleanor, encarando Mathew.
   
– Vamos abrir os portões para vocês – vamos? – Talvez no momento não seja precisa a ajuda de vocês, mas é bom irem tomar um banho.
   
Realmente, estávamos com um cheiro horrível. Fora a nossa aparência.
    
De trás das árvores, saíram duas mulheres negras. Eram parecidas. Paralisei.
    
– Está tudo bem? – perguntou uma delas. Eu não ia falar que sonhei com elas me arrastando para a mata e contar as coisas estranhas que aconteceram.
  
– Sim, devo ter me confundido  – falei. A mais alta andou até mim e parou a minha frente, seus olhos negros me penetravam profundamente, mas eram suaves, uma calma letal.
   
– Meu nome é Yep – disse ela fazendo uma pequena reverência – Aquela é minha irmã Kaali. Somos sentinelas aqui do reino. Mas às vezes escapamos das obrigações e damos uma volta pela floresta – Yep sorriu de canto, Kaali se aproximou de nós.
    
– Conhecemos vocês, você principalmente – disse Kaali apontando para Mathew e sorriu – é um bruxo que dá trabalho, admito.
    
– Não dou tanto trabalho assim não – disse ele franzindo o cenho e cruzando os braços – Achei que vocês eram livres e bichos da floresta.
    
– Somos livres – retrucou Yep – e somos da floresta, mas preferimos ficar aqui, é melhor e não precisamos viver fugindo de bruxos.
   
– Achei que fossem poderosas o suficiente para não precisarem fugir.
    
– E de fato somos, mas há bruxos que são o dobro. E é esses que tememos.
    
– Desculpe, mas que tipo de "bicho da floresta" ele quis dizer? – perguntou Eleanor.
   
As irmãs pareciam estar comentando algo mentalmente, seus rostos não diziam nada.
     
– Na verdade não sei se podemos realmente sermos identificadas assim, existem poucos de nossa espécie, mas somos feéricas.
     
– Mais especificamente morcegos gigantes – disparou Mathew.
     
Elas riram e concordaram com a cabeça. Em seguida, afastaram os cabelos negros do rosto e mostraram orelhas longas e pontudas, Yep tinha brincos espalhados por ela. Já a de Kaali tinha um único brinco longo de pequenas pedras. Logo, em um piscar de olhos, mostraram as asas. Pretas e grandes, com pontas afiadas no topo.
   
– Sabemos que para vocês isso pode ser irrelevante – comentou Yep. E ela estava errada, não sabíamos da existência de feéricos, muito menos com asas e orelhas pontudas. – Também podemos enganar a mente das pessoas, fazer elas verem coisas que não são reais. Ah, e também podemos invadir sonhos. Pregar uma peça ou mostrar uma lembrança.
   
Então elas estavam mesmo no meu sonho. Tenho certeza.
    
– Foram vocês que invadiram meu sonho naquela noite? – indaguei.
    
– Sim – foi Kaali quem respondeu – estamos aqui muito antes de todos esses reinos, vimos e ouvimos coisas desagradáveis ao longo de nossa vida. Achamos injusto o que Darren fez com você. Mas não podíamos falar, não era de nossa conta, então invadimos seu sonho e mostramos uma lembrança. Torcemos muito para que você juntasse todas as peças e que pudesse fazer sentido para você depois. Quando vimos que sua amiga retirou o anel e que você descobriu sobre o laço, nos afastamos.
    
– Espera – disparou Hadria – vocês estavam nos observando esse tempo todo?
    
– Apenas quando necessário. Queríamos que Maya ficasse em segurança. Ao lado de Pierre nós sabíamos que ela estaria, mas não enquanto estivesse com o anel.
    
– Minha mãe estava naquele sonho, vi o reino das chamas. O que tem a ver? E aqueles colares e o sangue? – indaguei, estava assustada e curiosa.
    
– Sua mãe é bruxa, Darren pediu a ela que fizesse o feitiço. Ela sabia o quanto isso lhe prejudicaria, hesitou até não poder mais. Cedeu depois de várias manipulações, algumas arriscando até sua vida. Ela ficou com medo quando ele ameaçou acabar com você, ele é um bruxo poderoso.
    
– Ele me ameaçou, e mesmo assim minha mãe deixou que eu ficasse com aquele monstro?
    
– Sim, mas não pense um minuto sequer que sua mãe deixou passar, todos os dias ela pensava em um jeito de matá-lo, de deixar você longe dele. Mas o fim dela veio logo em seguida. Ela morreu com a culpa dominando cada parte de sua mente, morreu sem achar um jeito de separá-los sem que você acabasse morta. Mal sabia ela, que era só desenterrar os colares da floresta e escondê-los. Fazer você tirar o anel e tomar banho com ervas. Sua mãe era uma bruxa poderosa e muito inteligente, mas quando se tratava de você, ela sentia medo. Medo de perder a única coisa que ela ainda tinha e sentia amor.
   
Dei dois passos para trás, absorvendo tudo o que foi dito. Eu já não sentia mais frio, as chamas correndo pelas minhas veias deram um jeito. Estava assustada, me sentia traída pela minha própria mãe. Sei que ela tentou me proteger, mas me entregar de bandeja para um maluco?
    
Abracei meus braços e segurei as lágrimas. Com a voz embargada, falei:
   
– Podem abrir os portões? Precisamos entrar.
   
As irmãs assentiram. Com um gesto de mãos, os portões se abriram.
   
– Nos acompanhem – disse Kaali.
  
Entramos logo depois delas, estava distraída demais em meus pensamentos para notar qualquer detalhe do lugar. Mas percebi trenós sendo puxados por ursos polares mais a frente.

Coroa de Sangue: Uma Vingança | Livro 1 Onde histórias criam vida. Descubra agora