-- Então foi apenas um susto? -- Helena perguntou pela quarta vez ao médico, fazendo Rosália - ou Maria - revirar os olhos.
-- Mas se ele já disse que sim por que insiste nessa pergunta, criança? -- Perguntou. Helena a olhou rapidamente.
-- Quero me certificar de que esteja bem. Só me deixe fazer meu trabalho. -- A moça disse séria e a mulher mais velha assentiu resignada.
-- Ela está perfeitamente bem, sua pressão apenas caiu e a dor no peito deve ter sido emocional. Provavelmente fazia algo importante demais para ela, o que resultou a dor psicológica, já que nos exames não apontou nada. -- Clara, quem estava mais atrás encostada no batente da porta, automaticamente pensou na caixa. Maria deveria estar vendo fotos de Helena minutos antes e por Helena ter mencionado sua mãe para a mulher no dia anterior isso provavelmente aumentou a pressão psicológica em sua mente.
-- Certo. Então posso voltar a trabalhar hoje? -- A mulher mais velha, que estava recostada na cama, perguntou apressadamente.
-- Sugiro que repouse o dia de hoje para amanhã estar nova em folha. -- O médico disse.
-- Eu não lhe permitiria trabalhar hoje de qualquer forma. -- Helena disse.
-- Enfim. Já que não precisam mais de mim vou me retirar. Tenham um bom dia, senhoras. -- O médico disse saindo do quarto da mulher. Maria suspirou e olhou para Clara, quem lhe sorria mansa.
-- Helena... -- A voz da mais velha saiu incerta e Helena percebeu a insegurança em sua voz, a olhando confusa.
-- Está tudo bem? Precisa de algo?
-- Estou bem, hijita. Apenas... -- Tomou ar e se ajeitou na cama. -- Precisamos conversar.
-- Sou toda ouvidos. -- Disse se sentando na beira da cama. A mulher lhe encarou fixamente. Com olhos nostálgicos um sorriso lhe brotou no rosto.
-- No dia em que você nasceu chovia tanto. -- Helena a olhou surpresa. Rosália nunca lhe contava nada de sua infância. -- Eu me perguntava como seria seu rostinho. -- Falou sorrindo. -- Passei os nove meses imaginando como seriam seus traços... Como seria o som do seu choro... Como seria a maciez de sua pele... Se você gostaria da cor das paredes do seu quarto.
-- Eu fico feliz de saber que você acompanhou a gravidez da minha mãe. -- Helena disse inocente.
-- Eu acho melhor eu... -- Clara começou, mas foi interrompida pela mulher mais velha.
-- Prefiro que fique, querida. -- Seu olhar de súplica fez Clara entender que ela queria Clara ali para confortar Helena. Clara apenas assentiu e permaneceu no lugar.
-- O que está acontecendo? -- Helena perguntou. A mais velha suspirou e lhe tocou as mãos.
-- No dia que conheci seu pai eu fiquei encantada. -- A mulher disse nostálgica. -- Imagina só. Um militar lindo daquele jeito me cortejando.
-- Você foi apaixonada por meu pai? -- Helena perguntou sem reação. A mulher apenas apertou o toque em sua mão e prosseguiu.
-- Na época eu não sabia que ele era rico e poderoso. Ele para mim era apenas ele. Apenas Michael. -- Falou calma. -- Por um minuto eu pensei que o lixo de vida que eu era obrigada a ter poderia ficar no passado. "Oh, alguém me deu atenção. Devo valer algo, devo ser mais do que um encosto na vida dos outros. Alguém se importa comigo." Eu pensei.
-- Rosália...
-- Ele me cortejou por meses. -- Falou com a voz embargada. -- Eu parei de fazer o que fazia porque ele jurou que me protegeria de qualquer um e eu? Bem... Eu acreditei. -- Disse enxugando uma lágrima teimosa com uma de suas mãos, enquanto a outra ainda segurava a de Helena. -- Eu fugi de onde eu estava e caí nos gracejos do seu pai e me entreguei a ele... de corpo e alma, mas um dia... -- Suspirou. -- Um dia ele se apaixonou por outra.
-- Minha mãe, certo? -- Helena perguntou apenada. A mulher apenas mordeu o lábio e continuou.
-- Meu tio, que era o homem de quem fugi, me achou... -- Seus olhos desviaram para Clara, quem também não conhecia a história. A menina lhe sorriu e assentiu, como se dissesse para prosseguir. -- E eu fui espancada a chibatadas por uma semana. -- Os olhos de Helena se arregalaram, uma mistura de raiva e surpresa faiscaram de seus olhos. -- Mas duas semanas depois as marcas sairiam do meu corpo e eu teria que voltar ao trabalho. -- Helena escutou um soluço vindo de sua esposa, mas não sabia o que dizer. Estava horrorizada. Jamais havia escutado sobre o passado da mulher por quem tinha tanto apreço.
-- Por que você...
-- Mas não deu tempo de voltar ao trabalho, graças a Deus, porque... um dia eu comecei a passar mal e meu ciclo estava atrasado. Foi aí que resolvi fazer o teste de gravidez. -- Helena entortou a sobrancelha em confusão. Maria engoliu em seco e fitou sua filha nos olhos. Viu confusão, mas também viu uma mulher linda e honrada. Nada poderia ser mais gratificante. Perderia sua filha, mas não abriria mão da felicidade dela com Clara. Jamais! -- E então descobri que a prostituta estava grávida.
-- Não pode... Não pode ser. -- Helena disse soltando a mão de Maria e se levantou atarentada. -- O que você... o que está me dizendo, Rosália?
-- Que você foi o melhor presente que seu pai poderia ter me dado em toda a vida miserável que eu tinha... Filha. -- Helena balançou a cabeça em negação e olhou para Clara.
-- Diz para ela que não, Cla. -- Pediu com os olhos já cheio de lágrimas. -- Diz que não pode ser. -- Clara pressionou um lábio junto ao outro e pelo olhar Helena soube. -- Você... -- Olhou para Rosália - Ou Maria. - E logo para Clara novamente. -- Você sabia! -- Não foi uma pergunta. Clara tentou se aproximar, mas Helena saiu correndo do quarto da mulher.
Lágrimas eram o que mais se via em Maria, mas mesmo assim, quando Clara lhe olhou desnorteada, criou coragem para dizer algo firmemente.
-- Vá! Acerte-se com ela.
-- Mas você...
-- Eu ficarei bem. -- Clara lhe olhou ainda sem saber se deveria ir, mas Maria voltou a falar. -- Eu só contei por vocês, criança, então preciso que se acerte com ela para eu ver que o que fiz valeu de algo. -- Clara se aproximou e beijou seu rosto.
-- Desculpe se eu te forcei...
-- Ninguém me forçaria a isso. Meu coração precisava dessa paz. -- Sussurrou a última parte. -- Agora vá. -- Clara assentiu, limpando as lágrimas com as mãos e saindo correndo disparada atrás de Helena.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Clarena- Over The Rainbow
FanfictionOver the Rainbow é uma história romântica que se passa no século XX. A protagonista Clara, contrariando as regras da aristocracia a que pertence, se apaixona por Théo Bastos, um camponês da classe baixa, mas sua mãe, Sinuhe, deseja que a filha conqu...