XI

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Ao chegar em casa, Edgar a estava esperando.

—As chaves da outra casa —disse ele.

Ignorando o que pareceu mais uma afirmação do que uma pergunta, Olívia respondeu:

—Pensei que estivesse ocupado... Não quero conversar, estou cansada.

—Olie, você não pode continuar com isso... me escuta!

Olívia parou no quinto degrau da escada e se virou para o tio. O mesmo tinha uma expressão preocupada no rosto. Ele a olhava como quando a mãe dela a olhava quando ela acordava no meio da noite com medo do escuro. Vulnerável.

Ela se despiu de sua armadura. Se sentia fraca. Cansada. Ela estava cansada, mas de quê exatamente? Cansada de se esforçar para sempre parecer mais forte do que realmente era? Cansada de ter que ser perfeita? Cansada de tentar esconder todos os sentimentos, a saudade? Talvez. Talvez de tudo isso. Mas acima de tudo, Olívia estava cansada de se sentir cansada. Cansada desse sentimento a sufocando e esmagando tudo por dentro.

Edgar a abraçou forte. Ele queria que ela soubesse que ele estava ali, para ela. Mesmo sendo ausente, mesmo não compartilhando laços sanguíneos com a garota. Queria que ela soubesse que ele a entendia e que a ajudaria, como sempre fez.

***

Ethan bateu na porta da casa e Edgar foi quem a abriu.

—Acho que ela não quer te ver hoje, cara. —disse, abrindo mais a porta para o garoto entrar.

—Onde ela está?

—Digamos que ela está tendo uma crise nesse exato momento enquanto nós conversamos.

—Eu posso vê-la? — perguntou.

—Claro. Suba as escadas, é o último quarto no corredor, você vai reconhecer a porta.

Ethan mal terminou de ouvir as orientações e já estava subindo os degraus. Ele ainda conseguiu ouvir o tio de Olívia gritar: "Bata na porta no quarto primeiro!" antes de alcançar o corredor e andar até a última porta. Ele bateu uma vez.

Nada.

Então bateu outra vez e ouviu alguém responder baixinho:

—Pode entrar.

Ele abriu a porta e colocou a cabeça para dentro no quarto, então a viu. O rosto inchado e vermelho era o indicativo de que ela deveria estar chorando fazia um tempo.

—Posso? — Olívia acenou com a cabeça e ele entrou e achou um lugar na pontinha da cama onde ela estava.

Então ele a esperou falar.

—Hoje o dia não está muito... bom.

Ethan viu de relance a foto que a pequena segurava.

—São seus pais?

—Sim —ela mostrou a foto para ele. O pai a segurava no braço enquanto a mãe sorria, abraçada ao marido —Eles... acho que você conhece a história.

—Deve ser... difícil.

Ela acenou com a cabeça.

—É por isso que está chorando? —ele perguntou, ponderando suas palavras.

—Estou chorando porque... porque depois de anos ainda não sei lidar com isso. A saudade. O buraco. Geralmente eu finjo muito bem. Sou uma atriz muito boa, mas hoje...

Eles ficaram em silêncio, o garoto absorvendo as palavras de Olívia.

—Estou chorando porque... eu estou cansada de me sentir assim. —disse, os olhos enchendo de lágrimas. —Porque é patético que eu desmorone cada vez que respiro, ou penso, ou simplesmente existo.

Silêncio mais uma vez.

—Eu não sei o que posso dizer para fazer você se sentir melhor. —Ethan falou depois do que pareceram minutos, horas. —Mas eu sei de uma coisa, a saudade... ela é o preço que se paga pelo amor. Você tem lembranças o suficiente para saber que foi infinitamente amada por eles. Onde quer que eles estejam continuam amando você infinitamente. Mas eu acho que você precisa viver. Sabe? Não pode se deixar desmoronar, precisa viver.

—Acho que eu desaprendi a fazer isso.

—Se me permite, eu acabei de ter uma ideia. —respondeu Ethan, abrindo um leve sorriso para a menina. —Você confia em mim?

***

Ele levou Olie para uma rua extremamente tranquila. Era quase como se ninguém morasse naquelas casas. Como se fosse uma parte fantasma da cidade.

—Para sair do lugar você precisa ligá-la.

—Eu não consigo, Ethan, não dá.

—Claro que consegue, eu estou bem aqui atrás. Vamos. Você consegue —incentivou.

Se ela não confiasse que ele tomaria as rédeas da situação antes que os dois sofressem um acidente poderia pensar que ele estava tentando matá-la. Ainda assim, deixou a adrenalina tomar o controle.

—Você pode repetir?

Ethan sorriu. Era a sétima vez que ela pedia para ele repetir. Mas estava funcionando.

—Liga a moto. Segura a embreagem. Tira a pedal para não cairmos. Solta a embreagem bem devag... —Olívia saiu em disparada na moto e Ethan precisou apertar sua cintura com força para não cair.

—Ethan! Eu não sei parar essa coisa! —ela gritou. E em meio ao barulho da moto em movimento ela o ouviu gargalhar.

—Você não quer parar! —ele gritou —Só precisa desacelerar um pouquinho — Ethan cobriu as mãos dela com as próprias —Assim. Viu?

Ele estava tão perto que ela precisou de muita concentração para não apertar mais o acelerador ou frear de vez. Olívia acenou positivamente com a cabeça e isso fez o garoto tirar as mãos das dela.

Duas voltas no quarteirão depois, a menina estava gargalhando com o vento batendo em seu rosto. Ela tinha conseguido. Até que um sinal vermelho a fez estancar a moto sem querer e ela quase não conseguiu sair do lugar outra vez.

Quando finalmente conseguiu, Ethan se aproximou por trás e falou ao seu ouvido:

—Viver, sentir, amar... tudo isso faz parte da aventura que é ser humano. Viva, Olívia MacMillan, apenas viva.

Olívia sorriu e acelerou a moto em resposta.

CONTOS DE GAVETA [Concluída]Onde histórias criam vida. Descubra agora