O Sussurro do Vento

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Agatha não estava exatamente "quase aí". Fico uns bons minutos esperando na varanda. O dia está nublado e mais frio do que eu esperava. Nuvens de vapor se formam com a minha respiração em frente ao meu rosto e as pontas dos meus dedos começam a doer.

Tento esquentar as mãos enfiando-as dentro das mangas do moletom enquanto assisto o vizinho da frente encarar algo no chão, reclamando alto para alguém dentro da casa. Parece que um urso fez uma visita durante à noite e deixou um belo presente sobre a grama.

Eric Challe aparece trazendo uma pá e o cesto de lixo, com o cabelo bagunçado e a cara amarrada de quem acabou de acordar. A família dele morou a vida toda naquela casa e quando criança, estudamos na mesma escola. Naquela época, Eric era um dos valentões da Westview Elementary. Era dois anos mais velho e adorava me usar para dar seus shows de masculinidade.

Um dia, Dave me mostrou uma forma de quebrar o nariz do garoto e eu dei ouvidos a ele. O golpe não chegou a quebrar, de fato, mas fez um estrago grande o suficiente para fazê-lo sangrar. É óbvio que Eric se vingou depois, mas nada que ele fizesse me tiraria o prazer em vê-lo chorar.

O Sr. Challe continuava reclamando, às vezes em direção às árvores do bosque à direita, às vezes com Eric, que recolhia as fezes de maneira preguiçosa.

Desde a época em que éramos crianças, ele havia mudado bastante. Cresceu demais, ganhou uma barriga proeminente e até onde eu sabia, não tinha um trabalho ou uma namorada. A situação dele deveria me agradar, confesso que vê-lo limpar os rastros do urso pela manhã, com os gritos do pai, era interessante, mas eu não me sentia bem com isso.

O formigamento da vontade de acender um cigarro ressurge e com ela, Dave. Ele se arrasta pelas vigas da varanda e se recosta na última delas, me observando com olhos cheios de malícia. Logo, a sensação que tive quando fumei depois de acordar volta ao meu corpo, mas de forma fraca, me fazendo desejar ainda mais.

Cerro os dentes, me movendo para frente e para trás na tentativa de conseguir calor. Agatha odeia me ver fumando. Vivo dizendo para ela que estou tentando parar. Dave quer que eu fume porque quer nos ver brigando. Sua tentativa de me induzir acaba se tornando a razão para que naquele momento não me entregue ao vício. Não vou lhe dar o gosto de discutir com Agatha logo pela manhã.

O Sr. Challe grita ainda mais alto do outro lado da rua. Ele estapeia a cabeça de Eric por não fazer o trabalho rápido o suficiente e eu paro de olhar, cansado de invadir a privacidade dos vizinhos. Decido me ocupar com os fones de ouvido e o celular, mas enquanto tento escolher algo na playlist, a imagem de Eric apanhando do pai aparece na minha mente, junto com flashes do garoto me batendo com o joelho, na escola. Dave rasteja como um cachorro velho ao redor das minhas pernas, emitindo um som divertido. Ele quer que eu aprecie a situação.

Finalmente, Agatha dobra a esquina da Harvie com a Ann Ave, dirigindo o seu barulhento e velho Ford Del Rey. Em outra situação, o carro seria um valioso item de colecionador, mas o estado nada conservado do exemplar que Agatha possuía o tirava de qualquer possibilidade de entrar em um leilão.

Ela encosta de forma desengonçada junto ao meio-fio, chamando a atenção dos Challe por ser barbeira, uma de suas peculiaridades. Dou a volta no carro, ignorando os olhares e ocupo o lugar do passageiro. Imediatamente, sinto o cheiro de aromatizante barato, mas Agatha parece ter notado outra coisa:

— Estava fumando de novo? — Pergunta ela.

— Bom dia para você também — respondo, abrindo a porta mais uma vez e fechando-a com mais força, para ter certeza de que agora sim estava trancada.

— Mas que droga, Ian. Estava quase acreditando em você dessa vez — diz ela, em um tom decepcionado.

— Hey! Eu não estava fumando — me defendo. — Você deve ter sentido o cheiro que está preso nessa porcaria de moletom, é só isso.