18

37 2 0
                                    

As luzes estão apagadas. Moira não está em casa. Considerando que se trata de um sábado à tarde, sei que logo ela trará problemas. Sento na sala, as costas apoiadas no sofá. Deito a cabeça nos joelhos e respiro fundo, tentando entender o que havia acontecido, tentando descobrir o que fazer.

Raphael havia me beijado naquela praia.

O pensamento me parece ilógico. Impossível. Mesmo com todos esses anos estando apaixonado por ele, eu nunca alimentei nenhuma esperança de que algo aconteceria, sempre soube que tê-lo era algo inalcançável. Contudo, havia sido ele quem havia segurado o meu rosto e pressionado seus lábios contra os meus.

Ainda posso sentir o seu toque quente, o fantasma da sua língua explorando a minha boca, basta me concentrar um pouco. Seu olhar desolado também está ali, fácil de encontrar, como se eu ainda pudesse alcançá-lo e dizer alguma coisa útil para o momento, ou ao menos perguntar o que tudo aquilo significava, pois não faço a menor ideia.

Raphael está com raiva agora? De mim, de si mesmo? Está confuso, arrependido? Será que vai ao menos voltar a conversar comigo algum dia?

Esqueça o que aconteceu, ele havia dito, deixando a fúria que crescia dentro dele transparecer. Com toda certeza não iria acontecer de novo, com toda certeza Raphael não quer que se repita. E com toda certeza, eu sou incapaz de esquecer.

Sinto a presença de Dave forte às minhas costas. Levanto a cabeça, me deparando com a semi-escuridão da casa. O dia já havia avançado bastante desde que eu me sentara ali.

"É claro que ele te odeia. Você o trouxe para isso, fez com que ele se torne alguém repulsivo, assim como você."

Repito para mim mesmo que não há problema nenhum em ser gay. Foi extremamente difícil me convencer disso e parece proporcionalmente fácil desfazer essa ideia na minha mente fraca. Não posso dar ouvidos a Dave. Mas talvez, seja assim que Raphael pense. Afinal, aquele beijo significa que ele é como eu, certo?

Decido subir para o meu quarto. Faço o melhor possível para não dar atenção a Dave, que está sentado na cama em sua melhor imitação de postura humana. Tomo um banho rápido e visto roupas secas, lutando a todo custo para organizar meus pensamentos e banir qualquer sinal de esperança na possibilidade de, um dia, eu e Raphael ficarmos juntos.

Abro a janela e acendo um cigarro. A fumaça tóxica faz o meu corpo relaxar um pouco, enchendo a minha corrente sanguínea de nicotina. Quando a brasa chega ao filtro do cigarro, me sinto mais calmo, apesar de ver o rosto de Raphael cada vez que fecho os olhos. Pensando melhor, lá no fundo, sei que devo seguir seu conselho. Sei que devo esquecer. O problema é descobrir como.

O som abafado do toque do meu celular me pega de surpresa. Vasculho o quarto à procura da calça que usava há pouco e arranco o celular do bolso. O nome de Agatha aparece na tela.

— Ian?

Sua voz é suficiente para que eu coloque os últimos acontecimentos da tarde, a história com Raphael, de lado. É o bastante para fazer a necessidade de dividir aquilo com alguém se desfazer.

— Ian? Está aí? — Ela pergunta mais uma vez depois de não obter uma resposta. Seu tom é baixo, meio sussurrado, como se estivesse tentando esconder os sentimentos da voz. Algo me faz achar que há medo ali. O silêncio ao seu redor me faz pensar que está sozinha. De imediato, sei que ela não está bem.

— Estou. O que aconteceu? — Pergunto.

Agatha suspira do outro lado da linha. Ela odeia falar no telefone. Deve ser algo muito sério.

— Minha mãe recebeu uma carta — ela responde. — Uma carta do Michael — completa, dizendo a última palavra ainda mais baixo, como se temesse invocar o demônio.

O Sussurro do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora