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Capítulo 23

Xiao Zhan

Quatro dias depois

Desço,  ainda  não  muito  acostumado  a  andar  sem medo  pela  casa.  Quero  dizer,  eu  sei  que  posso,  mas  é esquisito  não  ter  olhos  me  vigiando  o  tempo  todo,  apesar de  que  desde  que  cheguei,  há  sempre  seguranças  no apartamento  e  também  uma  rotina  de  varredura  pelos cômodos duas vezes ao dia.

De  qualquer  modo,  eu  me  sinto  livre,  embora  seja uma liberdade relativa. Não há lugar para onde eu possa ir.

Ouço  vozes  na  biblioteca  e  ando  até  lá.

Provavelmente  os  homens  de  Yibo  estão  reunidos.  Eu meio  que  já  me  acostumei  com  eles  e  também  suas
esquisitices  —  suas  paranoias  com  segurança,  além  de outras excentricidades.

ZhuoCheng,  por  exemplo,  é  maníaco  por  limpeza.  Se estamos comendo e um grão de pão cai sobre a mesa, ele sai  do  seu  lugar  para  recolhê-lo.  Na  minha  cabeça,  isso não  combina  nem  um  pouco  com  a  imagem  de  um mafioso.  E  certamente,  não  com  a  dele,  particularmente, que parece ainda mais frio do que os outros.

Estou  me  afeiçoando  aos  amigos,  funcionários, associados  —  nem  sei  como  chamá-los  —  de  Yibo  e  já consigo  relaxar  ao  seu  redor.  Eles  não  me  tratam  com condescendência e às vezes me fazem perguntas sobre o passado. Eu me sinto respeitado e em meio a iguais.

Leonid  me  testa  sempre  que  possível,  soltando frases  em  russo,  aleatoriamente.  Quando  eu  não  só compreendo,  como  respondo,  os  outros  riem  dele  e  seu bom  humor  acaba.

Acho  que  ainda  não  me  perdoou  por vencê-lo no xadrez lá no Tennessee.

Paro  na  porta  do  aposento  e  percebo  que  além  de Yibo,  Xue Yang,  Leonid  e  ZhuoCheng,  estão  falando  com  alguém ao telefone, no viva-voz.

—  Não acho que devamos ficar em um mesmo lugar por muito tempo. A melhor chance de protegê-lo aqui será se  eu  movê-lo  de  tempos  em  tempos.    A  voz  do  outro lado diz.

— Mesmo na ilha?  — Yibo pergunta.

—   A  única  vantagem  de  estarmos  em  uma  ilha  é que ele só poderia fugir a nado.

—   Pode  apostar  que  tentarei.  Eu  não  confio  em você.  — Uma voz de rapaz intervém.

Meu coração bate muito depressa.

— Zanjin? — Pergunto, me aproximando do aparelho sem  pedir  licença.  Todos  os  homens  congelam.

—  Zanjin, fale comigo.

—  Xiao Zhan?

A  emoção  me  atinge.  Há  mais  de  um  ano  eu  não escuto  sua  voz,  nossa  comunicação  se  limitando  aos bilhetes  que  trocávamos  por  meio  de  suas  engenhosas manobras.

—  Hey, nunca ouviu falar em privacidade, garoto?  —A  voz  do  homem  nos  interrompe.  Apesar  de  soar  irritado, não há ameaça em seu tom.

—  Tente me impedir de falar com ele, chinês esnobe.

— Meu Deus do céu! É você mesmo! — Repito sem parar. Ajoelho perto do aparelho e ensaio tocá-lo, como se assim pudesse estar mais próximo do meu  amigo.

—  Sim, sou eu, Xiao Zhan. Diga-me que está bem.

— Eu estou. Não se preocupe comigo.

—  Isso é impossível.

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